A falta de controle sobre o desenrolar da pandemia do novo coronavírus pode desencadear sintomas de ansiedade na quarentena. Entenda.
Entre todos os sentimentos que o período de distanciamento ou até de quarentena por conta do novo coronavírus pode trazer, provavelmente o mais comum é a ansiedade. “Qualquer condição de baixa controlabilidade, de dificuldade de previsão do que está por vir, costuma aumentar o nível de ansiedade. Então, não é surpreendente que muitas pessoas, ou todos nós em algum nível, já estejamos experimentando sentimentos desse tipo”, explica a psicóloga clínica Júlia Daher Fink.
Diferentemente do estereótipo da ansiedade, nem sempre quem é ou está ansioso fica agitado, inquieto, suando frio. A ansiedade constitui um espectro que tem muitos sintomas menos exuberantes, e é importante conhecê-los para saber se você se encontra nessa situação. Assim, poderá tomar atitudes para aliviá-la.
Veja também: Ouça o podcast com a psicóloga Júlia Fink sobre ansiedade na quarentena
No início da quarentena, pode ser que sua mente fique tomada pelo assunto. Tudo o que você pensa é relacionado a coronavírus e o dedo coça para ver mais uma notícia sobre o problema, o que o leva a não conseguir trabalhar direito, tampouco realizar uma atividade relaxante, mesmo que não esteja agitado. Isso é dificuldade para se concentrar. “O que a gente sente privadamente não é necessariamente igual àquilo que é manifesto publicamente”, afirma a especialista. Então, você pode estar se sentindo muito ansioso e não deixar transparecer. Ou seja, se sua mente está preocupada, a ansiedade pode estar presente, mesmo que seu corpo aparente tranquilidade.
Concentre-se em gestos que reforcem o que está sob seu controle
Segundo Fink, outras manifestações comuns nesse período são medo de contágio pela covid-19, pensamentos invasivos e pessimistas, insônia e aumento ou redução da ingestão de alimentos. Na origem deles, está novamente a incerteza em relação ao futuro, fruto da falta de controle sobre a situação. Um ponto de vista interessante a se reforçar é que essa falta de controle não é total. É preciso dar valor ao que está ao nosso alcance e colocar em prática as ações que nos devolvem a sensação de controle.
Várias recomendações de combate à pandemia, como o distanciamento social e lavar as mãos com frequência, são ações que dependem de cada um de nós. É fundamental destacar que é preciso ter consciência de que tais ações devem ter em vista o futuro em prol de toda a comunidade.
“Existe um descompasso entre o que é recomendado pela ciência e aquilo que as pessoas veem quando têm contato direto com a realidade. As instruções científicas não produzem imediatamente achatamento de curva nenhuma. Pra ela se alterar de fato, a gente precisa de bastante gente seguindo as recomendações durante algum tempo”, esclarece a especialista. Ter essa consciência ajuda a dar sentido às medidas de prevenção, mesmo que elas não reflitam imediatamente.
Existem muitos brasileiros que por condições diversas não podem tomar tais medidas, seja porque dividem o lar com várias pessoas, seja porque falta água em suas casas. Cabe a todos se engajar e cobrar o poder público, o que representa uma outra frente de exercício do controle. O que está mais ainda sob controle é nossa capacidade de fazer doações a populações mais vulneráveis. Encontre campanhas e instituições em que você confia para contribuir. Além da diferença enorme que fará para quem recebe, é mais uma forma de atuar contra a ansiedade do momento.
Qualquer forma de exercitar o controle vale para aliviar efeitos de ansiedade. É por isso que, caso sua rotina tenha sido desestruturada, recomenda-se que você organize uma nova rotina e não fique refém do movimento dos dias, comendo e dormindo em horários desregulados, trabalhando muito mais ou menos que o usual etc. Não menospreze o poder da rotina: ela reforça o sentimento de controle.
Prevenção é importante para problema não se agravar
Reconhecer e mitigar efeitos da ansiedade precocemente são essenciais para a qualidade de vida e para prevenir maiores problemas futuros. “Quanto menos controle a gente tem e quanto mais prolongado for esse contexto de restrição da liberdade, além da ansiedade pode entrar em cena um fenômeno chamado ‘desamparo aprendido’, que se parece mais com a depressão“, afirma Fink. É uma condição em que, de tanto ser submetido a um quadro opressivo ou doloroso, o paciente torna-se mais apático e deixa de tomar atitudes para combater esse quadro. Se você identificar sinais de ansiedade, acione sua rede de amigos e familiares para relaxar e, se necessário, procure ajuda especializada.