Falar mais abertamente sobre o assunto é fundamental e pode incentivar a busca por ajuda. Entenda.
Mais de 700 mil pessoas morrem por ano devido ao suicídio, segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS). O dado representa uma a cada cem mortes registradas mundialmente. De acordo com a dra. Roberta França, médica pela Universidade Gama Filho e pós-graduada em psiquiatria pelo Centro Brasileiro de Pós-Graduações (Cenbrap), a principal forma de promover a conscientização sobre o suicídio é deixar de tratá-lo como tabu.
“É importante falar abertamente sobre o assunto, sem considerá-lo feio, triste ou errado. Falar sobre suicídio não faz com que as pessoas desejem se matar, pelo contrário, traz à tona os sentimentos daqueles que se sentem invisíveis e não cuidados. O sofrimento se torna insuportável quando não é reconhecido. É necessário abrir discussões claras sobre o que leva alguém a se sentir assim e buscar estratégias para auxiliar as pessoas que estão lutando contra seus próprios demônios”, comenta a profissional.
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Como reconhecer sinais de risco de suicídio?
A depressão, doença que pode gerar condições que levem a um padrão de comportamento suicida, não se limita à necessidade de ficar em um quarto escuro e à falta de higiene e comunicação. A médica afirma que até pessoas com depressão grave conseguem funcionar no dia a dia, mesmo que estejam lutando internamente. “Precisamos desconstruir estigmas e entender que doenças mentais não têm uma aparência definida. O suicida pode estar ao nosso lado, sorrindo e apoiando, mas ainda assim estar em risco”, diz.
Mesmo com a dificuldade de identificar os sinais de risco de suicídio, alguns são costumeiramente observados. Entre eles:
- Alterações extremas de humor: oscilações bruscas de emoções, como passar de uma euforia intensa para uma tristeza profunda;
- Comportamentos irresponsáveis: a pessoa pode começar a agir de maneira imprudente, arriscando-se desnecessariamente ou negligenciando a própria segurança;
- Mudanças na rotina: alterações significativas nos hábitos diários, como dormir ou comer em excesso ou de forma insuficiente, podem ser sinais de alerta;
- Pensamentos incessantemente revirados, desprovidos de esperança e concentração: a pessoa pode expressar uma visão extremamente pessimista da vida, sem conseguir enxergar uma saída para seus problemas, além de ter dificuldades em se concentrar em tarefas cotidianas
Fatores de risco para o suicídio
A cartilha “Suicídio: informando para prevenir”, elaborada pela Associação Brasileira de Psiquiatria (ABP) e pelo Conselho Federal de Medicina (CFM), informa que há dois principais fatores de risco para o suicídio:
- Tentativa prévia: indivíduos que já tentaram tirar a própria vida têm de cinco a seis vezes mais probabilidade de tentar novamente. Estima-se que metade das pessoas que cometeram suicídio já havia feito tentativas anteriores.
- Doença mental: quase todos os que se suicidaram apresentavam algum transtorno mental, muitas vezes não diagnosticado, não tratado ou tratado inadequadamente.
Os transtornos psiquiátricos mais comuns incluem depressão, transtorno bipolar, alcoolismo e abuso/dependência de outras drogas, transtornos de personalidade e esquizofrenia. Pacientes com múltiplas comorbidades psiquiátricas têm um risco aumentado, ou seja, quanto mais diagnósticos, maior é a vulnerabilidade.
Além disso, existem fatores desencadeantes, como desesperança, impulsividade, isolamento social e falta de um propósito na vida.
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Uma abordagem empática em relação ao suicídio
A psiquiatra relata que a chave para lidar com as questões emocionais e promover a saúde mental é a conversa.
“Precisamos criar debates abertos, ir às escolas e buscar nossas crianças e adolescentes. Devemos falar sobre todos os tipos de violência, não apenas a física ou sexual, mas também a psicológica. É importante abordar as crianças que se sentem incapazes de lidar com a frustração e os adolescentes com dificuldade em expressar suas emoções”, avalia.
Conforme a dra. Roberta, é preciso implementar sistemas, especialmente nas escolas e salas de aula, para desmistificar a terapia e a psiquiatria, para não serem associadas ao termo pejorativo ‘loucas’. “Precisamos entender que todos temos sentimentos diversos e às vezes difíceis de lidar, e que pedir ajuda é fundamental. Não importa se somos homens ou mulheres, bem-sucedidos ou mães. Não devemos nos sentir pressionados a sermos sempre felizes e realizados. Muitos estigmas são impostos a nós diariamente, o que nos faz sentir inadequados e menos valorizados”, pondera.
A profissional afirma também que é necessário conversar sobre essas questões desde cedo, não apenas com os adultos.
Como oferecer apoio?
A forma mais eficaz de fornecer auxílio e ajuda para alguém que está pensando em suicídio é o diálogo e a escuta sem julgamentos. “Não é necessário concordar ou achar certo, ou errado, mas sim validar a dor do outro e compreender o quão difícil aquilo é para aquela pessoa, pois não temos como julgar a intensidade dessa dor”, avalia dra. Roberta.
O ato de suicídio muitas vezes não é planejado de forma estratégica, mas sim um impulso imediato causado pelo desespero e falta de esperança. “Geralmente, a pessoa não deseja realmente morrer, mas sim acabar com o sentimento de vazio e sofrimento profundo que está vivenciando”, conclui.
Além do apoio emocional com a família e amigos, é imprescindível a ajuda profissional. Ferramentas para oferecer espaços de escuta, como terapia e centros de valorização da vida, podem ser fundamentais na luta contra o suicídio.
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