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Hepatologia

Hepatite C: como funciona o tratamento gratuito pelo SUS e quais os desafios para erradicar a doença até 2030

Publicado em 14/05/2025
Revisado em 13/05/2025

Antivirais modernos curam a hepatite C em poucas semanas, mas especialistas alertam que o subdiagnóstico e as barreiras de acesso ainda dificultam o combate ao vírus no país.

Silenciosa em muitos casos, a hepatite C é uma infecção viral que atinge o fígado e pode evoluir para formas graves como cirrose e câncer de fígado. A boa notícia é que, com os medicamentos modernos disponíveis no Sistema Único de Saúde (SUS), ela é hoje considerada uma doença curável na imensa maioria dos casos. O Ministério da Saúde lançou um plano para erradicar a hepatite C como problema de saúde pública até 2030, seguindo a meta da Organização Mundial da Saúde (OMS).

Mas como funciona o tratamento no SUS? Quem tem direito? E por que o Brasil ainda enfrenta barreiras para eliminar o vírus?

Diagnóstico e início do tratamento

O tratamento da hepatite C começa com o diagnóstico, que pode ser feito por meio de testes rápidos ou exames laboratoriais para detectar anticorpos contra o vírus da hepatite C (anti-HCV). Segundo o dr. João Renato Rebello Pinho, coordenador médico do setor de Pesquisa e Desenvolvimento do Laboratório Clínico do Hospital Albert Einstein, em São Paulo, “se o teste for positivo, um exame de carga viral confirma a infecção ativa. Após o diagnóstico, o paciente pode ser encaminhado para tratamento gratuito no SUS, onde recebe medicamentos antivirais de ação direta, capazes de curar a infecção e impedir a progressão da doença”.

A dra. Mariana Gouveia, hepatologista do Hospital Sírio-Libanês de Brasília, detalha os caminhos possíveis dentro do SUS. “O diagnóstico da hepatite C no SUS começa com um teste sorológico para detectar anticorpos e, se positivo, é seguido pela confirmação da infecção ativa por meio do exame de PCR; se este também for positivo, o paciente está apto a iniciar o tratamento.  Antes do início da terapia, é feita uma avaliação completa, que inclui exames laboratoriais, análise da função hepática e do grau de fibrose (que é o endurecimento ou cicatrização do tecido do fígado causado por lesões repetidas ou inflamações crônicas, como as provocadas pela hepatite C). Investiga-se a possibilidade de coinfecções (como HIV, HBV e sífilis), comorbidades e possíveis interações medicamentosas.”

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Medicamentos disponíveis e taxa de cura

Os medicamentos oferecidos pelo SUS são modernos e altamente eficazes. De acordo com o dr. João Renato, “o SUS disponibiliza medicamentos modernos, os DAA (antivirais de ação direta) que inibem proteínas virais e são utilizados conjuntamente, pelo menos dois de duas classes diferentes: inibidores como a polimerase NS5B (ex. sofosbuvir), inibidores da proteína multifuncional essencial para a replicação viral e para montagem das partículas virais NS5A (ex. daclatasvir, velpatasvir, pibrenstavir) e a protease NS3/NS4A (ex. voxilaprevir, glecaprevir), que são altamente eficazes contra todos os genótipos do vírus. A taxa de cura com esses tratamentos pode ultrapassar 95%, garantindo a eliminação do vírus e prevenindo complicações hepáticas.

Quem tem direito ao tratamento?

Uma das maiores conquistas no enfrentamento da hepatite C é a ampliação do acesso ao tratamento, independentemente da gravidade da doença. “O tratamento é oferecido a todos os pacientes diagnosticados com hepatite C, independentemente do grau de comprometimento do fígado. O SUS prioriza grupos de risco, como pessoas que vivem com HIV, usuários de drogas injetáveis e pacientes com doenças hepáticas avançadas. Para iniciar a terapia, é necessário passar por avaliação médica em unidades de saúde especializadas”, explica o dr. João Renato.

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Diagnóstico precoce: onde e como testar?

O Ministério da Saúde recomenda a testagem periódica para hepatite C em grupos com maior risco de infecção, como pessoas com 40 anos ou mais, indivíduos que receberam transfusão de sangue ou transplante antes de 1993, usuários de drogas injetáveis ou inaláveis, pessoas privadas de liberdade, gestantes durante o pré-natal e pessoas vivendo com HIV ou outras infecções sexualmente transmissíveis (IST). A testagem deve ser feita mesmo na ausência de sintomas, já que a hepatite C é frequentemente assintomática. “O diagnóstico precoce é essencial para evitar complicações. A população pode realizar testes rápidos em Unidades Básicas de Saúde (UBS) e Centros de Testagem e Aconselhamento (CTA). Caso o resultado seja positivo, o paciente deve procurar um especialista para iniciar o tratamento adequado. Esses testes são simples, seguros e fornecem resultados em até 30 minutos”, esclarece a dra. Mariana. 

O plano do Brasil para erradicar a hepatite C

Para cumprir a meta da OMS de erradicação da hepatite C até 2030, o Ministério da Saúde lançou em 2023 o Plano de Eliminação da Hepatite C como Problema de Saúde Pública, com apoio da Organização Pan-Americana da Saúde (Opas), da Organização Mundial da Saúde (OMS) e do Programa Conjunto das Nações Unidas sobre HIV/AIDS (Unaids).

A meta do governo é reduzir a incidência da doença em 90% e a mortalidade em 65%. Para isso, o plano prevê testagem ativa de populações-chave, ampliação do diagnóstico precoce, acesso facilitado ao tratamento e monitoramento em tempo real dos casos.

Apesar dos avanços, especialistas apontam que o país ainda precisa superar uma série de barreiras. Para o dr. João Renato, “o Brasil enfrenta desafios como a baixa testagem da população, a necessidade de ampliar o acesso ao tratamento e a busca ativa de pacientes que ainda não foram diagnosticados”.

A dra. Mariana Gouveia também enumera outros entraves: “Barreiras como desigualdades regionais, distância de unidades de saúde, estigmatização e falta de informação dificultam o acesso ao diagnóstico e ao tratamento, sobretudo entre populações vulneráveis. Questões sociais, como condições econômicas precárias, baixa escolaridade e acesso limitado aos serviços de saúde, também mantêm a cadeia de transmissão ativa”.

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