Diabetes, anemia, deficiência de nutrientes, transtornos alimentares e ‘efeito sanfona’ estão relacionados à busca obsessiva do emagrecimento, e podem ser resultado da pressão estética
A descoberta de um novo efeito fora da bula do medicamento Ozempic, usado para o tratamento do diabetes tipo 2, tem preocupado especialistas. Nos últimos meses, a canetinha com medicação injetável se tornou mais popular nas redes sociais por promover emagrecimento e redução da sensação de fome nos usuários. No entanto, o medicamento não é indicado para tratar obesidade até o momento, e seu uso indiscriminado pode causar efeitos colaterais. Enquanto novos estudos são feitos, o debate sobre a busca a qualquer custo pelo emagrecimento se tornou mais acirrado.
Não é nenhuma novidade a “descoberta” de fórmulas mágicas, efetivas ou não, para emagrecimento rápido e fácil. Dietas, jejum, chás, redução de carboidratos, remédios, suplementos e fórmulas sempre foram comuns entre a população que quer muito obter um novo resultado ao subir na balança. Porém, de acordo com a nutricionista Rejane Viana, existem consequências para esse tipo de comportamento.
Dores de cabeça e no corpo, carência de nutrientes, risco de diabetes aumentado, perfil de colesterol alterado, além do chamado “efeito sanfona” são os principais problemas na saúde física dos pacientes depois de tentar métodos rápidos para emagrecer, de acordo com Viana. “É comum que, quando o paciente chega até mim, eu pergunte quais foram as vias que ele já tentou para alcançar aquele objetivo, e que a resposta seja ‘todas’.” Segundo a nutricionista, as pessoas procuram o profissional de saúde tardiamente, depois de recorrerem a métodos caseiros e provisórios para emagrecer, prejudicando sua saúde.
Diferença entre emagrecer e perder peso
Um dos principais riscos de recorrer a medicamentos e a fórmulas rápidas de emagrecimento, segundo Viana, está contido na diferença entre emagrecer e perder peso. “Existem muitas pessoas que buscam prioritariamente a redução de peso na balança; nesses casos, o paciente pode perder peso, mas porque reduziu a retenção de líquido e a massa muscular, mas não reduziu o percentual de massa gorda”, explica a nutricionista.
Por isso, é muito importante focar no emagrecimento saudável ao procurar perder peso e ter um corpo desejado. Do ponto de vista nutricional, Viana explica o que é um processo saudável: “A primeira coisa é observar quais são os elementos que levam a pessoa a ter aquele condicionamento físico. A gente vai observar fatores como alimentação, uso das horas do dia, se é uma pessoa ativa ou inativa, se tem alguma relação com o status psicológico, tudo em uma gestão muito individualizada”, esclarece.
Além disso, o emagrecimento saudável também depende da saúde psicológica do indivíduo. Para a psicóloga Alessandra Rameth, esse processo exige a criação de uma autoimagem positiva. “Muitas vezes a pessoa gorda não é vista como digna de ser amada; e é na construção da autoimagem que a gente vai fortalecer a nossa autoestima. Para isso, se pode buscar terapia, conhecer, falar e ressignificar nossas dores, buscando o melhor pra nós mesmos”, afirma.
Quando o assunto é emagrecimento, quem sofre mais?
A Organização Mundial da Saúde (OMS) considera a obesidade uma doença que precisa ser levada a sério. Porém, outro fator faz com que as pessoas queiram ser mais magras: a pressão estética. De acordo com a observação clínica de Rameth e de Viana, essa cobrança recai principalmente sobre as mulheres.
Para Rameth, para entender se a busca do emagrecimento é saudável ou não, é preciso se perguntar “de onde vem” esse desejo. “A gente sabe que existe toda uma pressão por trás, né? Quando, nos nossos corpos, principalmente nos corpos das mulheres, essa vontade de emagrecer ultrapassa as barreiras de ter uma vida saudável, já é algo obsessivo e que pode gerar sofrimento emocional”, afirma.
Viana adverte que a obesidade necessita de acompanhamento profissional, pois pode vir acompanhada de problemas cardiometabólicos associados. Porém, cada pessoa tem um diagnóstico personalizado, que considera, inclusive, o biotipo individual, muito além do peso na balança. “Uma pessoa que a olho nu se nota não ter um excesso acentuado de peso, e que não tem nenhum problema de saúde em curso, tem uma necessidade que vem de uma pressão social para emagrecer, que recai majoritariamente no corpo da mulher”, relata.
Rameth e Viana, dizem que questões relacionadas à interseccionalidade de gênero e raça tornam o sofrimento ainda mais profundo. “As mulheres pretas não são colocadas no lugar de ser amadas. Então, quando a gente traz essa reflexão para uma mulher preta que não está dentro do padrão, ela não é vista duas vezes mais, por conta do corpo e por conta da cor”, afirma. Viana explica, inclusive, que cada biotipo tem necessidades nutricionais diferentes, e que isso também se aplica para pessoas pretas, que geralmente têm deficiência de vitamina D, por exemplo, por causa do alto nível de melanina.
Veja também: Uso de Ozempic requer acompanhamento médico
Conteúdo produzido em parceria com Afrosaúde.
Sobre a autora: Milena Félix é jornalista, redatora e, nas horas vagas, escritora e viajante. Interessa-se por assuntos relacionados à saúde da mulher, meio ambiente e à saúde e sociedade.