O uso de medicamentos antiparasitários e de produtos naturais com o intuito de prevenir e tratar verminoses não diagnosticadas não é recomendado para toda a população.
As parasitoses intestinais, como ancilostomose (amarelão), ascaridíase (lombriga) e esquistossomose (barriga d’água), são um problema de saúde pública comum nos países em desenvolvimento. No Brasil, dada a desigualdade no acesso ao saneamento básico, a prevalência dessas doenças varia muito de acordo com a região, podendo variar de 10% a 80% da população.
Assim, há quem recomende o uso de antiparasitários, também chamados de vermífugos, uma vez ao ano, para tratar uma eventual parasitose que tenha passado despercebida. Se você digitar “detox parasitário” no seu buscador, vai se deparar com uma infinidade de produtos supostamente destinados a tratar parasitas intestinais e “limpar” o organismo.
Além de ineficazes, os produtos vendidos como “detox” podem causar efeitos adversos. Outro problema é que quem busca esse tipo de tratamento pode ter outras doenças intestinais que nada tenham a ver com verminoses, mas que causem sintomas semelhantes, como doenças inflamatórias intestinais.
Verminoses intestinais
As verminoses são doenças causadas por diferentes vermes parasitas que se instalam no organismo do hospedeiro. Em geral, eles se alojam nos intestinos, mas podem abrigar-se também em outros órgãos, como fígado, pulmões e cérebro.
Entre as parasitoses intestinais mais prevalentes no Brasil estão a ancilostomose (amarelão), ascaridíase (lombriga), esquistossomose (barriga d’água), teníase, cisticercose, giardíase, filariose e oxiuríase.
A transmissão ocorre através da ingestão de água e alimentos contaminados ou através de pequenos ferimentos na pele por onde o verme pode penetrar, como no caso do amarelão.
Entre os sintomas das parasitoses intestinais estão: dores abdominais; vômitos; diarreia; falta de apetite; perda de peso; anemia.
Locais onde o saneamento básico é precário e o acesso à água potável é restrito são as principais áreas de risco.
Para prevenir a contaminação, o Ministério da Saúde recomenda as seguintes orientações:
- Lave bem as mãos antes das refeições e depois de usar o banheiro;
- Não evacue próximo e nas águas de rios, açudes e lagos;
- Beba água filtrada ou fervida;
- Lave bem os alimentos e armazene-os corretamente;
- Não ande descalço;
- Cuide da higiene.
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Indicação de antiparasitários
De acordo com o dr. Gerson Salvador, infectologista do Hospital Universitário da Universidade de São Paulo (HU/USP), os antiparasitários têm indicação clara para pessoas diagnosticadas com doenças causadas por parasitas.
Para crianças e gestantes que vivem em comunidades de alto risco, onde a prevalência de verminoses intestinais é acima de 20%, a Organização Mundial da Saúde (OMS) recomenda o uso preventivo da seguinte forma:
- Prevalência acima de 50%: administração duas vezes ao ano;
- Prevalência entre 20% e 50%: administração uma vez ao ano.
Em locais com menos de 20% de prevalência não há indicação para uso preventivo na população geral.
De acordo com o dr. Gerson, o Brasil, de maneira geral, é considerado um território de baixo risco. No entanto, devido à desigualdade na distribuição do saneamento básico, há maior incidência de parasitas intestinais em regiões mais pobres, tanto em escala nacional quanto dentro das próprias cidades, portanto pode haver diretrizes voltadas a municípios ou comunidades vulneráveis com recomendações distintas. “Além disso, há indicações específicas para pessoas com imunodepressão, sempre com prescrição médica”, explica o especialista.
Os medicamentos antiparasitários utilizados na prevenção são seguros e eficazes em doses baixas. Os mais comuns são o albendazol e o mebendazol, geralmente administrados em dose única.
As principais contraindicações incluem alergia ou hipersensibilidade aos componentes dos medicamentos. “No entanto, como qualquer medicamento, é possível ocorrerem efeitos adversos, como dor de cabeça, náuseas, vômitos, diarreia e até queda de cabelo. Por isso, é essencial sempre avaliar os riscos e benefícios antes da prescrição”, esclarece o dr. Gerson.
Detox natural
Não há evidências científicas de que produtos rotulados como “detox” sejam eficazes para prevenir ou tratar verminoses. Tampouco há comprovação científica de que sucos e alimentos sirvam para esses fins.
Também não é possível atestar a segurança e a eficácia de produtos vendidos na internet e mesmo em farmácias que não contenham a aprovação da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa).
O uso inadequado de vermífugos pode afetar os intestinos, comprometendo a saúde. “Além de não haver indicação para pessoas que não vivem em locais de alta prevalência, esses medicamentos podem afetar organismos que fazem parte da nossa microbiota”, afirma o infectologista.
A microbiota intestinal é formada por um conjunto de microrganismos que habitam o trato gastrointestinal. “O corpo humano médio contém cerca de 50 trilhões de células humanas e 40 trilhões de células não humanas, incluindo bactérias, fungos e pequenos vermes que não apenas coexistem pacificamente, mas também exercem funções protetoras contra diversas doenças”, informa o dr. Gerson.
Assim, utilizar medicamentos e produtos, mesmo que naturais, pode causar impacto no controle de doenças infecciosas e autoimunes.
“O uso de antibióticos e antiparasitários deve ocorrer apenas quando necessário, inclusive para preservar o equilíbrio da microbiota”, adverte o dr. Gerson.
“A natureza levou mais de 4 bilhões de anos para nos dotar de corpos com mecanismos próprios de desintoxicação. O processo de ‘detox’ ocorre de forma contínua, por meio do fígado, rins, intestinos e secreções naturais”, conclui o médico.
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