A doença costuma se manifestar na infância e evolui em surtos, geralmente desencadeada por gatilhos que podem ser reconhecidos e evitados. Saiba mais.
A respiração é a única função fisiológica sem a qual não podemos passar mais do que alguns minutos. O ar chega aos pulmões através da traqueia, um tubo cartilaginoso que se divide em dois mais finos, os brônquios, que se dirigem um para o pulmão direito e o outro para o pulmão esquerdo (Figura 1).
Revestidos por um conjunto de cílios que produzem muco para expulsar todas as substâncias estranhas que chegam até sua luz, dentro do tecido pulmonar e do centro para a periferia, os brônquios se ramificam em tubinhos cada vez mais finos, formando a chamada árvore brônquica. Em suas ramificações terminais estão os alvéolos pulmonares, pequeninos sacos onde se efetua a troca gasosa: o gás carbônico é eliminado e o oxigênio absorvido cai na circulação.
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Em volta dos brônquios, existe um tecido muscular que promove sua dilatação e contração (Figura 2). Na asma, pela ação de substâncias irritantes ou por variações de temperatura, por exemplo, a entrada de ar e especialmente sua saída dos pulmões ficam comprometidas. O quadro se caracteriza por falta de ar, chiado no peito e tosse com produção de muco. Asma não tem cura, mas tem tratamento que pode minorar os sintomas e debelar as crises.
DISTINÇÃO ENTRE BRONQUITE E ASMA
Drauzio – Muitas pessoas dizem que sofrem de bronquite desde pequenas e quando se analisa de perto o quadro, descobre-se um caso típico de asma. Qual a diferença entre bronquite e asma?
Carlos Carvalho – Essa confusão é bastante comum. Na realidade, bronquite se tornou um termo leigo para nomear uma doença que é a asma. Essa confusão se justifica porque a palavra bronquite significa inflamação dos brônquios e todo paciente com asma tem uma doença inflamatória crônica nos brônquios que evolui em surtos. Como o indivíduo que não tem asma também está sujeito a ter bronquite, isto é, uma inflamação brônquica, se pegar uma gripe, um resfriado ou uma virose qualquer, e como todo asmático tem bronquite, criou-se essa maneira leiga de denominar a doença asma.
Drauzio – Como uma pessoa pode reconhecer que está com bronquite ou tem um quadro de asma?
Carlos Carvalho – A asma costuma manifestar-se desde a infância e evolui em surtos. Há períodos em que o paciente apresenta falta de ar, chiado no peito, secreção e um pouco de tosse. Esses sintomas podem aparecer em outras situações clínicas. Se entrarmos, por exemplo, num ambiente que contenha um gás tóxico ou um cheiro forte, podemos manifestar momentaneamente um pouco de secreção, de tosse e de chiado no peito. Se sairmos daquele ambiente, os sintomas desaparecem. Nesse caso, ocorreu uma crise aguda de bronquite que reverteu quando nos afastamos do estímulo irritante.
Nos quadros gripais, enquanto o vírus está provocando inflamações nas vias aéreas, a pessoa pode também ter um pouco de secreção, de tosse e de chiado, mas vencida essa fase, seu pulmão e brônquios voltam à normalidade. Com o asmático, a evolução da doença é diferente. Ocorrem sempre recidivas. Às vezes, as crises diminuem na juventude, mas reaparecem na idade adulta e, se for feito um teste pulmonar chamado broncoprovocação, seu resultado sempre dará alterado.
Drauzio – O teste de broncoprovocação é sempre uma forma de estabelecer um dado objetivo para o diagnóstico da asma?
Carlos Carvalho – Ajudam a estabelecer o diagnóstico o teste e a história das crises recidivantes, isto é, que voltam de tempos em tempos desencadeadas por processos ambientais ou infecciosos do pulmão.
Além disso, mesmo nos períodos fora das crises, nos quais a pessoa pode estar com a capacidade pulmonar normal, feito o teste de provocação, o resultado será positivo. Isso significa que a musculatura em volta dos brônquios que se fecha na presença de alguns estímulos até nas pessoas normais, nos asmáticos se fecha mais depressa porque ele tem uma hiper-responsividade brônquica. Portanto, por meio desse teste é possível quantificar essa resposta e caracterizar a doença.
FAIXA ETÁRIA DE MAIOR INCIDÊNCIA
Drauzio – A asma é mais comum em que faixa etária?
Carlos Carvalho – Como na infância o sistema imunológico ainda não está completamente desenvolvido, a resposta do organismo aos estímulos é um pouco exagerada. Se entrar um agente irritante no corpo, em vez produzir um anticorpo adequado contra ele, é produzido um anticorpo que provoca uma reação de hiper-sensibilidade. É como se eu tivesse que impedir a entrada de um bandido numa sala e, em vez de enxotá-lo, jogasse uma dinamite, causando uma reação altamente destruidora.
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Na primeira fase da asma, esse é o tipo de reação que ocorre. Ela impede que o agente irritante entre no organismo, mas causa uma inflamação enorme, os brônquios se fecham e vem a crise. Na adolescência, com o amadurecimento do sistema imunológico, esses anticorpos são produzidos naturalmente e as crises tendem a desaparecer. No entanto, indivíduo que nasceu asmático, morre asmático. Pode não morrer por causa da asma se for bem tratado, mas nunca se cura.
A asma tem um componente genético. A pessoa que nasce com essa propensão, quando exposta a determinados estímulos, terá uma reação inflamatória e o fechamento dos brônquios. Isso pode acontecer em qualquer fase da vida. É mais comum, porém, ocorrer na infância.
Drauzio – Com que idade costumam ocorrer os primeiros acessos?
Carlos Carvalho – Muitas vezes, eles acontecem nos primeiros meses de vida. Algumas crianças escapam dessa fase. Quando entram na escola, porém, e se expõem a agentes irritantes do ambiente ou transmitidos pelos colegas, desenvolvem esse tipo de reação exagerada. Portanto, é comum a asma manifestar-se nos primeiros meses de vida ou, então, na idade pré-escolar ou escolar. Na adolescência, os acessos costumam diminuir bastante.
GATILHOS DESENCADEADORES DAS CRISES
Drauzio – Quais são as substâncias que mais comumente disparam as crises de asma?
Carlos Carvalho – Isso é muito individual. Necessariamente, se a poeira faz mal para uma pessoa, não vai fazer mal para todos os asmáticos, embora a maior parte deles seja sensível a ela, especialmente à poeira doméstica, em geral, constituída por fragmentos de insetos que aspirados chegam aos brônquios e causam irritação.
Também podem causar irritação o pólen e outros materiais orgânicos que existem em árvores e plantações. O ar frio e agentes infecciosos, principalmente os vírus, estão na lista dos elementos que podem desencadear a crise e provocar uma reação exagerada nos asmáticos.
Drauzio – Existe a impressão popular de que a exposição ao frio provoca problemas respiratórios. Qual é a explicação para isso?
Carlos Carvalho – Normalmente, nosso organismo está a 37 graus centígrados. Se respirarmos pelo nariz, o ar é aquecido e umidificado de tal maneira que chega aos brônquios na temperatura adequada. Se o indivíduo respirar pela boca, porém, o ar não será aquecido convenientemente e, além de mais frio, chegará mais seco aos brônquios, ressecando um pouco suas células e expondo as terminações nervosas, o que gera uma contração do órgão. Isso faz com que os cílios brônquicos, que batem para empurrar para fora os agentes irritantes, não funcionem adequadamente. O organismo fica mais vulnerável com a exposição das terminações nervosas e as defesas diminuídas, o que pode ocorrer também durante a prática de exercícios físicos. Isso favorece o surgimento de alguns problemas respiratórios, entre eles a crise de asma.
Drauzio – Tem gente que quando corre ou nada tem acessos de asma, não é?
Carlos Carvalho – Durante qualquer exercício físico, principalmente durante a corrida, depois de certo tempo, a tendência é respirar pela boca e mais vezes, aumentando, assim, a inalação de ar frio, o que pode provocar irritação e uma crise de asma. O interessante é que alguns indivíduos, forçando um pouquinho, vencem essa fase e estabilizam. A explicação fisiológica para tal episódio não é muito clara, mas é nítido que alguns conseguem. Além disso, há uma série de medicamentos que ajudam a prevenir essa asma induzida pelo exercício. Por isso, hoje, os asmáticos são orientados para valer-se desses medicamentos na noite anterior à pratica de exercícios ou entre 15/20 minutos antes de iniciá-los. Dessa forma, conseguem abortar a crise e obter bom rendimento.
Drauzio – O ar-condicionado é contraindicado para os asmáticos?
Carlos Carvalho – O ar-condicionado funciona de modo semelhante ao ar frio. Para resfriar a temperatura, retira água do ambiente. O ar, mais seco e mais frio, se transforma num mecanismo irritante das vias aéreas e pode desencadear crises de asma. Além disso, se o aparelho não receber os cuidados adequados para sua manutenção, a água retida na tubulação pode criar fungos que serão espalhados pelo ambiente. Assim como a poeira, esses bolores irritam e fecham as vias aéreas dificultando a passagem de ar.
Drauzio – Muita gente diz que mudanças bruscas de temperatura podem provocar acessos de asma. Isso é verdade?
Carlos Carvalho – Isso pode acontecer, sim. A via aérea é preparada para permanecer numa temperatura constante. Por isso, mudanças bruscas de temperatura – do frio para o calor e vice-versa – podem gerar um pouco de irritação que se manifesta mesmo em quem não tem asma. Em época de muito calor, quando a pessoa entra num ambiente mais frio, é comum aparecer pigarro ou um pouco de tosse. Se forem asmáticas, esse estímulo se exacerba.
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GATILHOS DESENCADEADORES DAS CRISES
Drauzio – Você diz que a asma tem características hereditárias. Como se explica que a doença possa manifestar-se somente na idade adulta?
Carlos Carvalho – Estatísticas revelam que entre 5% e 10% dos casos, os indivíduos podem atingir a idade adulta sem apresentar nenhum sintoma, nenhuma crise. Em determinado momento, porém, elas se tornam frequentes disparadas por algum gatilho até então ausente em suas vidas. Também para isso não existe uma explicação completa e definitiva. Acredita-se que a pessoa nasça com bagagem genética que a torna predisposta a essas crises e, uma vez exposta ao agente irritante, o limiar passa a ser menor. Basta um perfume ou outro cheiro um pouco mais forte para desencadear o processo. Exemplo disso ocorre com mulheres que trabalham em casa. Às vezes, mexer em qualquer produto de limpeza provoca a crise que antes só aparecia com a manipulação de determinadas substâncias químicas.
Drauzio – Muita gente diz que não pode sentir um cheiro mais forte.
Carlos Carvalho – Isso acontece porque o limiar dessas pessoas está muito baixo, mas se elas forem convenientemente tratadas, poderão voltar a conviver com esses odores.
Apesar de a medicina ainda não conhecer um tratamento curativo para asma, é possível controlar muito bem essa doença e seu portador pode levar vida praticamente normal.
Drauzio – O que as pessoas chamam de asma nervosa tem fundamento científico?
Carlos Carvalho – O componente emocional é um dado importante dentro do quadro do indivíduo asmático, mas sozinho não desencadeia a crise. Porém, se ela já tiver começado, como existem células nervosas que atuam sobre a musculatura dos brônquios, nervosismo e tensão podem exacerbá-la. Quando ela começa, se o individuo ficar ansioso e considerar que o ambiente lhe é hostil, seu estado emocional pode amplificar a crise, embora não seja suficiente para desencadeá-la.
Às vezes, acontece exatamente o contrário. O indivíduo está péssimo até chegar à porta do consultório no pronto-socorro. Quando ele entra na sala, só por sentir-se mais seguro, os sintomas arrefecem.
PREVENÇÃO E CONTROLE DAS CRISES
Drauzio – Quais são as medidas preventivas que você aconselha para todas as pessoas que têm asma?
Carlos Carvalho – A primeira coisa é tomar cuidado com os agentes irritantes mais comuns. A pessoa tem de estar ciente de que ar frio e mudanças bruscas de temperatura podem ser fatores desencadeantes das crises. Por isso, dentro do possível, ela deve evitar a exposição a esses gatilhos.
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O mesmo ocorre com a poeira doméstica. Se é asmática, a pessoa não deve varrer a casa, passar aspirador de pó nem permanecer no local em que esse tipo de serviço está sendo realizado. Objetos que acumulam facilmente poeira, como carpetes, cortinas e livros antigos, que juntam bolores em suas páginas e requerem cuidado quando manuseados, não são apropriados para as casas de pessoas com asma. Outra recomendação é que o pó dos móveis seja retirado com pano úmido, diminuindo, assim, a probabilidade de a poeira espalhar-se pelo ar. Do mesmo modo, se a doença estiver descontrolada, é melhor que o ambiente esteja livre de cortinas.
No entanto, existem medicamentos que permitem controlar satisfatoriamente as crises e, antes de derrubar a casa inteira, vale a pena verificar se a medicação já foi otimizada. Se foi e as crises persistiram, o conselho é eliminar todos esses aparatos do ambiente doméstico. Caso contrário, é bom primeiro tentar o tratamento, porque hoje as drogas são muito eficazes e pode não ser necessário destruir a casa.
Drauzio – Esses aparelhos que se propõem a retirar os ácaros do ambiente funcionam de fato?
Carlos Carvalho – Que eles retiram ácaros é verdade, mas, como o ácaro não é o único mecanismo desencadeante das crises, sua eficácia não é tão grande quanto se preconizou. Por isso, praticamente não indicamos o uso desse equipamento porque ele resolveria, no máximo, um dos fatores dentro dos inúmeros que podem desencadear as crises.
Drauzio – Por que o aspirador de pó não é uma boa indicação?
Carlos Carvalho – O aspirador é melhor do que a vassoura, com certeza, mas não impede que seja liberada um pouco de poeira no ambiente. A poeira mais grossa fica retida no saco apropriado para retê-la, mas a mais fina acaba escapando, pode ser inalada e alcançar os brônquios. Se a asma não estiver bem controlada, a pessoa se ressentirá com isso. Portanto, passar o aspirador não é atividade aconselhada para os asmáticos.
Drauzio – Para quem precisa fazer esse serviço não existe alguma máscara que possa ser usada para evitar o problema?
Carlos Carvalho – As máscaras que estão à disposição no mercado possuem um filtro muito grosso que não impede a absorção do pó. A pessoa precisaria usar uma daquelas máscaras enormes de guerra para obter o resultado desejado. Por outro lado, colocar essa máscara comum, pode ser até pior para o paciente. O ideal para quem tem asma e precisa fazer esses serviços é arejar a casa bastante e passar o aspirador em etapas, interrompendo a tarefa de vez em quando. Fundamental para controlar a ocorrência das crises, porém, é manter o tratamento farmacológico otimizado.
Drauzio – Expor as roupas ao sol era um costume antigo que ajudava bastante a combater a proliferação de fungos. Hoje, fazer isso é mais difícil porque muita gente mora em apartamentos.
Carlos Carvalho – Para evitar a proliferação de fungos, colocar as roupas ao sol é uma medida bastante útil, mas nem sempre viável. No entanto, existem travesseiros, edredons e cobertores fabricados com material antialérgico que não deixa acumular esses bolores. Por que estou citando a roupa de cama? Porque é na cama que as pessoas ficam muitas horas seguidas respirando agentes irritantes.
Drauzio – Que materiais são esses? Às vezes, ouço asmáticos dizendo que usam travesseiros de pena nem sempre os mais indicados para eles.
Carlos Carvalho – Materiais orgânicos como pena e paina podem até deixar o travesseiro mais gostoso e mais macio, mas não são indicados para quem tem asma porque permitem a proliferação de fungos. Durante a noite, enquanto dorme, o indivíduo irá inalar esses agentes como se estivesse deitado no chão respirando poeira. Já existem espumas sintéticas que podem substituir o conteúdo desses travesseiros que devem ser revestidos por um tecido também antialérgico. É importante, ainda, que na confecção da fronha seja utilizado um material que não libere partículas de poeira.
Drauzio – Qual o melhor tecido para confeccionar as roupas de cama para os asmáticos?
Carlos Carvalho – Os tecidos sintéticos são melhores porque liberam menos partículas potencialmente irritantes.
Drauzio – Isso também vale para as roupas de uso pessoal?
Carlos Carvalho – Vale também para as roupas de uso pessoal. As roupas feitas com tecido sintético são melhores do que as feitas com fibras orgânicas. Os asmáticos, por exemplo, não suportam bem os agasalhos de lã que podem ser substituídos a contento por outros de tecido sintético, pois mantêm o indivíduo igualmente aquecido.
OPÇÕES DE TRATAMENTO
Drauzio – Como você orienta o paciente que diz: “Tenho asma desde criança. Na adolescência experimentei sensível melhora, mas, de uns anos para cá, tenho tido repetidas crises”?
Carlos Carvalho – A primeira coisa a fazer é explicar-lhe direitinho o que é a asma. Ele precisa entender que asma é uma inflamação dos brônquios e que a exposição a agentes irritantes poderá provocar uma reação imediata que começa nos primeiros minutos e se estende por algumas horas, ou uma reação mais tardia caracterizada por inflamação e inchaço dos brônquios e produção de muco. Ambas causam espasmo da musculatura e entupimento das vias aéreas.
Existem remédios que atuam bem na fase imediata e remédios que atuam na fase tardia. Resolver o problema na fase imediata não controla a doença que, nesse momento, responde bem aos broncodilatadores, as tradicionais bombinhas, e à inalação de certos medicamentos, que deixam de funcionar, porém, se utilizados na fase tardia.
Drauzio – Vamos determinar o início e a duração de cada uma dessas fases?
Carlos Carvalho – A fase imediata pode surgir entre dez minutos e 20 minutos depois da exposição a agentes irritantes e dura não mais do que quatro horas. Seria esse o período do espasmo dos brônquios. De seis a oito horas após, começa a fase tardia que se caracteriza pela ocorrência de inflamação e inchaço. Assim, o indivíduo que se expôs aos agentes irritantes no ambiente de trabalho, vai ter uma crise em casa, durante a noite.
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Os broncodilatadores só funcionam na primeira fase. Durante a crise, o paciente vai ao pronto-socorro, faz inalação, melhora e volta para casa. Infelizmente, horas mais tarde retorna ao hospital com nova crise e não responde mais ao uso dos broncodilatadores. A essa altura, só fazem efeito os anti-inflamatórios à base de corticoides que, como qualquer outro remédio, têm efeitos colaterais. Entretanto, não há outra saída: são esses os medicamentos que devem ser ministrados. O médico, quando os prescreve, leva em conta os benefícios que pesam mais que os efeitos potencialmente adversos dessas drogas.
Existe uma resistência muito grande por parte dos pacientes, especialmente das mães, em aceitar esse tipo de tratamento. Muitas vezes, porém, na crise de asma é fundamental introduzir medicamentos com corticoides e, se a crise for grave, será necessário mantê-los por um período mais prolongado.
No entanto, a grande maioria dos asmáticos controla bem a doença apenas com medicação broncodilatadora, em geral, sob a forma de inalação ou spray, o que assegura aplicação direta nos brônquios e menos efeitos colaterais no resto do organismo.
Drauzio – Alguns pacientes afirmam que a bombinha clássica com broncodilatadores vai perdendo o efeito com o uso. Isso é verdade?
Carlos Carvalho – Alguns trabalhos mostraram que, desde o surgimento do spray, sua venda cresceu e a mortalidade aumentou principalmente na região da Austrália e da Nova Zelândia. A associação epidemiológica desses dois dados resultou na falsa conclusão de que as bombinhas “poderiam estar causando a morte”. No fundo, essa correlação tinha algum nexo porque ficou evidente que os pacientes se excederam no uso do medicamento, pois, sob a forma de spray, aplicá-lo tinha se tornado muito mais fácil e prático.
Veja, se o indivíduo vai ao médico que lhe prescreve 300mg de ácido acetilsalicílico e resolve tomar 3g, sem dúvida, terá reações colaterais adversas e poderá até morrer pelo uso inadequado de uma substância comum como o AAS. Isso aconteceu com os asmáticos. Abusaram da medicação que aliviava os sintomas agudos, mas não impedia que a inflamação ocorresse mais tarde, momento em que o broncodilatador não funcionava mais e o paciente era internado com uma crise grave que podia terminar em óbito.
Foi por certo desconhecimento da existência da fase inflamatória da doença que ocorre mais tarde e pelo uso indiscriminado de broncodilatadores em doses muito acima das preconizadas que tais situações ocorreram. Hoje se sabe que a associação de broncodilatadores com corticóides nos sprays e nos medicamentos para inalação é o que de melhor existe para o controle da asma.
DICAS PARA O CONTROLE DAS CRISES
Drauzio – Que dicas você dá para os asmáticos controlarem melhor a doença? É bom fazer nebulização no quarto enquanto as crianças dormem?
Carlos Carvalho – Os vaporizadores colocados no quarto são completamente inadequados porque geram uma umidade relativa maior em ambientes pequenos que não têm a capacidade de absorvê-la. Como consequência, surgem bolores nas paredes, que funcionam como gatilhos desencadeantes das crises de asma. Por isso, não se preconiza a vaporização nos quartos. Se a criança tiver um pouco de secreção na via aérea alta ou mesmo na garganta, o melhor é fazer uma inalação ou, na hora do banho, deixar que ela respire bastante o vapor produzido pela água quente, uma vez que as paredes do banheiro não emboloram com facilidade pois são revestidas, em geral, com azulejos.
Drauzio – Que tipo de esporte é mais indicado para os portadores de asma?
Carlos Carvalho – Praticar esportes é fundamental para os asmáticos, quer se trate de crianças ou de adultos, e o melhor esporte é aquele que a pessoa faz com prazer e regularidade. Entre todos, talvez a natação seja o mais apropriado para esses pacientes porque o peso da gravidade empurrando o corpo para baixo, o empuxo da água impulsionando-o para cima e o fato de o indivíduo inchar o peito de ar para depois soprá-lo dentro da água acabam massageando o pulmão e forçam a saída do ar. O exercício da natação tem essa vantagem: facilita o esvaziamento do pulmão uma vez que no asmático o ar entra com mais facilidade do que sai.
No entanto, é preciso tomar cuidado com a prática da natação em clubes e academias que colocam muito cloro na água para mantê-la estéril. O cloro é um gás potencialmente irritante das vias aéreas e sua inalação deve ser evitada.
É bom alertar que, na vigência das crises, os exercícios físicos devem ser suspensos e só devem ser retomados quando elas forem controladas.
Drauzio – Muitos asmáticos fumam. Cigarro e asma combinam?
Carlos Carvalho – Essa combinação é péssima. Já escutei uma porção de histórias diferentes: há os que fumam cigarros de cravo; outros dizem que a maconha dilata os brônquios e melhora os sintomas. Tudo isso é mentira. A fumaça é um potente irritante das vias aéreas e deixa pequenas cicatrizes por onde passa. Os asmáticos que evoluem pior depois dos 45/50 anos são os que tiveram múltiplas recidivas de inflamação dos brônquios e, no fumante, a fumaça é responsável por muitas dessas inflamações. Se o asmático quer ter o prazer de fumar agora, precisa saber que no futuro vai sofrer muito, mas muito mesmo.