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Psiquiatria

Como a fibromialgia afeta a saúde mental dos pacientes?

mulher sentada na cama, com mão nas costas em sinal de dor. leia sobre fibromialgia e saúde mental
Publicado em 04/03/2023
Revisado em 03/03/2023

Pessoas que convivem com a fibromialgia podem precisar de apoio psicológico para lidar com os efeitos do diagnóstico. Leia matéria sobre fibromialgia e saúde mental.

 

Quem vê Creuzione Coelho cuidando do cabelo de suas clientes nem imagina que, muitas vezes, ela sai do salão de beleza e vai direto para o hospital. Diagnosticada com fibromialgia aos 30 anos, a cabeleireira precisa de medicamentos na veia quando as crises de dor se intensificam. 

A fibromialgia é uma doença reumatológica crônica que atinge, principalmente, mulheres entre 30 e 55 anos. O principal sintoma é a dor constante, a qual, na descrição de Creuzione, parece andar pelo corpo. Isso porque a sensação migra por vários pontos, em especial os tendões e as articulações.

Segundo ela, quem tem fibromialgia não fica sem dor, apenas momentos de alívio. E o convívio diário com tanto incômodo afeta diretamente a saúde mental.

 

A luta pelo diagnóstico da fibromialgia

Os prejuízos emocionais começam ainda na busca pelo diagnóstico. Ainda que Creuzione tenha descoberto a doença aos 30 anos, as dores já a acompanhavam desde a infância.

“Eu ia aos médicos e eles não sabiam o que era. Teve uma época que eu cheguei até a pensar que estava ficando doida. Eu sentia as dores, elas eram reais e os médicos diziam que eu não tinha nada”, conta a cabeleireira, hoje com 50 anos.

De acordo com a psicóloga Fabíola Luciano, esse é um sofrimento comum entre os pacientes com fibromialgia. Eles passam por vários profissionais diferentes, recebem diagnósticos inadequados e são até descredibilizados em suas queixas. Já nesse momento, a saúde mental começa a ser afetada.

“Alguns médicos não estão preparados para fechar o diagnóstico de forma eficiente. Tarde-se muito a entender que estamos tratando de um quadro de fibromialgia. E a própria falta de perspectiva em relação à melhora do quadro quando não há um diagnóstico assertivo também é extremamente angustiante”, pontua Fabíola.

 

Convivendo com a dor em silêncio 

Mesmo depois do diagnóstico, a angústia permanece. Como a fibromialgia não tem cura, os tratamentos buscam aliviar os sintomas e garantir qualidade de vida aos pacientes. Por isso, podem surgir dificuldades em realizar tarefas que antes eram corriqueiras, como trabalhar, cuidar da casa ou lidar com os filhos.

“Isso impacta diretamente no humor da pessoa, porque, é claro, com dor, a gente fica mais vulnerável. É natural a pessoa passar por um grande estresse emocional. E aí podem surgir quadros depressivos ou ansiosos, além de questões relacionadas à autoestima e à percepção de si mesmo”, explica Fabíola.

No caso de Creuzione, as crises constantes a deixam extremamente mal humorada, mesmo que ela tente disfarçar para as pessoas ao seu redor. De acordo com a psicóloga, a dor da fibromialgia é muito invisibilizada, pois ela só é perceptível para o próprio paciente. Ou seja, a não ser que ele fale, quem está de fora não percebe o que há de errado. Isso pode fazer com que o sofrimento da doença seja muito isolado e, por vezes, até questionado.

Veja também: Fibromialgia não é coisa da sua imaginação

 

Os impactos nas relações familiares

Dentro de casa, o diagnóstico pode ter efeitos diferentes. “Tem pessoas que, no começo, dão suporte, mas conforme o quadro avança, vão perdendo a paciência, não sabem muito bem o que está acontecendo”, exemplifica Fabíola.

Se o paciente era o responsável financeiro pela família ou tinha uma função mais ativa em relação às tarefas do dia a dia, a depender da gravidade do caso, esse papel terá que ser revisto. 

Quando a pessoa está com dor constante, ela pode ter o humor alterado e reagir de formas diferentes diante de situações cotidianas. Se não for bem trabalhado, isso pode provocar distanciamento, atrito, sensação de sobrecarga para os membros da família e de invalidação para o paciente.

“A minha filha me diz: ‘Mãe, ninguém tem nada a ver com as suas dores’. E, realmente, não tem mesmo. Está doendo? O máximo que alguém pode fazer é pegar um remédio para mim ou me levar ao hospital. Mas me afeta, porque eu fico muito mal humorada”, conta Creuzione.

 

O que fazer?

Segundo Fabíola, alguns especialistas são importantes no acompanhamento de quem tem fibromialgia, como o reumatologista, o neurologista e o fisioterapeuta. Por outro lado, o acompanhamento psicológico ou psiquiátrico (quando necessário) também é essencial para que o paciente consiga dividir as angústias relacionadas à doença em um ambiente seguro.

“É muito comum que o paciente fique em um limbo em que ou ele não aceita o diagnóstico e fica buscando caminhos mágicos de cura ou ele entra tão profundamente na doença que faz dela a sua única realidade. Só vê a dor, os sintomas e perde o contato com outras pessoas. O acompanhamento psicológico ajuda a encontrar um equilíbrio para aceitar a nova perspectiva e encontrar a possibilidade de vida saudável apesar dela”, explica.

Nesse sentido, oficinas de arte, acupuntura e terapia ocupacional também podem ajudar. Para a família, os grupos de apoio são importantes para auxiliá-los a entender o que está acontecendo, evitando expectativas irreais e contribuindo para a adaptação da dinâmica familiar.

Creuzione, que passa com um psicólogo desde que descobriu o diagnóstico, encontrou na academia e no próprio trabalho maneiras de se fortalecer.

“Eu gosto de treinar, então eu vou para lá. E o meu trabalho também me distrai, porque eu gosto do que eu faço. A dica é não se entregar, procurar se distrair e fazer uma coisa que gosta. Quando a gente deixa abalar o psicológico, a dor vai ser pior”, diz a cabeleireira.

Para Fabíola, um dos pontos-chave é construir a própria validação, reconhecendo seus limites e emoções. 

“Vai haver dias bons e dias ruins. Então, comemore as pequenas vitórias. Os dias difíceis vão fazer parte de qualquer história, com ou sem diagnóstico. Claro que a fibromialgia traz desafios específicos, mas a gente deve buscar o próprio reconhecimento no caminho”, aconselha.

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