Conheça os riscos e desafios associados ao autodiagnóstico de transtornos psiquiátricos, como o transtorno do déficit de atenção com hiperatividade (TDAH).
Na busca constante por explicações que justifiquem nossas dificuldades cotidianas, o autodiagnóstico de transtornos psiquiátricos, como o transtorno de déficit de atenção e hiperatividade (TDAH), vem ganhando destaque. Essa prática, impulsionada pela facilidade de acesso à informação na era digital, traz consigo uma série de potenciais riscos e desafios, de acordo o dr. Caio Gibaile, médico pela Universidade de Brasília (UNB) e psiquiatra com subespecialidade em psiquiatria forense.
“No cenário atual, marcado por um ritmo acelerado de vida com mais demandas pessoais e profissionais e uma intensa comparação social potencializada pelas redes sociais, muitos se sentem pressionados a atingir padrões elevados de performance com muita rapidez. Porém, nessa jornada, quando percebem dificuldades ou meras diferenças em seu desempenho comparado ao que observam ao seu redor, as pessoas passam a buscar motivos que justifiquem a suposta improdutividade que estaria os impedindo de funcionar no seu melhor desempenho”, comenta.
Nesse cenário, o TDAH, um transtorno que afeta a atenção e o comportamento, se torna um tópico de interesse. A ideia de que existe uma condição tratável proporciona alívio à sensação de descontrole gerada pelo ambiente.
O dr. Caio afirma que é fundamental esclarecer que as demandas intensas e a exposição às redes sociais não causam o TDAH, mas contribuem para o aumento da busca por informações sobre o transtorno. “O TDAH é um transtorno do neurodesenvolvimento que tem bases biológicas evidentes e forte relação genética — isto é: sim, ele existe e é um diagnóstico válido”, pondera.
Riscos do autodiagnóstico de transtornos psiquiátricos
O autodiagnóstico de transtornos psiquiátricos apresenta riscos significativos. O psiquiatra indica os principais quando o caso é o TDAH:
- Diagnóstico errado ou incompleto: autodiagnosticar-se com TDAH pode levar a um diagnóstico errôneo ou a um diagnóstico correto, porém incompleto, sem considerar possíveis comorbidades. Estima-se que até 80% das pessoas com TDAH enfrentem outras questões de saúde mental ao longo da vida, como transtornos de humor, ansiedade e uso de substâncias psicoativas.
- Uso de escalas de rastreio: escalas de rastreio divulgadas na internet, como a ASRS-18, não são ferramentas diagnósticas definitivas para o TDAH. Elas têm alta sensibilidade e baixa especificidade, o que significa que geram muitos falsos positivos. Essas escalas servem apenas para direcionar a necessidade de uma avaliação profissional.
Razões para o autodiagnóstico de transtornos psiquiátricos
As pessoas recorrem ao autodiagnóstico de TDAH por várias razões. “Vejo a busca pelo autodiagnóstico como uma tentativa sincera de encontrar respostas, por parte de uma pessoa que está questionando sua própria funcionalidade”, esclarece o médico.
Contudo, ele lembra também que o atendimento especializado em saúde mental não é algo prontamente acessível em todo o Brasil. “Assim, para terem uma resposta mais rápida, e não sendo de conhecimento geral a ideia de que é um diagnóstico complexo, as pessoas buscam soluções mais rápidas”, ilustra.
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Uso de medicamentos sem prescrição
O uso de medicamentos para o TDAH sem prescrição médica envolve riscos à saúde física e mental, incluindo:
- Abuso e dependência: psicoestimulantes, como metilfenidato e lisdexanfetamina, podem induzir a abuso e dependência devido aos seus efeitos estimulantes e outros efeitos adversos, como aumento da pressão arterial, disfunção sexual, insônia, pesadelos, tiques, bruxismo, ansiedade, irritabilidade e hostilidade e dor de cabeça.
- Complicações de saúde preexistentes: o uso inadequado pode descompensar condições de saúde preexistentes, como hipertensão ou transtornos de humor.
Desafios
Com o aumento da procura por sintomas e formas de diagnóstico, os especialistas em saúde enfrentam o desafio de conscientizar os pacientes sobre a importância de não se autodiagnosticarem ou automedicarem.
Para o dr. Caio, um passo necessário é desconstruir a imagem errônea criada pelo paciente sobre o TDAH e outros transtornos mentais, oferecendo uma compreensão mais precisa do transtorno.
“O nome ‘transtorno de déficit de atenção e hiperatividade’ parece resumir as características cardinais: déficit de atenção e hiperatividade. Contudo, o TDAH é um transtorno de neurodesenvolvimento, em outras palavras, um transtorno do desenvolvimento cerebral, e como tal, afeta múltiplas funções neurológicas, tal como alterações da memória de trabalho, ou da função executiva, como capacidade de planejamento, de tomada de decisões, estabelecimento de metas e controle inibitório”, conclui.
Em um mundo inundado de informações, a busca por respostas deve ser equilibrada com a orientação de profissionais de saúde mental qualificados, garantindo um diagnóstico correto e um tratamento adequado para aqueles que enfrentam desafios relacionados ao TDAH e outros transtornos psiquiátricos.
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