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Envelhecimento saudável: os desafios enfrentados pelos idosos no acesso à saúde no Brasil

Publicado em 29/07/2025
Revisado em 29/07/2025

Os brasileiros estão vivendo mais, mas ainda enfrentam dificuldades no caminho para uma longevidade com mais saúde e qualidade de vida. Leia na matéria sobre envelhecimento saudável e acesso à saúde.

 

No Brasil, uma pessoa é considerada idosa a partir dos 60 anos de idade. Contudo, é cada vez mais comum vermos indivíduos nessa faixa etária em plena atividade, seja trabalhando ou se dedicando a interesses pessoais. Mas, para envelhecer bem, é preciso ter acesso a cuidados com a saúde e que promovam uma boa qualidade de vida nessa fase. 

A expectativa de vida dos brasileiros vem aumentando nas últimas décadas. Nos anos 1980, era de 62 anos; nos anos 1990, foi para 66; em 2000, chegou a 71; e em 2010, ultrapassou os 74 anos. Hoje, a expectativa de vida ao nascer no Brasil é de 76,4 anos. Os dados são do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE)

O Censo de 2022 apontou ainda um crescimento de 57,4% no número de idosos no país em 12 anos (entre 2010 e 2022). O crescimento da população idosa representa uma conquista social, resultante de fatores como melhorias da condição de vida, acesso a serviços de saúde e prevenção de doenças, aumento do saneamento básico, maior escolaridade e renda, entre outros, conforme aponta o Ministério da Saúde

No entanto, essa nova realidade também traz desafios, como as desigualdades sociais enfrentadas no processo de envelhecimento. Um estudo do Instituto de Estudos para Políticas de Saúde (IEPS), divulgado em 2023, por exemplo, apontou que pessoas idosas com renda mais baixa apresentam piores indicadores de saúde e têm menos acesso a cuidados médicos. O levantamento indicou ainda que idosos com mais de 75 anos e renda mais alta têm condições de saúde semelhantes a idosos dez ou 15 anos mais jovens com renda mais baixa. 

O fato é que estamos vivendo mais. Mas estamos vivendo melhor? Para Leonardo Oliva, geriatra e presidente da Sociedade Brasileira de Geriatria e Gerontologia (SBGG), a resposta é sim – mas ainda há muito a se conquistar. 

“Nós estamos conseguindo aumentar o tempo de vida dos indivíduos, mas também estamos conseguindo aumentar a qualidade de vida na velhice. Isso não significa que não temos pontos a melhorar. Temos muitos! A gente precisa ainda investir muito em prevenção e em controle de doenças crônicas não transmissíveis para evitar dependência funcional, evitar sofrimento no fim da vida. A gente ainda precisa crescer muito em atenção aos cuidados paliativos. Mas, felizmente, tivemos diversos avanços nesse sentido nos últimos anos. Então, acredito que sim, estamos vivendo mais e melhor, mas ainda temos muito a melhorar”, afirma ele. 

envelhecimento saudável

 

Principais desafios no acesso à saúde para um envelhecimento saudável

“No Brasil, infelizmente, nós temos um sistema de saúde que não está verdadeiramente preparado para o envelhecimento populacional e para a atenção integral à pessoa idosa. O modelo ainda é muito centrado em doenças agudas e tratamento dessas doenças e procedimentos. Entretanto, para uma visão mais voltada para a pessoa idosa, os serviços deveriam priorizar um cuidado mais continuado, intensificando ações de prevenção e sempre tendo uma visão de funcionalidade”, explica o médico. 

O especialista destaca ainda os desafios geográficos no país, que dificultam o acesso à saúde longe das grandes capitais. Nesse contexto, existem questões importantes, como longas esperas para consultas com especialistas, cirurgias, exames especializados, além de uma fragmentação muito grande do cuidado. “O que a gente não encontra, e que a população idosa precisa, é de uma atenção mais integral e de um cuidado mais longitudinal. Infelizmente, o que a gente vivencia ainda é um sistema de saúde que responde de forma pontual e sempre reativa.” 

        Veja também: Quando o corpo começa a demonstrar sinais de envelhecimento?

 

Fatores agravantes no acesso à saúde 

Existem diversos fatores (físicos, sociais, econômicos) que podem agravar a vulnerabilidade da população idosa e dificultar o acesso aos serviços de saúde como, por exemplo, problemas de mobilidade, dependência financeira, custo dos medicamentos, exclusão digital, entre outros. Para o geriatra da SBGG, esses fatores acabam se somando e aprofundam ainda mais as desigualdades sociais no Brasil. 

“O processo de envelhecimento é um processo heterogêneo, mas aumenta-se o risco de perda de mobilidade à medida que a gente envelhece, o que torna – especialmente nas populações socialmente e economicamente menos favorecidas – o acesso à saúde muito delicado, tanto pela necessidade de ajuda de terceiros, como de transporte público, que é ineficiente ou que é não apropriado para o indivíduo idoso, especialmente aquele idoso com alguma dependência física”, pontua.

Em relação às dificuldades sociais e econômicas, um dos pontos de atenção é o acesso a medicamentos, que podem custar caro ou, quando estão disponíveis no SUS, exigem muitos passos para que os pacientes consigam retirá-los. “Muitas vezes, o indivíduo idoso que não tem um bom suporte social, que não tem uma boa escolaridade, não consegue realizar todo o trâmite burocrático necessário para conseguir aquela medicação.”

A dificuldade ou falta de acesso à tecnologia também pode ser um fator complicador quando falamos em saúde na velhice, por vezes impossibilitando o acesso a serviços que precisam ser utilizados de forma digital. 

“A falta de educação digital pode atrapalhar muito a pessoa idosa na garantia do acesso à saúde. Isso porque hoje nós temos diversos serviços que são agendados online, resultados de exames que são pegos de forma online, o próprio acesso à telemedicina que se torna mais difícil. Então, aqueles idosos que não têm acesso à tecnologia e não têm um letramento digital, acabam ficando alheios a esse desenvolvimento que a tecnologia trouxe”, afirma o médico.

A tecnologia deve ser vista como aliada, e não como mais uma barreira. Porém, para que isso aconteça, o especialista diz que alguns pontos precisam melhorar como, por exemplo, sites e plataformas mais intuitivas e capacitação digital para idosos, mas sem deixar de lado alternativas presenciais, porque muitas vezes a pessoa precisa usar o serviço de forma “analógica”.

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Atendimento à população 60+ no SUS

“Sem dúvida, o SUS é uma conquista magnífica para a população brasileira, e vem tendo alguns avanços importantes, mas eu diria que ele não está preparado para atender a população 60+”, diz o dr. Leonardo. 

Segundo o especialista, faltam profissionais capacitados em geriatria e especialistas em gerontologia; e de maneira geral, há um subfinanciamento crônico, especialmente na atenção clínica, isto é, existe uma prioridade no financiamento para consultas rápidas, procedimentos e cirurgias em detrimento do atendimento de consultório bem feito – o atendimento de geriatria que precisa de tempo de consulta, de escuta e de atenção. 

“A gente ainda tem poucas estruturas voltadas para a reabilitação. A gente tem muito pouco de cuidado domiciliar, tem muito pouco de apoio à família que cuida do idoso. Então, existem algumas necessidades de melhoria nessa rede pública de saúde para que a gente possa cuidar melhor da população 60+, principalmente, com uma atenção voltada à prevenção, que é onde a gente vai ter um custo-benefício melhor quando a gente fala em envelhecimento populacional”, destaca.

Por isso, o fortalecimento da atenção primária à saúde é fundamental para um bom atendimento aos pacientes idosos. Para o médico, esse atendimento deve ocorrer de forma multidisciplinar, com profissionais que tenham uma visão geriátrica e gerontológica.

“A atenção primária, quando bem feita, consegue gerar um bom vínculo profissional-paciente e isso melhora muito a adesão ao tratamento. A gente consegue trabalhar de forma preventiva, identificando precocemente perdas funcionais e prevenindo hospitalizações. A atenção primária é capaz de orientar para o autocuidado, então, são pontos essenciais para uma boa atenção integral à saúde que o idoso precisa”, afirma. 

        Veja também: Envelhecer no Brasil não é igual para todo mundo

 

Importância das políticas públicas para um envelhecimento saudável

As políticas públicas desempenham um papel fundamental na busca de um envelhecimento digno e saudável. Na avaliação da especialista, precisamos de políticas públicas que consigam integrar saúde, assistência social, habitação e mobilidade. 

“Precisamos ter um olhar mais voltado para essa pessoa idosa, visando a construção, por exemplo, de centros-dia – ambientes onde o idoso possa permanecer ao longo do dia, realizando atividades sociais, atividade física, artesanato, atividades cognitivas, permitindo ali um cuidado mais adequado desse idoso, e permitindo que os familiares possam desempenhar suas atividades laborais também”, aponta. 

Além disso, também são necessárias políticas públicas voltadas para os cuidadores e para os familiares, e medidas focadas em segurança e acessibilidade urbana para a pessoa idosa, que costuma ter mais dificuldades de locomoção e de visão. 

“A gente precisa [também] ter uma disseminação de combate ao etarismo, ao preconceito com a idade, seja no mercado de trabalho, seja valorizando a pessoa idosa como uma cidadã que merece respeito e merece o nosso reconhecimento por tudo que entregou ao longo da vida.”

 

Papel das farmácias e dos farmacêuticos

A farmácia pode desempenhar um importante papel como rede de apoio e auxiliar na promoção da saúde para os idosos. “O farmacêutico clínico vem ganhando importância nos últimos tempos quando a gente fala de cuidado com os idosos, já que a população idosa é aquela que habitualmente está mais submetida à polifarmácia, que é o uso de cinco ou mais medicações ao mesmo tempo”, explica o dr. Leonardo. 

O profissional de farmácia pode ajudar tanto na orientação do uso correto das medicações e acompanhamento da dispensação medicamentosa quanto na avaliação crítica dessas medicações (observando se os remédios estão trazendo os benefícios que se espera, se há efeitos colaterais, se existem interações medicamentosas nocivas, etc.). 

        Veja também: Envelhecimento – um papo entre pai e filha – DrauzioCast #205

 

Hábitos de vida interferem na longevidade e no envelhecimento saudável

Já reforçamos a importância da implementação de políticas públicas e de um sistema que atenda de forma integral à pessoa idosa. Mas medidas comportamentais também fazem diferença para um envelhecimento saudável, com mais autonomia e independência. 

Um estudo realizado com veteranos de guerra nos Estados Unidos e publicado na revista The American Journal of Clinical Nutrition, apontou oito hábitos que aumentam a expectativa de vida em mais de 20 anos. São eles: 

Sempre que possível, é importante cuidar daquilo que está no seu controle, pensando em um futuro com mais saúde e qualidade de vida. 

 

Conteúdo produzido em parceria com a RD Saúde.

 

Ilustrações: Barah Ilustra

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