A longevidade do sexo frágil | Artigo

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Publicado em: 18 de abril de 2011

Revisado em: 11 de agosto de 2020

Por ironia das forças naturais que selecionaram os genes de antepassados, continuamos maiores e fadados a morrer mais cedo do que as mulheres, mesmo agora, quando a maioria delas já perdeu o interesse pela força bruta. Veja artigo do dr. Drauzio sobre longevidade do sexo frágil.

 

Nós, do chamado sexo forte, morremos bem mais cedo do que as mulheres. A explicação tradicional para essa constatação demográfica tem sido a de que levamos vidas mais atribuladas e cheias de riscos do que elas. Afinal, em nossa história evolutiva, nós é que saíamos atrás da caça e declarávamos guerra aos inimigos para roubar-lhes os pertences e o território, enquanto elas permaneciam no aconchego das cavernas tomando conta dos filhos que trazíamos ao mundo.

 

Veja também: Especulações sobre a longevidade

 

O maior apego feminino à prole também costuma ser usado como justificativa evolucionista para o ganho de longevidade delas. No passado, levaram vantagem na seleção natural não apenas as mães que cuidaram bem de seus filhos, mas especialmente as que viveram mais tempo, entraram em menopausa e puderam ajudar na criação dos netos. Essas mulheres de vida mais longa teriam deixado mais descendentes, garantindo maior penetração de seus genes no “pool” genético das gerações futuras.

Embora avós carinhosas aumentem as chances de sobrevivência dos netos e os dados estatísticos mostrem que os homens têm maior probabilidade de morrer em desastres automobilísticos, em homicídios e em acidentes com armas de fogo, esses eventos não constituem explicação definitiva para a diferença de longevidade entre os dois sexos. A frequência de homicídios e de acidentes fatais começa a aumentar significativamente entre os homens a partir da puberdade, de fato, mas diminui a partir dos 30 ou 40 anos para se tornar praticamente igual à das mulheres depois dos 60 anos. Mesmo depois dessa idade, entretanto, continuamos a morrer mais cedo do que elas.

Sarah Moore e Kenneth Wilson, da Universidade de Stirling, na Inglaterra, acabam de publicar um estudo na revista “Science” que acende outras luzes sobre o tema.

Depois de estudar a incidência de infestações por insetos, parasitas e doenças infecciosas em diversas espécies de mamíferos, os autores concluíram que, nos animais estudados, os machos apresentam maior suscetibilidade a doenças infecciosas e parasitárias do que as fêmeas.

E, mais, que tal suscetibilidade é consequência do dimorfismo sexual, isto é, do tamanho avantajado que os machos costumam atingir em relação às fêmeas na maioria das espécies dos animais que, como nós, mamam quando filhotes.

Na evolução das espécies, o dimorfismo sexual existente entre machos grandes e fêmeas de tamanho menor é indicativo de intensa disputa masculina pelo privilégio do acasalamento no passado. A explicação é simples: nos combates intra-sexuais, para atrair a atenção feminina, os machos mais fortes levaram vantagem seletiva e transmitiram a seus filhos genes que lhes garantiram portes avantajados. As fêmeas, por sua vez, sempre interessadas nos machos mais poderosos, capazes de lhes garantir a sobrevivência da prole, contribuíram decisivamente para a perpetuação dessa característica masculina.

Os dados obtidos por Moore e Wilson demonstraram que a maior fragilidade dos machos diante dos parasitas é regra geral entre os mamíferos e que ela adquire proporções extremas nas espécies em que a competição intra-sexual na disputa pelas fêmeas é mais feroz.

Os dados demográficos humanos dão suporte às conclusões dos pesquisadores ingleses.
No Japão, na Inglaterra e nos Estados Unidos, a vulnerabilidade dos homens à morte, causada por doenças parasitárias, é o dobro daquela encontrada nas mulheres. Um estudo conduzido no Cazaquistão e no Azerbaijão mostrou que, nesses países, essa proporção aumenta para quatro vezes.

A explicação mais imediata para a fragilidade do sexo forte em relação aos agentes parasitários e infecciosos é a de que a testosterona, o hormônio sexual masculino, provoca depressão imunológica. Um trabalho clássico, publicado há mais de 30 anos, mostrou que os homens castrados vivem em média 15 anos mais do que os não-castrados e que, quanto mais precoces forem quando sofrerem a castração, maior será a sua longevidade.

O mecanismo pelo qual a testosterona deprime a imunidade é mal conhecido.

Talvez por gastarem energia em excesso para construir e manter um sistema músculo-esquelético que imponha respeito aos rivais, os machos sejam obrigados a desviar a energia que seria utilizada por outros sistemas orgânicos. Com seus bilhões de células que exigem alta demanda energética para trabalhar orquestradamente, o sistema imunológico pode se ressentir dessa oferta diminuída e da disponibilidade de micronutrientes essenciais.

A espécie humana apresenta evidente dimorfismo sexual. A testosterona que começou a jorrar na circulação de nossos ancestrais à época da puberdade deles tornou-os mais fortes e violentos para competir pelo interesse feminino, sempre voltado à preservação da prole. A energia consumida pelo organismo para torná-los maiores e assegurar a transmissão de seus genes às gerações que os sucederam faz falta até hoje para enfrentarmos míseros parasitas microscópicos.

Por ironia das forças naturais que selecionaram os genes de nossos antepassados, continuamos maiores e fadados a morrer mais cedo do que nossas mulheres, mesmo agora, quando a maioria delas já perdeu o interesse pela força bruta.

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