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Genética

Projeto Genoma: diversidade genética brasileira revela predisposição a doenças

Publicado em 04/06/2025
Revisado em 03/06/2025

Estudo destaca a diversidade genética do país e suas implicações na saúde, abrindo caminhos para políticas públicas mais eficazes.

 

Uma pesquisa inédita que analisou o genoma completo de mais de 2,7 mil brasileiros revelou que o Brasil é o país com a maior diversidade genética do mundo. Publicada na revista científica Science, a primeira fase do estudo foi coordenada pela Universidade de São Paulo (USP) com o apoio do Ministério da Saúde e integra o Projeto Genomas Brasil. 

O genoma representa todo o conteúdo do DNA de um organismo, reunindo as informações genéticas que orientam o desenvolvimento e o funcionamento do corpo humano.

A intensa miscigenação histórica da população brasileira influencia diretamente tanto a predisposição a doenças – como problemas cardíacos e obesidade – quanto a forma como cada indivíduo responde a diferentes tratamentos médicos.

Veja o que o levantamento apontou:  

  • Após avaliar dados de todas as regiões do país, foram identificadas mais de 8 milhões de variantes genéticas;
  • Entre essas, cerca de 37 mil podem estar relacionadas a doenças ou situações de saúde desfavoráveis;
  • Foram encontrados 450 genes relacionados a características metabólicas que podem influenciar o desenvolvimento de doenças cardíacas e obesidade entre os brasileiros;
  • Além disso, foram identificados 815 genes associados, direta ou indiretamente, a doenças como malária, hepatite, gripe, tuberculose, salmonelose e leishmaniose.

Essas informações mostram como o DNA de cada pessoa impacta diretamente a sua saúde. “Pequenas variações na sequência do DNA definem não só nossas características individuais, mas também nossa predisposição a doenças e à forma como respondemos a medicamentos. Com o avanço do sequenciamento genético, conseguimos mapear o genoma de milhares de brasileiros e identificar que a miscigenação é um fator-chave na nossa diversidade genética”, explica Lygia Pereira, coordenadora da pesquisa, professora titular e chefe do Laboratório Nacional de Células-Tronco Embrionária do Departamento de Genética e Biologia Evolutiva da USP.

        Veja também: Variantes genéticas podem influenciar diretamente no risco de demência, demonstra novo estudo

 

Impacto no diagnóstico e tratamentos

A genética já se tornou uma ferramenta importante para o avanço da medicina e pesquisas científicas. Nesse cenário, o estudo da USP e do Ministério da Saúde visa impulsionar a medicina de precisão, uma abordagem que busca identificar o tratamento ideal para cada pessoa, no momento mais adequado. Além disso, os dados gerados também podem fortalecer a medicina preventiva, que atua antes mesmo do surgimento de doenças.

Com esse conhecimento em mãos, torna-se possível adotar estratégias preventivas personalizadas. No caso do câncer, por exemplo, entender as particularidades genéticas de cada paciente pode orientar a escolha do tratamento quimioterápico mais eficaz para aquele perfil genético específico.

“Essa pesquisa revela que grandes frações do nosso genoma ainda não haviam sido descritas em bancos de dados internacionais. Agora, o desafio é entender como esse mosaico genético, resultado da miscigenação, impacta a saúde da população brasileira e como isso pode orientar uma medicina mais precisa e eficaz”, complementa Lygia. 

 

Diversidade genética e ancestralidade 

A pesquisa mostra que a população brasileira é resultado de mais de 500 anos de miscigenação entre indígenas, europeus e africanos, formando uma das maiores diversidades genéticas do mundo. Em média, os indivíduos analisados apresentam 60% de ancestralidade europeia, 27% africana e 13% indígena.

Foram observadas diferenças regionais: a região Nordeste tem maior influência africana, o Sul e o Sudeste têm predominância europeia, enquanto o Norte tem maior presença indígena. 

O estudo também identificou uma tendência recente ao “acasalamento seletivo”, com pessoas formando famílias dentro do mesmo grupo étnico.

Outro achado importante foi a identificação de variações genéticas que ocorrem com mais frequência do que o esperado, sugerindo uma possível “seleção natural”. Essas variantes estão ligadas a fatores como fertilidade, metabolismo e imunidade, características que podem ter favorecido a sobrevivência e reprodução ao longo das gerações.

“Este estudo revela a base biológica que sustenta a beleza e a força da miscigenação no Brasil. Agora, mostramos um pouco de onde vem essa diversidade. É apenas o início de uma pesquisa que ainda precisa avançar muito, mas que tem potencial para, no futuro, transformar o cuidado com a saúde dos brasileiros”, finaliza a pesquisadora.

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