Saúde mental e bucal andam juntas: saiba como transtornos mentais podem afetar a sua boca

Depressão, ansiedade, estresse e transtornos alimentares podem ter impacto direto na saúde bucal. Entenda.

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Publicado em: 26 de outubro de 2022

Revisado em: 27 de outubro de 2022

Depressão, ansiedade, estresse e transtornos alimentares podem ter impacto direto na saúde bucal. Entenda a relação entre saúde mental e bucal.

 

Alguns poucos minutos são suficientes para realizar o ritual de higiene bucal. Mas, para quem está passando por uma crise de saúde mental, o simples ato de escovar os dentes pode demandar muita energia, o que faz com que o autocuidado fique de lado. Não à toa, a incidência de problemas bucais é maior entre os pacientes com transtornos mentais.

Depressão, ansiedade, transtornos alimentares e estresse são alguns dos quadros psicológicos mais ligados ao desenvolvimento de problemas dentários. O dr. Fábio Bezerra, Ph.D. em biotecnologia, mestre em periodontia e diretor global de Pesquisa e Desenvolvimento (P&D) da S.I.N. Implant System, nos ajuda a entender a relação de cada um deles com as doenças bucais.

 

Depressão 

Os episódios depressivos de maior intensidade têm como característica o abandono do autocuidado. Tomar banho, pentear o cabelo e escovar os dentes são tarefas que costumam ser deixadas de lado. Por isso, é comum pacientes depressivos desenvolverem cáries e outras complicações. O dr. Fábio comenta:

“Por exemplo, um paciente jovem com episódios depressivos severos apresenta tendência de desenvolvimento de cáries agudas, enquanto pacientes adultos apresentam maior tendência para desenvolvimento de doenças da gengiva ou ósseas”.

Nesse caso, o ideal é incentivar a pessoa a ir ao consultório dentista para passar por uma avaliação. O dr. Fábio continua: “O primeiro passo é fazer uma avaliação clínica detalhada do quadro bucal e emocional do paciente para diagnosticar possíveis alterações como cáries, doenças gengivais e alterações de mucosa. Caso seja identificado algum problema, trabalhamos com o conceito de terapia individual progressiva de suporte bucal (TIPSB), que consiste em diagnosticar o nível de higiene oral de cada paciente e associá-lo ao nível de cooperação do paciente, sendo muitas vezes necessário associar à escovação e uso de fio dental enxaguatórios bucais com alto poder antisséptico, regeneradores de mucosa oral, maior número de consultas odontológicas para limpezas preventivas e, eventualmente, uso de medicações sistêmicas para controle da doença”. 

Para o tratamento funcionar, é fundamental que o paciente colabore, pois boa parte do trabalho depende da cooperação do paciente e da mudança de hábitos. 

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Ansiedade e estresse

 

O estresse afeta diretamente a saúde. Um dos principais impactos é na saúde bucal, uma vez que o estresse e a ansiedade podem desencadear transtornos como o bruxismo, marcado por uma sobrecarga muscular. Dores intensas, dentes desgastados e até fraturas dentais são os sintomas mais comuns da condição. 

“Um estudo publicado em 2022 no ‘Brazilian Journal of Pain’, relatou o impacto da covid-19 em aspectos psicológicos e bruxismo na população brasileira, tendo demonstrado que 71,41% dos entrevistados relataram estar apertando ou rangendo os dentes, e 100% estavam se sentindo nervosos ou estressados durante o período de afastamento social induzido pela pandemia”, destaca o cirurgião-dentista.

Para esses casos, o recomendado é o tratamento com uma equipe multidisciplinar, para que seja identificada e tratada também a causa do estresse, para que os sintomas desapareçam. Enquanto isso não acontece, o dentista pode indicar o uso da placa de proteção dental de uso noturno.

 

Transtornos alimentares

 

Transtornos como anorexia, bulimia e compulsão também podem afetar negativamente a saúde da boca. Nesse caso, a principal preocupação não são as cáries, mas a perda de tecido dental duro (esmalte, dentina ou cemento). Isso porque essas condições costumam ser acompanhadas de vômitos recorrentes, o que altera o pH (nível de acidez) da saliva.

“O pH bucal neste caso torna-se extremamente ácido (em torno 2,0) pela presença de ácidos biliares e HCO3, levando à biocorrosão dos tecidos duros dentais. Para minimizar os efeitos bucais deste tipo de quadro devemos levar em consideração que o pH bucal normal é neutro (entre 6,8 e 7,2) e, por este motivo, devem ser recomendados produtos de higiene oral com pH neutro ou básico, além de recomendar aos pacientes que evitem refrigerantes (alguns pacientes fazem uso de refrigerantes zero calorias para saciar parcialmente a fome sem ingerir calorias, mas se esquecem que são produtos muito ácidos (pH 2,5)), bebidas ou alimentos ácidos”, destaca o profissional.

Também nesses casos, o acompanhamento odontológico frequente será importante para diagnosticar possíveis lesões não cariosas ou doenças de tecidos moles em seu estado inicial e instituir cuidados individualizados. Mais uma vez, o ideal é que o tratamento seja multidisciplinar, para que o transtorno psicológico original também seja tratado. 

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Uso de medicamentos

 

O próprio uso de medicamentos psicotrópicos, como antidepressivos, ansiolíticos e antipsicóticos, pode provocar problemas bucais a longo prazo. A boca seca, um dos principais efeitos colaterais desses remédios, é o principal desencadeador desses problemas, uma vez que a saliva é extremamente importante para o equilíbrio da flora bucal, sendo responsável pela hidratação da mucosa oral, pela autolimpeza dos dentes e pelo sistema Des-Re (desmineralização e remineralização dental), responsável pelo não aparecimento de cáries. 

“Pacientes com boca seca tendem a desenvolver mais cáries pela alteração do pH intrabucal, apresentar inflamações e sangramentos gengivais pelo ressecamento das mucosas orais, maior perda óssea e eventualmente perdas dentárias”, salienta dr. Fábio Bezerra.

Ao identificar o sintoma, deve-se procurar um profissional especializado para avaliar o quadro e determinar o nível de produção salivar, que pode ser uma redução do fluxo salivar (hipossalivação) ou ausência de saliva (xerostomia). A partir desse resultado, é iniciado o tratamento. Além disso, durante o uso da medicação psicotrópica, alguns hábitos podem ajudar a reduzir os danos, como aumentar a ingestão de água, fazer uso de goma de mascar sem açúcar para aumentar o estímulo das glândulas salivares e o uso de spray ou gotas de saliva artificial quando recomendada. 

Também é importante realizar adaptações no cuidado bucal, como explica o cirurgião-dentista. “Outras recomendações importantes estão relacionadas à orientação em relação aos cuidados de higiene oral, evitando cremes dentais que tenham lauril sulfato de sódio (LSS) em sua composição, pois este componente da fórmula pode gerar irritação nas mucosas orais. Outra sugestão é o paciente preferencialmente utilizar produtos que contenham flúor para minimizar o risco de cáries.”

 

Caminho inverso

 

E quando o problema bucal desencadeia um quadro depressivo ou de ansiedade?

O sorriso tem um valor social importante, e está diretamente ligado à qualidade de vida, à autoestima e ao sentimento de pertencimento social. Por esse motivo, doenças bucais podem acabar levando o paciente a desenvolver um episódio depressivo ou disparar a ansiedade.

O conceito de “sorriso ideal” é individualizado e deve ter como premissas a beleza, naturalidade e saúde. Na entrevista com o paciente, o profissional dentista é capaz de identificar os motivos das perdas dentárias e o grau de impacto psicológico, estético e funcional gerado pela ausência dentária. 

O especialista em Periodontia ressalta a importância do diálogo com o paciente durante o processo e o cuidado no acolhimento psicológico. 

“O acolhimento psicológico está diretamente relacionado ao sucesso do tratamento, uma vez que o paciente é o vetor mais importante da reabilitação oral e deve sentir-se seguro, tranquilo e motivado a recuperar o seu sorriso. O uso de simulações do tratamento a ser executado, assim como a utilização de próteses provisórias ajudam a construir uma relação de confiança entre o paciente e o profissional, gerando informações valiosas para que o ‘sorriso ideal’ seja alcançado.”

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