Da descoberta da gravidez até o pós-parto, é importante se atentar à saúde mental das mães recentes. Conheça os transtornos mais comuns que podem surgir nesse período.
Por muitos anos, a maternidade foi romantizada, mas nem só de alegrias vive uma mãe. Com o alcance das redes sociais, cada vez mais mulheres usam as plataformas para relatar o outro lado da maternidade, que também pode ser composta por frustrações, ansiedade, tristeza e culpa.
Existe até uma expressão muito usada durante o puerpério: nasce uma mãe, nasce uma culpa. Mas será que isso é verdade ou existem outros fatores que impactam diretamente a qualidade de vida e a saúde mental dessas cuidadoras?
Muitas discussões ainda pautam esse universo materno, tanto na vida pessoal quanto na profissional, mas alguns cuidados podem começar ainda na gestação como prevenção aos sintomas de ansiedade e depressão.
Principais tipos de transtornos
Depressão pós-parto (DPP) e ansiedade são os transtornos mais comuns quando falamos de maternidade, mas algumas mulheres podem desencadear tristeza materna, psicose puerperal ou transtorno de estresse pós-traumático (TEPT).
Depressão pós-parto
A depressão pós-parto acomete cerca de 15% das mulheres após o nascimento do bebê. Os sintomas são parecidos com um quadro de depressão comum, mas os sinais que precisam de mais atenção são: tristeza, cansaço extremo, sentimento de culpa intenso, além do sentimento de incapacidade de cuidar do filho, mesmo que seja uma atividade que ela já tenha feito anteriormente.
“Os riscos para a saúde e integridade da mãe e do bebê são os sinais mais preocupantes da depressão pós-parto, pois como a mãe se vê em estado de inconstância emocional pode colocar a sua vida e a do bebê em risco. Em alguns casos essa depressão pode acometer o pai também”, explica Ana Cláudia da Silva, que é psicóloga e orientadora profissional.
Ansiedade e tristeza materna
Normalmente, a ansiedade aparece como um sintoma da depressão, mas em casos isolados, as mulheres começam a apresentar insônia, humor depressivo e oscilação nas tomadas de decisão. Principalmente mulheres que sentem medo de retornar ao mercado de trabalho, tanto pela separação do bebê, quanto pelas empresas que muitas vezes não oferecem os suportes necessários ou as demitem logo após a licença.
Psicose puerperal
Uma a cada 5 mulheres pode desenvolver a psicose materna, que tem como principais características alucinações, transtornos do sono associado, oscilações de humor e até delírios. Sendo necessário uma avaliação mais aprofundada com acompanhamento psiquiátrico.
Transtorno de estresse pós-traumático
Esse transtorno acomete mulheres que, mesmo antes do fim da gestação, enfrentaram situações traumáticas, como procedimentos invasivos, alguma complicação durante a gravidez, violência doméstica, algum tipo de acidente, e no pós-parto através de violência obstétrica, perdas perinatais, entre outros.
Por isso que, além dos cuidados físicos, é necessário ficar atento à saúde mental das gestantes durante o pré-natal, que muitas vezes acaba sendo negligenciada por conta das mudanças hormonais.
Veja também: Por que as mulheres negras têm mais risco de sofrer violência obstétrica?
O que é o puerpério? Ele também é um transtorno?
O puerpério, também conhecido como resguardo, não é um transtorno, mas é um período pós-parto que dura em média 45 dias, que é quando o organismo da mulher começa o processo de voltar a ser o que era antes da gravidez.
As modificações que acontecem são físicas e emocionais, mas devido a uma queda hormonal muito grande que acontece nesse momento, algumas mulheres podem desencadear sentimentos negativos, como tristeza profunda, mas isso não faz com que todas desenvolvam algum distúrbio como a depressão pós-parto.
“As principais fontes dessa tristeza são:
- expectativa, muitas mães idealizam como será o nascimento e desenvolvimento de seus bebês e na realidade podem comprovar que isso nem sempre será possível, existe aí uma desconstrução de seu imaginário;
- insegurança, principalmente se for mãe de primeira viagem, onde essa mãe acredita não saber lidar bem com essa nova função, tem medo de pegar o bebê, se sente incapaz de cuidar de seu filho e isso lhe traz um sentimento de inadequação;
- insatisfação com o novo corpo, pois nessa fase a tendência do corpo que abrigou por meses uma nova vida teve que se adequar e acabou perdendo suas formas, essa mãe não se identifica com aquilo que vê”, enumera a psicóloga Ana Cláudia.
Além disso, a mulher que vive em um ambiente hostil, onde existe sobrecarga, ausência de rede de apoio e julgamento, pode ter esses sentimentos intensificados, ao mesmo tempo em que o corpo está em processo de adaptação novamente.
Como cuidar da saúde mental antes e depois da gestação?
Durante o período gestacional, existem alguns cuidados que podem ajudar no equilíbrio físico e emocional das gestantes. Lembrando que nunca devemos forçar ninguém a nada, e desde que não faça mal a integridade da mulher e do bebê, ela tem o direito decidir o caminho a seguir durante esse período.
Para amenizar os sentimentos, as expectativas irreais e o medo, devemos oferecer suporte emocional de forma acolhedora e humanizada. Respeitando os limites entre o que nós achamos e o que a mulher deseja.
Mas acompanhamento profissional com psicólogos também é recomendado, afinal, através das terapias ela pode desmistificar a maternidade romantizada, desenvolver autonomia nas tomadas de decisões, aprender mais sobre si mesma e o que ela espera como mãe, e tem mais chances de enfrentar as expectativas não correspondidas de forma mais saudável.
“Sabemos que nem todos podem ou estão dispostos a essas terapias, então concomitantes a elas ou em separado, essa mulher pode recorrer a terapias alternativas como boas práticas de exercício físico (devendo sempre consultar seu médico), alimentação adequada, meditação, massagens, grupos de mães e se possível se distanciar daquilo que a faz mal como, por exemplo, companhias e opiniões tóxicas”, completa Ana Cláudia.
Veja também: Como fica o corpo após a gestação – Saúde Sem Tabu #21
Como criar uma rede de apoio para as mães?
O termo rede de apoio se tornou bastante popular nos últimos tempos, mas ele não necessariamente se diz respeito somente ao bebê recém-nascido, afinal, precisamos cuidar de quem cuida também.
Existe um provérbio africano que diz: “É preciso uma aldeia para se educar uma criança”, e ele nos mostra como é importante pensarmos na mãe e no bebê como parte essencial da comunidade, além de expor o tamanho da dedicação necessária na infância para o desenvolvimento saudável e feliz daquele indivíduo.
‘’Partindo desse pressuposto, podemos dizer que desde o seu nascimento essa mãe e essa criança precisam de uma rede de apoio. Sejam familiares ou amigos, que podem compor essa teia de afeto”, explica a psicóloga.
Essa rede vai além de se colocar à disposição. Veja algumas dicas de como ajudar na prática:
- Quando for visitar a família, leve ou cozinhe uma comida fresquinha;
- Cuide do bebê para que a mãe possa tomar um banho sem pressa ou tirar um cochilo sem interrupções;
- Faça companhia para a mãe que, mesmo na presença do bebê, pode estar se sentindo de lado nessa fase;
- Gestos e palavras de carinho também ajudam a levantar o humor e autoestima da mulher;
- Não deixe de incluí-la em convites ou em assuntos diferentes da maternidade, só porque ela se tornou mãe;
- Ofereça apoio sempre que for possível.
“Entender e respeitar o tempo e experiência daquela mãe, sem ficar cobrando e a enchendo de culpa, é o mínimo que ela merece”, encerra Ana Cláudia.
Sobre a autora: Gabriella Zavarizzi é jornalista especializada em conteúdos digitais. Tem interesse em assuntos relacionados a neurociências, saúde mental, autismo, TDAH e primeira infância.
Conteúdo produzido em parceria com Afrosaúde
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