Sarampo reaparece e acende alerta para importância da vacinação - Portal Drauzio Varella
Página Inicial
Infectologia

Sarampo reaparece e acende alerta para importância da vacinação

Publicado em 28/05/2025
Revisado em 28/05/2025

Queda na cobertura vacinal e aumento global de casos reacendem preocupação com a disseminação do vírus

Após anos com a doença sob controle em diversos países, o sarampo voltou a causar preocupação em escala global. De acordo com dados da Organização Mundial da Saúde (OMS), os casos da doença ultrapassaram 359 mil em todo o mundo. Nas Américas, seis países notificaram 2.313 casos até abril deste ano, um aumento significativo em relação aos apenas 215 casos registrados no mesmo período de 2024.

A atual alta de casos tem sido associada a diversos fatores, como a desinformação sobre vacinas, a hesitação vacinal e mudanças nas políticas de saúde pública. Nos Estados Unidos, por exemplo, a redução da cobertura vacinal e a baixa adesão aos imunizantes em algumas regiões abriram espaço para novos surtos, cenário que se agravou com a nomeação de Robert F. Kennedy Jr., conhecido por sua postura antivacina, como secretário de Saúde do atual governo Trump.

No Brasil, o Ministério da Saúde confirmou dois casos esporádicos de sarampo em São João de Meriti, no Rio de Janeiro, envolvendo duas crianças da mesma família, que já receberam atendimento médico e passam bem. As amostras foram analisadas pelo Lacen-RJ e pela Fiocruz, e os casos não têm relação com outro confirmado anteriormente em Itaboraí. Ainda segundo o Ministério, não há indícios de transmissão comunitária e os registros não afetam a recertificação do Brasil como país livre da circulação do vírus, concedida pela Opas/OMS em novembro de 2024.

Mesmo assim, o alerta é inevitável. Em um mundo globalizado, onde o fluxo de pessoas entre países é constante, surtos locais rapidamente ganham escala internacional, colocando em risco populações inteiras.

        Veja também: Desmentindo comentários antivacina | Comentando Comentários

A gravidade da doença

O sarampo é uma infecção viral aguda, causada por um vírus do gênero Morbillivirus, que afeta principalmente crianças, mas também pode atingir adultos não imunizados. Embora muitos ainda associem a uma enfermidade infantil “do passado”, especialistas alertam que seus impactos continuam graves, especialmente entre aqueles que não tomaram a vacina.

“Ao contrário do que muita gente pensa, o sarampo pode evoluir com complicações sérias, como pneumonia, diarreia, encefalite e até levar à morte”, explica a enfermeira e doutora em ciência da saúde Patrícia de Jesus Ribeiro.

Os primeiros sintomas costumam surgir de forma semelhante a uma gripe: febre alta por cerca de quatro a sete dias, acompanhada de coriza, tosse e olhos avermelhados. Dias depois, aparecem as manchas vermelhas (exantema) na pele, que se espalham por todo o corpo e duram aproximadamente cinco a seis dias.

“É uma doença que não pode ser subestimada, justamente por sua alta transmissibilidade e pela possibilidade de evolução grave”, alerta a especialista.

Transmissão silenciosa e veloz

A transmissão ocorre de forma direta, por meio de gotículas respiratórias expelidas durante a fala, tosse ou espirro. O vírus pode permanecer ativo no ar ou em superfícies por até duas horas, o que o torna extremamente contagioso.

O potencial de contágio é alto: uma única pessoa infectada pode transmitir o vírus para até 18 outras, um dos índices mais altos entre as doenças infecciosas conhecidas. Por isso, a propagação do sarampo é especialmente preocupante em ambientes fechados e com grande circulação de pessoas, como escolas, hospitais e transportes públicos.

“A transmissão pode ocorrer até cinco dias antes do aparecimento das manchas e até quatro dias depois. Isso significa que uma pessoa com sarampo pode estar frequentando ambientes públicos aparentando apenas uma síndrome gripal e, ainda assim, estar transmitindo a doença a outras pessoas suscetíveis”, detalha Patrícia.

Embora não exista um tratamento específico para o vírus, a maioria dos casos é manejado com suporte clínico. A prevenção, no entanto, é simples, eficaz e segura: a vacinação.

        Veja também: Quem deve tomar a vacina contra o sarampo

O papel da vacinação

A vacina tríplice viral, que protege contra sarampo, caxumba e rubéola, é oferecida gratuitamente pelo Sistema Único de Saúde (SUS) e faz parte do calendário nacional de vacinação infantil. A primeira dose deve ser administrada aos 12 meses de idade e a segunda aos 15 meses, com a tetraviral (que também protege contra a varicela). Mesmo assim, os índices de imunização têm caído nos últimos anos, abrindo espaço para o retorno da doença.

“A recomendação é que a cobertura vacinal com duas doses da tríplice viral se mantenha acima de 95%, principalmente entre crianças e jovens adultos, que representam uma parcela significativa dos casos”, ressalta a especialista.

Segundo dados do Ministério da Saúde, em 2024 o Brasil atingiu cobertura de 91,25%, abaixo da meta. Em 2025, até 1º de março, o índice caiu ainda mais: apenas 84,97% das pessoas haviam recebido as duas doses recomendadas.

Para reverter esse cenário, a enfermeira aponta algumas ações urgentes: “É fundamental manter campanhas de conscientização, facilitar o acesso às vacinas e realizar a busca ativa de pessoas não vacinadas. O esforço precisa ser coletivo.”

Além disso, pessoas sem o esquema vacinal completo (incluindo adultos até 59 anos) devem procurar uma unidade de saúde para receber a dose de reforço, especialmente em contextos de viagens, surtos ou contato com grupos de risco. Em casos de surtos, a vacinação pode ser ampliada para bebês a partir de 6 meses, com doses de bloqueio.

A vacina é segura e eficaz: duas doses garantem proteção de até 97% contra a doença. E ao contrário do que é propagado nas redes sociais, não há evidências científicas que associem a imunização a quadros de autismo ou outras condições neurológicas. A difusão de desinformação tem sido um dos grandes desafios no combate ao ressurgimento de doenças imunopreveníveis.

A resposta diante de novos surtos

Com o crescimento global de casos, é essencial que os serviços de saúde estejam preparados para agir com rapidez diante de qualquer suspeita da doença. Isso envolve não apenas o diagnóstico correto, mas também medidas de contenção para evitar a disseminação do vírus.

“Quando há suspeita de sarampo, é necessário notificar imediatamente a Vigilância Epidemiológica e coletar amostras biológicas para confirmar o diagnóstico laboratorial. O sarampo pode ser confundido com outras doenças que também apresentam manchas na pele, como a rubéola e a dengue, por isso é fundamental investigar”, explica Patrícia.

Além disso, a enfermeira defende o bloqueio vacinal seletivo, ou seja, a vacinação rápida de todas as pessoas que tiveram contato com um caso suspeito ou confirmado e o isolamento social do paciente durante o período de transmissibilidade. “O sarampo é uma doença evitável pela vacinação. Por isso, a adesão da população à imunização é a principal estratégia para conter a disseminação do vírus”, reforça.

        Veja também: Vacinação infantil | Tira-dúvidas com especialista #15

Vacinação é cuidado coletivo

Para especialistas em saúde pública, o aumento recente de casos de sarampo deve servir de alerta sobre os riscos da queda da cobertura vacinal. A responsabilidade pela imunização vai além do cuidado individual, ela é um compromisso com a coletividade.

Quando uma comunidade apresenta baixa taxa de vacinação, pessoas que não podem se vacinar, como recém-nascidos e indivíduos imunocomprometidos, ficam desprotegidas e mais vulneráveis a complicações graves.

Além disso, o retorno de doenças antes controladas representa um custo alto para os sistemas de saúde e compromete avanços obtidos ao longo de décadas com campanhas de vacinação e educação em saúde.

A retomada de campanhas nacionais de imunização, o combate à desinformação e a valorização da saúde coletiva são passos fundamentais para que o mundo não reviva tragédias que podem ser evitadas com ação simples. 

Referências:

  • Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde e Ambiente. Departamento de Ações Estratégicas de Epidemiologia e Vigilância em Saúde e Ambiente. Guia de vigilância em saúde: volume 1 [recurso eletrônico] / Ministério da Saúde, Secretaria de Vigilância em Saúde e Ambiente, Departamento de Ações Estratégicas de Epidemiologia e Vigilância em Saúde e Ambiente. – 6. ed. rev. – Brasília: Ministério da Saúde, 2024. Disponível em: guia-de-vigilanciaem-saudevolume-1-6a-edicao
  • Organização Pan-Americana da Saúde. Alerta Epidemiológico Sarampo na Região das Américas 28 de fevereiro de 2025. Disponível em: 2025-fev-28-phe-alerta-epi-sarampo-ptfinal.pdf 
  • Cobertura Vacinal Fonte: (Ministério da Saúde – Cobertura Vacinal – Rede Nacional de Dados – RNDS).
Compartilhe