Segundo o maior estudo de revisão realizado até hoje, a aspirina pode diminuir os riscos de câncer de intestino, estômago, e esôfago. Porém, existem riscos associados.
O câncer de intestino (ou colorretal) é o terceiro mais comum no país, por isso, pensar em estratégias de prevenção é essencial, já que a maioria dos casos está relacionada a fatores ambientais. Estudos recentes têm explorado o potencial da aspirina, um medicamento amplamente disponível, para reduzir o risco de desenvolvimento desse tipo de tumor. Mas até que ponto essa abordagem é segura e eficaz?
De acordo com o dr. Pedro Averbach, cirurgião coloproctologista do Hospital Sírio-Libanês, em São Paulo, “a aspirina é um medicamento anti-inflamatório e, portanto, pode ajudar a reduzir a inflamação no intestino, que está ligada ao crescimento de tumores. Ela faz isso inibindo a formação de uma substância chamada prostaglandina que o corpo produz e que causa inflamação. Além disso, quando os tumores crescem, eles precisam que novos vasos se formem para nutri-lo (esse processo é chamado angiogênese). A aspirina impede esse acontecimento”.
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O dr. Raphael Brandão, chefe de oncologia da Rede de Hospitais São Camilo de São Paulo, destaca que a aspirina também inibe a enzima ciclooxigenase-2 (COX-2), crucial na produção de prostaglandinas pró-inflamatórias. “A inflamação crônica é um fator-chave no desenvolvimento do câncer colorretal. A aspirina interfere em um mecanismo que impulsiona o crescimento de células malignas, bloqueia a angiogênese e pode melhorar a resposta imunológica contra células cancerígenas”, diz o oncologista.
Esses processos biológicos explicam, desse modo, por que estudos recentes apontaram uma redução de até 18% no risco de câncer colorretal entre os usuários regulares de aspirina.
Quem pode se beneficiar do uso preventivo da aspirina?
O dr. Brandão destaca ainda que as evidências mostram benefícios mais claros em grupos de maior risco. “Os maiores beneficiados são indivíduos com hábitos de vida menos saudáveis, como por exemplo tabagistas, pessoas obesas e sedentárias. Nessa população, a incidência de câncer colorretal caiu de 3,4% para 2,1% com o uso de aspirina”, afirma.
O coloproctologista complementa que pessoas com histórico familiar de câncer colorretal ou síndromes hereditárias, como a síndrome de Lynch, também podem se beneficiar. “Pessoas com pólipos intestinais ou lesões pré-cancerígenas identificadas em exames anteriores são candidatos potenciais para essa estratégia.” No entanto, é essencial avaliar caso a caso, considerando histórico de sangramentos ou uso de outros medicamentos.
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Os riscos do uso regular de aspirina
Apesar de seu potencial preventivo, a aspirina não é isenta de riscos. “O uso regular de aspirina pode levar a riscos significativos, sendo os mais comuns os sangramentos gastrointestinais, especialmente em pessoas com histórico de úlceras, gastrite ou que fazem uso de anticoagulantes ou corticoides, além de hemorragias intracranianas, embora menos frequentes, mas potencialmente graves”, explica o dr. Averbach.
Além disso, é importante evitar o uso da aspirina em combinação com outros medicamentos. O coloproctologista também cita que é preciso considerar reações alérgicas e problemas renais em casos de uso prolongado. “O uso da aspirina deve ser sempre individualizado, considerando os benefícios e riscos para cada pessoa. É essencial que os pacientes discutam com seus médicos antes de iniciar qualquer uso preventivo.”
“Um outro efeito secundário é a descontinuação súbita do uso da aspirina, que pode aumentar os eventos vasculares, elevando em três vezes os eventos cardíacos e também os acidentes vasculares isquêmicos”, alerta a dra. Anelisa Coutinho, presidente da Sociedade Brasileira de Oncologia Clínica (SBOC). Ela também explica que “a aspirina deve ter indicações precisas para populações específicas e sempre pesando riscos e benefícios, considerando risco de efeitos adversos e uso após informação clara e concordância dos pacientes”.
Comparação com outras estratégias para prevenir o câncer de intestino
A aspirina deve ser vista como uma abordagem complementar, e não como uma substituição às estratégias preventivas mais consolidadas. O dr. Averbach explica que há medidas amplamente seguras e eficazes para prevenção desse tipo de câncer: “A dieta equilibrada, rica em fibras, frutas, vegetais e pobre em carnes processadas, e a prática de atividade física regular são medidas com benefícios adicionais para a saúde geral. Além disso, o rastreamento regular por colonoscopia é considerado a medida preventiva mais eficaz”.
O dr. Brandão, chefe de oncologia, enfatiza justamente o papel da colonoscopia, que diz ser insubstituível na detecção precoce de pólipos e tumores. “A colonoscopia não apenas detecta precocemente o câncer, mas também permite a remoção de pólipos antes que evoluam para tumores malignos. Comparativamente, a aspirina apresenta uma redução modesta no risco de câncer colorretal”, pontua.