O paradoxo dos antibióticos | Artigo

frasco derrubado com vários comprimidos de novos antibióticos caídos

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Publicado em: 16 de outubro de 2020

Revisado em: 16 de outubro de 2020

Por que as indústrias farmacêuticas têm pouco interesse em investir em pesquisas e no desenvolvimento de novos antibióticos?

 

Os antibióticos revolucionaram a medicina do século 20.

Paradoxalmente, no entanto, as companhias farmacêuticas que obtiveram grandes lucros com a comercialização deles, abandonaram as pesquisas de novos produtos.

Veja também: Resistência aos antibióticos

Na edição de agosto, a revista “Nature” discute as razões pela falta de interesse na pesquisa e desenvolvimento dessas drogas, cada vez mais essenciais num mundo em que cerca de 700 mil pessoas morrem, anualmente, infectadas por bactérias resistentes.

No artigo, é citado o exemplo da Paratek, pequena farmacêutica que está com a sobrevivência ameaçada, apesar de ter lançado, em 2019, um antibiótico (omadaciclina) contra enterobactérias resistentes.

As grandes companhias que se retiraram da área, alegam que os preços praticados no mercado são incompatíveis com os investimentos necessários. Como consequência, a tarefa ficou por conta de pequenas empresas de biotecnologia, dependentes de financiamentos nem sempre disponíveis.

Nos últimos dois anos, quatro dessas companhias foram à falência, depois de investir uma década em pesquisas, retirando de circulação ou reduzindo muito a disponibilidade de cinco dos 15 antibióticos aprovados pelo FDA, desde 2010.

As bactérias se tornam cada dia mais resistentes. No decorrer do século 21, corremos risco de voltar ao tempo em que assistíamos às mortes por infecção, sem medicamentos para impedir o desenlace.

Comercializar um novo antibiótico é tarefa complexa. Segundo a OMS, apenas 14% dos que chegam a entrar na fase 1 de estudos clínicos têm chance de serem aprovados pelas agências reguladoras. Os economistas estimam em U$ 1,4 bilhão os custos envolvidos até a aprovação, que ainda devem ser acrescidos de dezenas de milhões para marketing e supervisão.

As gigantes Merck e Eli Lilly, que produziram antibióticos na segunda metade do século passado, distribuíam esses custos entre outras divisões da companhia, recurso de que as pequenas empresas de hoje não dispõem.

Apesar de aprovada para combater pneumonias e infeções de pele por bactérias resistentes, a omadaciclina (bem como outros antibióticos) é pouco atraente aos investidores por diversas razões.

A primeira é a resistência bacteriana que começa a aparecer com a utilização do medicamento, característica que limita sua vida útil.

A segunda é a duração da antibioticoterapia, geralmente medida em dias ou semanas, no máximo.

A terceira é a dimensão do mercado. O Centers for Disease Control and Prevention calcula que ocorram 2,8 milhões de infecções anuais por bactérias resistentes nos Estados Unidos, número bem menor do que os 7,4 milhões de americanos com diabetes, que fazem uso diário de insulina por anos.

Os especialistas estimam que para se tornar viável, um antibiótico deve atingir vendas de U$ 300 milhões anuais, no mínimo. Assim, o mercado inteiro para enterobactérias resistentes renderia, no máximo, U$ 290 milhões por ano, orçamento que daria suporte a apenas um antibiótico novo contra esses germes causadores de tantas mortes pelo mundo.

As bactérias se tornam cada dia mais resistentes. No decorrer do século 21, corremos risco de voltar ao tempo em que assistíamos às mortes por infecção, sem medicamentos para impedir o desenlace.

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