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Aparelhos auditivos | Entrevista

Os problemas de audição mais graves são os que se manifestam nas células ciliadas da cóclea. Nesses casos, a solução é usar aparelhos auditivos que ajudam a amplificar os sons e melhoram a acuidade auditiva.
Publicado em 10/11/2011
Revisado em 11/06/2021

Os problemas de audição mais graves são os que se manifestam nas células ciliadas da cóclea. Nesses casos, a solução é usar aparelhos auditivos que ajudam a amplificar os sons e melhoram a acuidade auditiva.

 

O órgão da audição é dividido em três partes fundamentais: orelha externa, orelha média e orelha interna (imagem 1). A orelha externa é constituída pelo pavilhão auditivo, uma espécie de concha acústica que capta as ondas sonoras e as envia para o conduto auditivo a fim de que atinjam e façam vibrar a membrana do tímpano. Essas vibrações são transmitidas para três ossinhos – martelo, bigorna e estribo – que se articulam perfeitamente bem e são a porta de entrada do ouvido médio. Dali, através da janela oval, elas alcançam a orelha interna formada pela cóclea, uma estrutura parecida com um caracol, e revestida por células ciliadas muito sensíveis. Essas células captam as ondas sonoras, que até ali eram mecânicas, e as transforma em ondas elétricas, para serem conduzidas até o cérebro pelo nervo auditivo. É o cérebro que reconhece se determinado som é o latido de um cachorro, um solo de guitarra ou a voz de uma pessoa.

Problemas de audição podem acometer as três partes da orelha. Em geral, os que acometem a orelha externa são os mais simples. Muitas vezes, a produção de cerume é maior e ele se acumula no canal auditivo, impedindo que o som alcance naturalmente a membrana do tímpano. Os que acometem os três ossinhos da orelha média podem ser resolvidos cirurgicamente. Os piores são mesmo os que se manifestam nas células ciliadas da cóclea. Nesses casos, a medicina tem pouco a oferecer e a solução é usar próteses que ajudam a amplificar os sons e melhoram a acuidade auditiva.

 

HISTÓRICO

 

Drauzio  Quando começaram a ser usados os aparelhos que ajudam a amplificar o som?

Kátia de Almeida – As primeiras tentativas de encontrar uma forma de resolver os problemas que afetavam a audição surgiram no final do século 19. No início, os aparelhos eram feitos de chifres de animais e tinham o formato de uma corneta que amplificava o som em 10 ou 15 decibéis, o que é muito pouco. Foi só a partir de 1920, que apareceram as primeiras próteses auditivas elétricas, que não eram portáteis e tinham de ser colocadas sobre a mesa para que pudessem ser usadas. Os aparelhos auditivos eletrônicos, como os que conhecemos hoje, foram criados na década de 1950.

 

Drauzio – Você disse que os aparelhos com formato de corneta amplificavam o som na ordem de 10 a 15 decibéis. Quanto amplificam os mais modernos?

Kátia de Almeida – Atualmente, há aparelhos que amplificam o som em 70 decibéis e que, teoricamente, podem ser adaptados para todos os graus de perda auditiva.

 

INDICAÇÃO PARA CRIANÇAS

 

Drauzio  Qualquer pessoa com diminuição da acuidade auditiva deveria usar esses aparelhos? 

Kátia de Almeida – A discussão hoje é que não há um grau de perda auditiva que seja mais adequado ao uso da prótese. Qualquer que seja ela, leve ou profunda, o portador do distúrbio é potencial candidato ao uso do aparelho. Nos adultos, a perda de audição adquirida acarreta implicações psicossociais que podem afetar sua vida tanto pessoal quanto profissionalmente. Portanto, a indicação do aparelho não só é feita com base no grau da perda, mas também no comprometimento da qualidade de vida.

Nas crianças, o problema é mais sério. Não se pode permitir que mesmo com grau leve ou perda moderada, elas deixem de usar o aparelho de amplificação, uma vez que isso prejudicaria o desenvolvimento da fala e da linguagem.

 

Drauzio – Existem aparelhos para crianças que apresentam déficit auditivo muito grave?

Kátia de Almeida – Os aparelhos modernos são amplificadores de som bastante potentes, capazes de alcançar 140 decibéis. Acontece que, se a lesão da cóclea for extensa e a perda de grau profundo, às vezes não se consegue obter resposta satisfatória com as próteses auditivas de amplificação convencional e o paciente é encaminhado para um implante coclear.

 

Drauzio – Qual a função do implante coclear nas perdas auditivas?

Kátia de Almeida – O implante coclear é um recurso importante para os portadores de perdas auditivas graves que não respondem satisfatoriamente às próteses auditivas convencionais. Ele é constituído por eletrodos que são introduzidos na cóclea para produzirem estimulação elétrica direto nas fibras do nervo ótico.

 

Drauzio – Quanto mais cedo as crianças que nascem com perdas auditivas graves forem tratadas, melhor será o resultado final? 

Kátia de Almeida – Sem dúvida nenhuma. Trabalhos realizados fora do Brasil apontam que não é só o grau de perda da audição que determina o atraso no desenvolvimento da fala e da linguagem da criança com perda auditiva profunda. Também pesa o momento da intervenção. Portanto, diagnóstico precoce e uso de aparelho associados ao início da terapia fonoaudiológica até o sexto mês de vida aumentam a chance de a criança desenvolver a fala e a linguagem, assim como de atingir desenvolvimento social e psicológico iguais ao da criança ouvinte.

 

Veja também: Problemas de audição podem impedir a criança de aprender a falar

 

TIPOS DE APARELHO

 

Drauzio – Você poderia explicar como funcionam os aparelhos que aparecem na imagem 2?

Kátia de Almeida – São dois modelos de um aparelho chamado retroauricular, que pode ser usado tanto por adultos e idosos quanto por crianças de dois ou três meses de idade. Eles diferem no formato e na largura, porque precisam ficar anatomicamente bem adaptados. Além disso, precisam ser leves, pois serão usados por longos períodos de tempo.

 

Drauzio – O aparelho que aparece na imagem 3 também deve ser usado atrás da orelha?

Kátia de Almeida – Também é um aparelho retroauricular. O fio que se vê estabelece conexão entre o aparelho que vai atrás da orelha e o meato acústico. Na verdade, todos os aparelhos são confeccionados com base num molde auricular. No caso dos retroauriculares, esse molde pode ser mais ou menos oclusivo, dependendo da configuração da perda da audição.

 

Drauzio – Os aparelhos da imagem 4 são bem pequenininhos.

Kátia de Almeida — Esses aparelhos são chamados de microcanais e pertencem à categoria dos intra-aurais. São aparelhos personalizados, montados dentro do molde da orelha do futuro usuário e sua adaptação é perfeita.

 

Drauzio – Qual o critério para indicar um aparelho retroauricular ou intra-aural à pessoa com perda auditiva?

Kátia de Almeida – Nós nos baseamos principalmente nas características audiológicas (grau e configuração da perda auditiva) e anatômicas do indivíduo. Por exemplo, para uma criança de dois ou três meses, não se pode indicar um aparelho de microcanal, porque não existe espaço no pavilhão auricular e no meato auditivo para montar o aparelho.

 

RESISTÊNCIA DOS IDOSOS 

 

Drauzio – A perda da audição pode manifestar-se mais para sons agudos do que para graves, por exemplo?

Kátia de Almeida – Pode. No entanto, a configuração mais comum é a descendente, ou seja, a audição se mostra mais preservada para os sons graves e menos para os sons de alta frequência (agudos). Mas o contrário também pode ocorrer ou, ainda, a pessoa pode ter uma configuração horizontalizada em que a audição dos graves e agudos está comprometida.

 

Drauzio – A perda da audição ocorre obrigatoriamente nas pessoas de mais idade?

Kátia de Almeida – Não é obrigatória como a presbiopia. Depende de fatores hereditários e de certas condições de vida, como exposição a ruídos, uso de medicamentos etc. O que mais se observa, porém, é que o sistema auditivo também envelhece à medida que os anos passam. Hoje, são muitos os idosos com problemas de audição, especialmente quanto aos sons de alta frequência, o que prejudica muito a inteligibilidade da fala. Embora os graves sejam conservados, eles ouvem, mas não compreendem o que foi falado.

 

Drauzio – Esse é o tipo de perda que obriga as pessoas a pedirem para os outros repetir, a todo o momento, o que acabaram de dizer.

Kátia de Almeida – Exatamente. E elas não se dão conta de que não estão ouvindo direito. É comum dizerem: “Eu não estou surda, pois escuto todos os barulhos”. E escutam mesmo, porque a perda está situada nos sons de alta frequência, nos sons da fala. Elas escutam, mas perdem a capacidade de discriminação, uma vez que o som deixa de ser percebido com nitidez.

 

Drauzio  Para elas parece que o interlocutor está falando um pouco baixo.

Kátia de Almeida – Não só um pouco baixo. A qualidade do som também deixa a desejar com o corte dos agudos.

 

Drauzio – Em geral, essas pessoas têm certo preconceito quanto ao uso de aparelhos de amplificação sonora. 

Kátia de Almeida – O uso de aparelhos está cercado por um estigma. As pessoas imaginam que o fato de necessitarem um aparelho de amplificação sonora é sinal de que estão velhas e incapazes de desempenhar suas funções. Além disso, particularmente acho que essa rejeição ocorre porque a surdez é um mal invisível. Logo identificamos uma pessoa cega. A pessoa que não ouve é difícil de identificar, a não ser que esteja usando a libra, ou seja, a linguagem de sinais, ou um aparelho na orelha, embora eles sejam cada vez menores e mais discretos. Os aparelhos não são ouvidos novos, porque não são capazes de fazer tudo que o sistema auditivo faz.

Costumo brincar com meus alunos que a maioria usa óculos, provavelmente sem precisar deles para enxergar. São óculos de grife, com modelos e cores atraentes. Aparelhos de amplificação sonora, a indústria faz da cor da pele e do menor tamanho possível, o que é complicado do ponto de vista da eletrônica. Apesar disso, as pessoas nem sempre aceitam usar um recurso tão bom para contornar a deficiência auditiva que é um distúrbio muito mais frequente do que se pensa.

 

Drauzio  É comum o ponto eletrônico que usam os apresentadores da televisão, por exemplo, interferir na qualidade do som. Isso também acontece com os aparelhos auditivos? 

Kátia de Almeida – Os aparelhos evoluíram muito e, atualmente, utilizam tecnologia digital. Seus fabricantes investem muito em pesquisa para que o som seja de alta qualidade, livre de interferências e distorções. Teoricamente, são capazes de amplificá-lo com a qualidade original que chegou ao microfone. Eventualmente, interferências podem acontecer, mas não é isso que se espera.

 

CUSTO

 

Drauzio – Qual é o custo médio desses aparelhos? 

Kátia de Almeida — Esses aparelhos não são produzidos no Brasil. São todos importados. Isso, somado ao investimento em pesquisa, faz com que seu custo seja alto. O preço dos mais simples varia de 2 mil a 9 mil, 10 mil reais por unidade, uma vez que não são vendidos aos pares com as lentes dos óculos.

 

Drauzio — O SUS fornece esses aparelhos de graça? 

Kátia de Almeida – Atualmente, sim. Na verdade, houve grande avanço em termos de legislação, no que se refere à política de atenção à saúde auditiva. Desde 2002, uma portaria ministerial, a Portaria 432, garante o fornecimento de próteses auditivas aos usuários. Recentemente, essa portaria foi alterada pelas portarias 587 e 589 e os usuários, além das próteses auditivas, têm direito ao acompanhamento terapêutico.

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