Debate antigo na ciência, o uso de antibióticos pode afetar o corpo de diferentes maneiras, dentre elas, reduzindo a absorção dos hormônios liberados pela pílula anticoncepcional. Entenda o que fazer.
Esse é um daqueles debates longos e acalorados da ciência: afinal, o uso de antibióticos pode diminuir a eficácia da pílula anticoncepcional? Há estudos que indicam que sim e outros que afirmam que não. Embora ainda existam dúvidas, já temos pistas importantes sobre o assunto.
“Como ocorre com outros medicamentos, anticoncepcionais são metabolizados por complexos de enzimas. Se a mulher faz uso de algum medicamento que aumenta a atividade dessas enzimas, elas mais rapidamente irão degradar os hormônios do anticoncepcional. Dessa forma, o nível de hormônio cai, aumentando o risco de sangramentos e de gravidez”, começa explicando Helga Marquesini, ginecologista e obstetra do Hospital e Maternidade Pro Matre Paulista.
O mecanismo que o corpo utiliza para diluir e metabolizar os anticoncepcionais é mesmo utilizado para o antibiótico oral: ambos são ingeridos, passam pelo sistema digestivo e seguem para o fígado, onde são metabolizados. Quando há “competição” entre os dois, a absorção dos hormônios pode ser comprometida, diminuindo a eficácia da pílula.
“O anticoncepcional tem que gerar uma determinada quantidade de hormônio para bloquear a ovulação. Quando eu não consigo atingir isso, quando não há liberação e absorção suficientes, acaba acontecendo uma queda da quantidade hormonal, permitindo que a mulher ovule mesmo sem saber”, explica Andrea Sales, ginecologista do laboratório Salomão Zoppi.
No caso dos antibióticos intravenosos, essa interação não ocorre, já que eles entram na corrente sanguínea, sem passar pelo trato digestivo. O mesmo vale para os dispositivos intrauterinos, o DIU hormonal.
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Outros efeitos
Mesmo quando não afetam diretamente a eficácia da pílula, alguns medicamentos podem trazer efeitos colaterais como náuseas, dores de cabeça e sensibilidade nas mamas.
“Sangramentos uterinos anormais (precisam ser investigados antes), alguns cânceres (por exemplo, o de mama), disfunções do fígado, trombose, infarto, AVC, hipertensão e diabetes (especialmente casos mais graves), enxaqueca e amamentação são condições que podem contraindicar total ou parcialmente o uso de métodos contraceptivos hormonais. Essas condições de saúde podem afetar a escolha do método contraceptivo, não a sua eficácia em si”, explica a dra. Helga.
Casos específicos, como pacientes que fizeram cirurgia bariátrica do tipo bypass (que afeta a absorção intestinal), ou o uso de anticonvulsivantes (como carbamazepina, topiramato, fenobarbital e fenitoína), também podem reduzir a efetividade da pílula. E já se sabe que os antibióticos usados para o tratamento de tuberculose causam interação direta com os anticoncepcionais.
Segundo o artigo publicado no jornal da USP, “doenças que despertam o vômito ou a diarreia, como doença de Crohn, reduzem a eficácia do anticoncepcional, isso ocorre porque o medicamento é expelido antes mesmo de começar a funcionar.”
“O intervalo seguro são duas horas. Se você teve uma diarreia ou náusea nas duas horas seguintes da tomada da pílula, não é preciso tomar outra, mas redobrar a atenção com a proteção, porque ocorre um risco maior de ter perda da eficácia do anticoncepcional”, pontua a dra. Andrea.
Além disso, o uso de antibióticos pode causar disbiose, um desequilíbrio na flora intestinal que pode levar à diarreia. Isso acontece porque os antibióticos eliminam não apenas as bactérias nocivas, mas também as boas – aquelas que povoam nossa microbiota e que ajudam na digestão e na proteção do organismo.
Como reduzir o risco?
Segundo a dra. Andrea Sales, é possível adotar estratégias simples para minimizar o risco de interação: .
- Espace os horários entre a pílula e o antibiótico. O ideal é que a pílula seja tomada no meio do intervalo entre as doses do antibiótico. Exemplo: se o remédio é tomado de 8 em 8 horas, ajuste a pílula para 4 horas depois da dose.
- Sempre antecipe, nunca atrase. Se a sua pílula é normalmente tomada às 8h, mas esse é o mesmo horário do antibiótico, antecipe o anticoncepcional para às 5h ou 6h, e mantenha esse novo horário enquanto durar o tratamento. “Ajuste de modo que seja sempre para trás, para não faltar hormônio”, explica a especialista.
- Considere usar outras barreiras. Em casos de risco de falha, a recomendação é usar preservativo como método adicional por todo o período. “Pode também ser necessário avaliar o uso da contracepção de emergêncdia [pílula do dia seguinte]. De qualquer forma, o mais importante é buscar aconselhamento médico para saber como melhor proceder”, conclui a dra. Helga.
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