Pintar as unhas do pé de preto evita a micose?


Equipe do Portal Drauzio Varella postou em Dermatologia

manicure pinta unha do pé de mulher. Por que alguns acreditam que esmalte preto evita micose?

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Publicado em: 15 de agosto de 2023

Revisado em: 18 de agosto de 2023

A “técnica” foi utilizada por atletas como Cristiano Ronaldo, mas existe algum embasamento científico nisso? Esmalte preto evita micose?

 

Causando o habitual burburinho, o jogador Cristiano Ronaldo apareceu em algumas fotos publicadas em suas redes sociais com as unhas dos pés pintadas de preto. Segundo um jornal alemão, essa “técnica” seria usada por ele e outros atletas a fim de evitar a micose, doença causada por fungos que acomete frequentemente profissionais do esporte. Mas será que o uso de esmalte preto evita micose? Existe algum embasamento científico nisso? 

 

O que é micose? 

As micoses são infecções causadas pela proliferação exagerada de fungos e podem afetar a pele, o couro cabeludo, as unhas e as áreas úmidas do corpo. Os fungos são encontrados em todas as pessoas, mas o desenvolvimento das micoses está associado a fatores como sistema imunológico enfraquecido, consumo excessivo de açúcar ou alergias.

“Muitas vezes ocorre um desequilíbrio entre os micro-organismos locais, que nós chamamos de microbiomas, favorecendo a infecção por fungo. Alguns pacientes podem ter uma predisposição para esse tipo de infecção, como os diabéticos, transplantados e imunossuprimidos”, explica o dr. Reinaldo Tovo Filho, dermatologista e coordenador do Núcleo de Dermatologia do Hospital Sírio-Libanês, em São Paulo. 

É importante lembrar que os fungos são estruturas simples que existem na natureza há milhões de anos. Presentes em todos os ambientes, estão em contato permanente com nossa pele e mucosas externas, porém, em geral não causam nenhuma reação patológica, pois vivem na camada formada por células mortas, e nosso organismo entra em equilíbrio com eles. 

“É possível adquirir fungos no solo, no contato com a terra, plantas e vegetais contaminados, bem como com animais tais quais gatos, cachorros e cavalos. Existem alguns fungos que são chamados de fungos antropofílicos, que possuem uma grande afinidade pelo ser humano”, diz o dr. Aldo Toschi, dermatologista do Hospital São Camilo, também em São Paulo. 

O médico explica como o fungo se instala em nosso organismo, levando à micose: “Caso a unha vá se descolando, existe um espaço entre o leito ungueal e a unha em si. A umidade entra nesse espaço junto com os fungos, que são ‘oportunistas’, porque eles preferem lugares com calor e umidade. Sendo assim, esse é um bom lugar para que eles cresçam. Principalmente se a pessoa ficar com o pé fechado dentro do tênis. Aquele pé suado e úmido favorece o desenvolvimento do fungo. Nesse caso, quando o fungo aparece na unha, ele se chama onicomicose”, diz. 

Justamente por conta da preferência dos fungos por se proliferarem em ambientes fechados e úmidos, eles aparecem apenas em partes específicas do corpo. “É muito menos frequente ter micose nas unhas das mãos, o mais comum é que ocorra nas plantas dos pés ou nas unhas dos pés”, diz o dr. Ricardo Shiratsu, médico dermatologista pela Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), ex-presidente da Sociedade Brasileira de Cirurgia Dermatológica e da Sociedade Brasileira de Dermatologia Regional de São Paulo.

Além disso, o dr. Aldo esclarece que os fungos compõem um dos micro-organismos mais resistentes da natureza, capazes de resistir a altas intempéries. “Quando o fungo se vê agredido, ele entra em estado de ‘hibernação’. Como acontece, por exemplo, no inverno, quando está frio e, portanto, as condições são menos favoráveis para ele. É por isso que muitas vezes um quadro de micose pode apresentar melhoras nessa época do ano. Mas a situação pode piorar quando as condições voltarem a estar melhores para o fungo.”

        Veja também: Micoses de unha e de pele | Sylvia Ypiranga

 

Diagnóstico e sintomas  

“O diagnóstico é eminentemente clínico, ou seja, o dermatologista, que é o especialista das micoses de unha, examina e faz o diagnóstico”, diz o dr. Ricardo. Se há dúvidas no diagnóstico, existem dois exames: micológico direto e cultura. No primeiro caso, tenta-se visualizar os fungos diretamente no microscópio, logo depois que se faz uma coleta de um pequeno pedaço da unha. Já no caso da cultura, também se retira um pequeno pedaço da unha doente, mas para inseri-lo em um meio e, depois de 28 dias, verificar se o fungo continuará a se desenvolver. 

Os casos de micose de unha não costumam apresentar sintomas, principalmente porque a unha não tem terminações nervosas. Mas há alguns sinais a se observar. “Alguns tipos de micose apresentam esbranquiçamento da lâmina da unha, que chamamos de lâmina ungueal. Ou, por vezes, pode ocorrer um espessamento da lâmina. Nesses casos, o paciente pode ter algum desconforto ao calçar sapatos fechados. Mas são raros os casos em que esses sinais aparecem”, diz o dr. Ricardo.

 

Qual é o tratamento para micose validado por especialistas? 

Segundo especialistas, as micoses são muito difíceis de tratar e são resistentes a antibióticos. Os antibióticos especializados para o tratamento de micoses são os antimicóticos, ingeridos por via oral. Segundo o dr. Aldo “são drogas muito potentes e que fazem mal para o fígado. Por isso, existe uma aversão das pessoas a esse tratamento, uma vez que o paciente precisa mudar sua rotina, não ingerir bebidas alcoólicas, não comer frituras e gorduras”.

Esse tratamento é indicado para casos em que há uma unha inteira ou várias que estão doentes. “Mas se a infecção for pequena, pode-se tratar localmente com produtos específicos para unhas ou utilizando antifúngicos por vias sistêmicas”, completa o dr. Reinaldo.

É importante marcar uma consulta médica para que o profissional possa avaliar o aspecto da unha, e, dependendo do caso, realizar exames para determinar qual exatamente é o fungo presente naquela unha, podendo direcionar um tratamento específico e realmente eficaz para o tipo de micose que se apresenta. 

        Veja também: Manchas nas unhas podem ser sinal de problemas de saúde

 

Uso de esmaltes escuros e micose 

Cientificamente falando, não há dúvidas: o esmalte escuro não ajuda no tratamento da micose. E nem em sua prevenção. Muito pelo contrário, ele pode ser muitas vezes prejudicial.

O dr. Aldo explica, primeiramente, como o uso de esmalte escuro pode impedir o diagnóstico da micose. “Se a pessoa usa rotineiramente o esmalte escuro, ela não percebe o que está acontecendo nas unhas. Tira um e põe outro, tira um e põe outro… quando se vê, existe uma micose que ninguém percebeu. Então é importante sempre observar o que está acontecendo na unha e o esmalte escuro, se usado continuamente, atrapalha a visualização.” 

Outra questão apontada pelo especialista está na composição dos esmaltes. Muitas vezes, eles contêm substâncias químicas que podem ser irritantes para o organismo, aumentando os riscos de alergias de pele e levando o paciente a desenvolver, inclusive, um processo de alergia crônica.

“Algumas marcas contêm formaldeído, ou formol, o que pode causar coceiras. Para alguns esmaltes de tinta preta, há substâncias derivadas do carvão ou do chumbo. Sendo assim, as cores mais escuras são mais alergênicas, têm mais riscos de causar alergias. As mulheres têm um histórico mais longo de alergias relacionadas aos esmaltes, pois utilizam há muito tempo. Os homens não tinham o hábito de usar, então não sabem se são alérgicos ou não. Esse é um ponto de atenção”, finaliza o médico. 

 

Como evitar a micose

Para evitar a ocorrência de micose nas unhas, os especialistas listam algumas dicas: 

  • Caso a pessoa tenha uma unha doente e for cortá-la em casa, deve-se começar pelas unhas saudáveis e terminar com a que está doente. Caso contrário, pode-se transmitir a doença para as outras unhas;
  • Se possível, não utilizar o mesmo calçado todos os dias, mas trocar de um dia para o outro, para que haja tempo para a evaporação da transpiração e da umidade;
  • Deixar os calçados usados em um ambiente que tenha sol e ventilação e não em ambientes fechados, como armários ;
  • Fazer uma boa higienização dos sapatos , uma vez que o fungo pode parasitar esses locais;
  • Manter a unhas curtas;
  • Evitar traumas nas unhas;
  • Evitar sapatos apertados; 
  • Usar sempre meias de algodão que absorvem a umidade, evitar usar sapatos sem meia;  
  • Não cutucar demais as unhas, não puxá-las nem passar palito debaixo delas; 
  • Secar bem os pés depois do banho, fazendo uma boa higiene e mantendo-os bem secos;
  • Para pessoas que têm sudorese excessiva e transpiram muito nos pés, o cuidado deve ser redobrado ao mantê-los seco: é recomendado passar talco antisséptico; 
  • Não retirar completamente a cutícula, pois ela protege o tecido da unha;
  • Para quem frequenta manicures, atente-se para que o material de corte seja limpo.  Não misturar material da mão no pé e do pé na mão. O material deve ser sempre esterilizado por  autoclave. O indicado é que se leve o próprio material para corte e manutenção das unhas.

        Ouça: DrauzioCast #173 | Micoses de pele

 

Sobre a autora: Tarima Nistal é jornalista e especialista em comunicação digital e marketing. Interessa-se por questões relacionadas à saúde das mulheres, alimentação saudável e meio ambiente.

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