O acesso à internet tem começado cada vez mais cedo. A pesquisa TIC Kids Online Brasil 2024, do Centro Regional de Estudos para o Desenvolvimento da Sociedade da Informação (Cetic.br), apontou que 81% das crianças e adolescentes entre 9 e 17 anos possuem celular próprio. Dessas, 76% já usaram redes sociais.
Crescer na era digital é muito diferente do que era antigamente. Embora às vezes pareça que as novas gerações já nascem sabendo como usar a tecnologia, a internet não é um ambiente seguro para que crianças e adolescentes naveguem sozinhos.
Sem o acompanhamento adequado, eles podem ser expostos a uma série de conteúdos nocivos — como pornografia, desafios de automutilação, jogos de azar e discursos de ódio, entre outros. Por isso, é fundamental ter cautela, orientação e monitoramento constantes.
Introdução ao mundo digital
Segundo Rodrigo Nejm, especialista em educação digital e líder do Eixo Digital do Instituto Alana, antes de qualquer coisa, é preciso pensar que a introdução de uma criança ou adolescente ao mundo digital deve ser feita com cuidado e de maneira gradual.
“O acesso inicialmente pela TV é melhor, porque tem a possibilidade de um controle maior sobre o conteúdo que está sendo visto. É importante que tenha as funções de perfis de idades dentro dos streamings, que você pode selecionar de acordo com a classificação indicativa qual a faixa etária daquela criança, e pode permitir que só conteúdos daquela faixa etária fiquem disponíveis”, orienta.
A entrega de um celular, tablet ou computador deve acontecer como resultado da evolução dos acordos e da introdução gradual ao uso das telas. “Uma criança de 6 ou 7 anos pode até saber muito bem usar o aparelho, mas ela ainda não tem o discernimento, a maturidade, a capacidade crítica para fazer todos os filtros que ela precisa fazer, e é indispensável a participação da família, dos cuidadores e também o importante papel da escola fazendo essa mediação.”
A publicação “Crianças, Adolescentes e Telas: Guia sobre Usos de Dispositivos Digitais”, do Governo Federal, recomenda que a posse de um aparelho próprio não ocorra antes dos 12 anos de idade, sendo que quanto mais tarde, melhor.
“A gente sabe que a realidade é muito diferente disso. A gente tem hoje 8 a 9 anos como idade média de acesso ao celular. Se a família acha por bem permitir o acesso ao celular antes dos 12 anos, tem que entender que não é um tudo ou nada”, diz o especialista.
Veja também: Os malefícios do uso de telas na infância e na adolescência | Entrevista com Daniel Becker
Ferramentas de controle parental
Rodrigo destaca que, uma vez que o celular foi entregue à criança ou adolescente, é fundamental ativar os modos de controle parental que estão disponíveis no próprio aparelho — até mesmo aparelhos de vídeogame possuem esse tipo de controle.
“[Com isso], você consegue determinar o tipo de aplicativo que pode ser instalado. E é importante lembrar que todo aplicativo disponível na loja de aplicativos já tem uma classificação de idade. Use o controle parental para definir tempo máximo por dia. Também dá para definir o perfil de idade não só para os aplicativos, mas para os conteúdos nos navegadores de internet, para você ir diminuindo as camadas de exposição dessa criança a conteúdos impróprios”, recomenda.
Para usuários de iPhone, a Apple oferece a ferramenta Tempo de Uso, que permite ajustes e controles parentais para manter o dispositivo seguro e adequado à idade, segundo o site oficial. Também existe a opção de configurar o compartilhamento familiar nos dispositivos da marca.
Para usuários de Android, também há opções de compartilhamento familiar, e um aplicativo do próprio Google, o Family Link, que tem funções como limite de tempo de tela, restrição de conteúdos, localização e alertas importantes. O Family Link também está disponível para iOS, mas há limitações se o aparelho da criança não for um Android.
Existem ainda outros aplicativos de controle parental com diversas funcionalidades, como limites de tempo de uso, bloqueio de sites, controle de jogos e aplicativos, histórico de pesquisas, localização via GPS, entre outras. A maioria é paga, mas oferece versões gratuitas, com funções mais básicas. Algumas opções são Qustodio, Kaspersky Safe Kids e Norton Family — todos disponíveis para Android e iOS.
Também é possível supervisionar a conta dos filhos nas redes sociais, caso eles tenham perfil. Veja como fazer isso no Instagram e no TikTok. O YouTube tem uma plataforma específica para crianças, o YouTube Kids, indicado para menores de 13 anos. Vale destacar que a idade mínima recomendada para usar redes sociais como o TikTok, o Facebook e o YouTube é de 13 anos. Já o Instagram recentemente passou a ser não recomendado para menores de 16 anos no Brasil.
“Criança não pode usar a rede social, não foi feita para ela. Além da publicidade e do conteúdo adulto, tem uma série de outras experiências que podem ser bastante negativas, inclusive perigosas, de contato de criminosos com essa criança numa rede social, por exemplo. Então, é importante seguir as idades: rede social, no mínimo, a partir dos 13 anos”, afirma Rodrigo.
Relação de confiança entre pais e filhos é fundamental
Para o especialista, a comunicação entre pais e filhos é ainda mais importante do que a escolha de uma ou outra ferramenta específica. É preciso manter um diálogo transparente, negociar regras e acordos e falar sobre a vida digital com as crianças e adolescentes.
“A conversa tem que ter uma escuta qualificada, sensível, não só condenar, julgar, dizer que os filhos não estão fazendo certo ou que vão retirar o aparelho como forma de punição. A melhor tecnologia ainda é uma relação de confiança transparente para que as crianças e adolescentes entendam que há regras também para o mundo digital — assim como tem regras para ir dormir na casa do amigo, para sair de casa, para viajar, também tem regras para a forma como se usa a internet”, explica.
Outra dica importante é navegar junto com os filhos para fazer a seleção de conteúdos. “Assista aos primeiros cinco minutos e a partir desse momento, mesmo que a classificação seja livre, você vai poder escolher junto com os seus filhos quais são conteúdos considerados apropriados ou não, até porque cada família tem seus valores e critérios.”
Como saber se meu filho está sendo impactado negativamente?
Segundo a Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP), mudanças de comportamento, como isolamento, ansiedade, insônia ou queda no desempenho escolar podem indicar um impacto negativo das redes sociais. “Fique atento a sinais de estresse ou insatisfação, especialmente se seu filho demonstra obsessão por estar constantemente conectado ou fica perturbado por eventos online. Manter um diálogo aberto e observador pode ajudar a identificar e abordar problemas antes que se agravem”, recomenda a SBP.
Veja também: A relação entre ansiedade e redes sociais – DrauzioCast #239