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Neurologia

O uso diário de medicamentos para dor de cabeça pode causar enxaqueca?

Publicado em 30/07/2024
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Revisado em 30/07/2024

Especialistas explicam os riscos e alternativas de tratamento para evitar dores de cabeça.

 

Muitas pessoas tomam analgésicos diariamente para aliviar a dor de cabeça, mas será que esse hábito pode causar um problema maior, como a enxaqueca? Segundo especialistas, a resposta é sim. 

Há uma relação direta entre o uso frequente de medicamentos para dor de cabeça e o desenvolvimento de enxaqueca, também chamada de cefaleia de rebote ou cefaleia por uso excessivo de medicação (MOH).

A enxaqueca é um dos tipos de dor de cabeça mais comuns no mundo. Ela é caracterizada por ataques repetidos, intensos e súbitos de dor de cabeça moderada a grave, latejante e de um lado só que, sem tratamento, podem durar de 4 a 72 horas. Esses ataques vêm acompanhados de sintomas como náuseas e vômitos e pioram com movimento, luzes fortes e barulhos altos.

De acordo com Reinaldo Cordeiro de Oliveira, professor de Farmácia da Faculdade Anhanguera, especialista em farmacologia clínica e mestre em análises clínicas, para pessoas com menos de 50 anos, a enxaqueca é uma das principais causas de incapacidade no mundo. “É uma das doenças neurológicas mais comuns, sendo mais frequente em mulheres do que em homens, e atinge pessoas em suas idades mais produtivas”, explica.

A causa das enxaquecas não é totalmente conhecida, mas parece estar ligada à dilatação dos vasos sanguíneos e à inflamação das terminações nervosas. A serotonina ajuda a diminuir a dor e os sintomas da enxaqueca. Recentemente, descobriu-se uma proteína relacionada ao gene da calcitonina (CGRP), que tem fortes efeitos na dilatação dos vasos e na sinalização da dor.

 

A relação entre uso de medicamentos e enxaqueca

Segundo Ivana Stefanini Carreiro Scachetti, coordenadora do curso de Farmácia da Faculdade Anhanguera, farmacêutica e bioquímica e mestre em farmácia, um dos fatores que podem tornar a enxaqueca crônica é o uso frequente de medicamentos, como analgésicos. “Isso levou ao surgimento de um novo tipo de dor de cabeça secundária chamada MOH, uma condição desafiadora e incapacitante que acontece quando pessoas que têm dores de cabeça primárias, como enxaquecas ou dores tensionais, usam analgésicos com frequência ou em doses altas, piorando a frequência e intensidade da dor de cabeça”, explica.

A MOH resulta do uso prolongado de medicamentos para dores de cabeça, resultando em dor frequente, intensa e difícil de tratar. “Esse fenômeno foi relatado pela primeira vez em 1951 com a substância ergotamina, cujo uso excessivo piorava as dores de cabeça já existentes e tornava o problema crônico”, completa Ivana.

 

Compostos específicos e sua propensão a causar enxaqueca

Os medicamentos para crises de dor de cabeça são geralmente separados em duas classes: específicos e não específicos. Medicamentos específicos, como triptanos e ergotamina, são geralmente prescritos para enxaquecas e cefaleias. Medicamentos não específicos incluem anti-inflamatórios não esteroides (AINEs), corticosteroides, opiáceos e até antieméticos.

Segundo a Classificação Internacional das Cefaleias (ICHD-3), tanto medicamentos específicos quanto não específicos podem causar MOH. Embora vários medicamentos possam causar a condição, os triptanos são os mais usados para tratar pacientes com enxaqueca na prática clínica.

Ivana completa que o uso excessivo de triptanos desenvolve dores de cabeça mais rapidamente que outros medicamentos, mas sua retirada é curta e os sintomas de abstinência diminuem rapidamente. Em contraste, a retirada de opioides é complexa e gradual, devido aos fortes sintomas de abstinência relatados pelos pacientes.

        Veja também: Analgésicos comuns não servem para a enxaqueca

 

Por que isso acontece?

O mecanismo exato ainda não é completamente entendido, mas acredita-se que o uso prolongado e frequente de analgésicos altera a forma como o cérebro processa a dor. O corpo pode se tornar dependente do medicamento, e quando seu efeito passa, a dor volta mais forte.

 

Sinais da cefaleia por uso excessivo de medicamentos

Os sinais de que uma pessoa pode estar desenvolvendo enxaqueca por uso excessivo de medicação incluem dores de cabeça frequentes, uso constante de medicamentos, dor no pescoço, dores de cabeça pela manhã, sono prejudicado, sintomas autonômicos (como congestão nasal, coriza e problemas gastrointestinais) mais comuns com o uso excessivo de opioides e ansiedade.

Ademais, todos os tratamentos para dor de cabeça geralmente são menos eficazes quando há cefaleia por uso excessivo de medicamentos. A eficácia melhora após o desmame, mudança de hábitos e acompanhamento médico.

 

Tratamento da enxaqueca por uso excessivo de medicamentos

Segundo os especialistas, o tratamento da MOH frequentemente envolve a combinação de abstinência e orientação. A abstinência associada a medicação preventiva é a abordagem mais comum, pois reduz os ataques de dor de cabeça e melhora a resposta a medicamentos agudos ou preventivos. A orientação, uma abordagem eficaz e de baixo custo, envolve triagem seguida de avaliação individual sobre a necessidade de reduzir a substância preocupante. Isso tem mostrado bons resultados a longo prazo na redução do uso de medicamentos em pacientes que sofrem de MOH.

Estudos indicam que o uso de Eptinezumab, uma imunoglobulina (IgG1), pode ser uma alternativa no tratamento da MOH, pois inibe seletivamente as formas alfa e beta do ligante do peptídeo relacionado ao gene da calcitonina humana (CGRP). Níveis elevados de CGRP podem desencadear enxaqueca devido ao seu aumento em neurônios dos gânglios trigeminais no cérebro durante crises de enxaqueca.

 

Recomendações para evitar o uso diário de medicamentos

Para evitar a necessidade de uso diário de medicamentos, os pacientes devem se concentrar em fatores de risco modificáveis, como alimentação saudável, prática de exercícios físicos, redução do estresse, melhora da saúde mental e do sono. Técnicas de relaxamento, como meditação, e gerenciamento do estresse também são essenciais para quem sofre de dores de cabeça frequentes.

É importante ressaltar que o uso diário de analgésicos para dores de cabeça pode transformar um alívio temporário em um problema crônico, como a enxaqueca. Compreender os riscos e buscar alternativas preventivas e terapêuticas pode ajudar a evitar essa condição debilitante. 

Além disso, não deixe de procurar um médico neurologista para indicar o melhor caminho para tratar a dor de cabeça de acordo com a sua necessidade e estilo de vida, além de manter os exames clínicos em dia para garantir que toda a saúde do corpo e da mente esteja em equilíbrio. 

        Ouça: É dor de cabeça ou enxaqueca? – Por Que Dói? | Especial #01



Sobre a autora: Gabriella Zavarizzi é jornalista especializada em conteúdos digitais. Tem interesse em assuntos relacionados a neurociências, saúde mental, autismo, TDAH e primeira infância.

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