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Intolerância ao leite | Artigo

Descobertas científicas relacionadas a mutações genéticas e a enzimas responsáveis pela digestão da lactase aumentam a compreensão sobre os graus de intolerância ao leite.
Publicado em 26/04/2011
Revisado em 24/03/2021

Descobertas científicas relacionadas a mutações genéticas e a enzimas responsáveis pela digestão da lactase aumentam a compreensão sobre os graus de intolerância ao leite.

 

Ver o filho tomar um copo de leite faz a alegria da mãe, seja qual for a idade de ambos. Essa fama nutricional do leite obedece à lógica de aparência cristalina: somos animais mamíferos. Além disso, ele é um bálsamo para o estômago incendiado por excessos alimentares, alcoólicos ou nicotínicos. Para arrematar, é fonte inigualável de cálcio, indispensável para a formação do esqueleto e para impedir que mais tarde a osteoporose acabe com ele.

Os vegetais, principalmente as verduras de folhas escuras, como o brócolis, podem fornecer 250 miligramas de cálcio diárias para quem faça uso generoso deles. Mas, essa quantidade é insuficiente para as exigências do organismo: um grama por dia. Como um copo de leite, iogurte ou uma fatia de queijo contém de 250 a 300 miligramas, com os laticínios fica mais fácil atender aos reclamos da fisiologia.

Por outro lado, certas filosofias dietéticas avessas às demandas da metodologia científica contra-indicam a ingestão de leite e derivados, com o argumento de que nenhum outro mamífero o faz na vida adulta. De fato, mamíferos adultos não costumam mamar, porque não aprenderam as técnicas de pecuária que nossa espécie domina há nove mil anos.

Mas, por mais esdrúxulas que possam parecer essas filosofias, cabe reconhecer que cerca de 50% da população adulta mundial apresentam cólicas abdominais, flatulência e diarreia ao ingerir leite. Esses casos são especialmente frequentes entre asiáticos e habitantes do leste africano.

Para digerir a lactose existente no leite, o organismo depende da presença de uma enzima, a lactase, sob a ação da qual a lactose é quebrada em açúcares de moléculas menores. Durante a fase de amamentação, todos os bebês produzem lactase em quantidades adequadas, capacidade que será perdida pelos que se tornarão intolerantes ao leite no futuro.

A capacidade de digeri-lo na vida adulta surgiu graças a mutações nos genes que silenciam a lactase. Com a domesticação do gado, numa época em que a fome vivia à espreita, nossos antepassados portadores dessas mutações levaram a vantagem do acesso fácil a um alimento de alto teor calórico que lhes aumentava a chance de sucesso reprodutivo.

Cinco anos atrás, foi identificada uma mutação genética que regula a expressão de lactase, responsável pela boa digestão de leite em adultos finlandeses e outros europeus do norte.

Curiosamente, a mesma mutação aparecia em freqüência bem menor em povos com dietas ricas em laticínios, como os do Oriente Médio e do sul da Europa, e estava ausente na maioria das populações africanas que se dedicam ao pastoreio.

Atualmente, um grupo liderado por Sarah Tishkoff, da Universidade de Maryland, colheu amostras de sangue de 470 habitantes da Tanzânia, Quênia e Sudão, pertencentes a 43 grupos étnicos distintos, para estudar os genes responsáveis pela expressão de lactase.

Os resultados, que acabam de ser publicados na revista Nature Genetics, revelaram a presença de três mutações distintas no mesmo fragmento da molécula de DNA em que ocorre aquela diagnosticada nos europeus do norte.

Em seus portadores, a ingestão de leite era acompanhada por aumento das taxas de açúcar no sangue, demonstração indireta da capacidade de digerir lactose.

As mutações descritas foram detectadas em frequências variáveis nos africanos testados; a maioria deles apresentava apenas uma, mas outros chegavam a ter duas e até mesmo as três.

Através de técnicas de análise comparativa de DNA, os geneticistas calcularam que essas variações surgiram no continente africano num período de 3.000 a 7.000 anos atrás. Seus portadores levaram tanta vantagem nutricional e reprodutiva que elas se disseminaram rapidamente na população, no melhor estilo darwinista.

Os achados sugerem que podem existir outras mutações ainda desconhecidas e que a habilidade de digerir leite não é simples questão de ser capaz ou não. A herança genética responsável por ela é mais complexa do que se imaginava, e pode explicar os diferentes graus de tolerância a que os adultos se referem quando tomam um copo de leite.

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