Leptospirose nas enchentes

rua alagada, com carros. Leptospirose não ocorre apenas em épocas de enchentes

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Publicado em: 6 de março de 2023

Revisado em: 6 de março de 2023

Nesta época em que enchentes são comuns, ouvimos falar de leptospirose. No entanto, a doença está presente o ano todo. Leia o artigo do dr. Drauzio.

 

Só ouvimos falar em leptospirose quando há enchente. A doença, no entanto, está presente o ano inteiro, com incidência mais elevada nos meses chuvosos, nas áreas urbanas, em pessoas de baixa renda, na faixa etária dos 20 aos 50 anos. O Ministério da Saúde recebe em média 13 mil notificações por ano.

A falta de diagnóstico e tratamento precoce explica a gravidade dos casos: cerca de 75% dos pacientes precisam ser internados. Em média 10,8% dos infectados vão a óbito.

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A causa é uma bactéria do gênero Leptospira que infecta homens e ratos, cães, ovinos, suínos e bovinos, que servem de reservatórios naturais. Seres humanos adquirem a infecção ao entrar em contato com a urina do animal infectado, presente na água e na lama. Do ponto de vista epidemiológico, o rato de esgoto é o principal transmissor.

Em contato direto ou indireto com a urina do rato, as bactérias penetram a pele. A doença não é contagiosa, transmissão interpessoal é raríssima.

O período de incubação é de 5 a 14 dias, mas pode variar entre 1 e 30 dias. As manifestações também são variáveis: há formas assintomáticas, ou com poucos sintomas ao lado de outras graves, eventualmente fulminantes.

A doença evolui em três fases. 

1 – Precoce

Febre de instalação abrupta, dor de cabeça, nos músculos e nas articulações, perda de apetite, náuseas e vômitos. Podem surgir diarreia, vermelhidão nos olhos, fotofobia, manchas avermelhadas na pele e tosse.

Costuma ser autolimitada, com regressão em 3 a 7 dias. Como esses sinais e sintomas são comuns a muitas doenças virais, é comum receber o diagnóstico de influenza, dengue ou síndrome gripal.

Fazem suspeitar de leptospirose, entretanto, a dor ao apertar as panturrilhas e a musculatura lombar, a hiperemia e as pequenas hemorragias nas conjuntivas.

A maioria dos doentes evolui para a cura completa, mas 10% a 15% entram na fase em que se instalam as manifestações mais graves. 

2 – Fase tardia

A forma clássica é denominada síndrome de Weil, caracterizada por insuficiência renal, icterícia e hemorragias (geralmente pulmonares), manifestações que podem se apresentar isoladamente.

Hemorragias pulmonares provocam tosse seca, falta de ar e expectoração sanguinolenta que progride para Sara (Síndrome da Angústia Respiratória Aguda), quadro que leva à intubação endotraqueal e ventilação mecânica. A metade dos pacientes vai a óbito.

Fenômenos hemorrágicos podem ocorrer, também, na pele, nas conjuntivas ou nas mucosas dos órgãos internos, eventualmente até no sistema nervoso central.

A principal complicação tardia é a insuficiência renal aguda que se instala em 15% a 40% dos doentes. Muitos deles precisam ser submetidos à hemodiálise.

Outras complicações são menos frequentes: anemia, pancreatite, distúrbios neurológicos (confusão, delírio, desorientação), meningite, espasmos e paralisias musculares entre outros.

3 – Fase de convalescença 

A eliminação da leptospira na urina pode permanecer por mais uma semana ou persistir por meses. A icterícia desaparece lentamente em dias ou semanas. Alterações oculares (uveíte) podem ocorrer meses depois da infecção. a grande maioria dos que se curaram retornam às atividades normais.  

Devem ser hospitalizados pacientes com um ou mais dos seguintes sinais de alerta: falta de ar, tosse e respiração ofegante, fenômenos hemorrágicos (especialmente expectoração sanguinolenta), redução do volume de urina, vômitos intensos, icterícia, queda da pressão arterial, arritmias cardíacas ou alteração do nível de consciência.

O tratamento com antibióticos está indicado em qualquer fase da doença. A diferença é que na fase precoce o antibiótico (geralmente amoxicilina ou doxicilina por 5 a 7 dias) pode ser prescrito por via oral, em ambulatório, enquanto nas fases mais tardias, quando surgem as complicações, a internação hospitalar é mandatória para aplicação das medidas de suporte e antibióticos por via intravenosa.

O Ministério da Saúde recomenda as seguintes medidas quando houver exposição populacional em massa, como nas enchentes: 1) informar a população do risco da doença. 2) divulgar os sintomas que devem levar à procura de assistência médica. 3) alertar os profissionais de saúde para reconhecer os sinais e os sintomas. 4) notificar todo caso suspeito. 5) iniciar antibioticoterapia imediatamente.

 

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