Estão em andamento diversos estudos com milhares de participantes para esclarecer o papel da vitamina D na prevenção de enfermidades crônicas.
Ainda trago na memória o gosto insuportável do óleo de fígado de bacalhau que minha avó me empurrava goela abaixo, antes do almoço.
A crença nos poderes milagrosos dos fígados dos bacalhaus vinha do século 19. Em 1822, um médico polonês observou que o raquitismo era mais comum nas crianças que haviam migrado para as cidades. Dois anos mais tarde, os alemães sugeriram que a doença fosse tratada com óleo de fígado de bacalhau.
Veja também: Entrevista sobre o excesso de vitamina D no organismo
Em 1848, médicos ingleses conduziram um dos primeiros ensaios clínicos da história da medicina. Mais de mil pacientes com tuberculose foram divididos em dois grupos: um deles foi tratado com três colheres diárias do insuportável óleo, enquanto o outro recebeu apenas cuidados gerais. No final, haviam morrido 33% dos pacientes do grupo controle, contra 19% do grupo tratado.
Até a descoberta de medicamentos específicos para a tuberculose em meados do século 20, os doentes eram enviados para respirar ar puro e fazer repouso, nas montanhas. Nos sanatórios, era obrigatório expô-los ao sol da manhã.
O tratamento com óleo de fígado de bacalhau e a fototerapia tinham um denominador comum: a vitamina D, só descoberta em 1922.
Ao contrário de outras vitaminas, o corpo humano produz cerca de 90% da vitamina D que necessitamos; o restante vem dos alimentos.
Sob a ação dos raios ultravioletas, uma molécula precursora existente na pele (7-dihidrocolesterol) transforma-se numa forma inativa da vitamina D, que será convertida em ativa no fígado e nos rins.
Depois de examinar centenas de trabalhos, o Institute of Medicine dos Estados Unidos concluiu, em 2010, que ‘embora haja evidência de que a vitamina D é importante para a saúde dos ossos, não há benefícios que justifiquem seu uso com outras finalidades’.
A descrição recente de que a maioria das células do organismo possui receptores para vitamina D, serviu de base para preconizar seu uso na prevenção de males crônicos, como diabetes, câncer, asma, Alzheimer e doenças cardiovasculares.
Esses conhecimentos, associados à dificuldade de exposição ao sol característica da vida urbana, criaram um mercado fértil para o consumo indiscriminado de suplementos contendo vitamina D que, nos Estados Unidos, saltou de U$ 50 milhões em 2005, para U$ 600 milhões em 2011.
Muitos pesquisadores desaprovam essa estratégia de medicar em massa. No passado, outras vitaminas que pareciam trazer benefícios à saúde, demonstraram efeito contrário.
Nos anos 1990, a crença de que o betacaroteno seria dotado de efeito antioxidante capaz de neutralizar os compostos cancerígenos do cigarro, levou os finlandeses a dividir 30 mil fumantes em dois grupos, um dos quais recebeu suplementos com betacaroteno. Para surpresa, justamente nesse grupo houve aumento de 18% na incidência de câncer de pulmão e de 8% na mortalidade geral.
Estudo semelhante conduzido nos Estados Unidos dois anos mais tarde precisou ser interrompido por causa do aumento do número de casos de câncer de pulmão e de mortes entre os que receberam betacaroteno.
Em 2008, um ensaio clínico para estudar o papel da vitamina E e do selênio na prevenção do câncer, também foi interrompido precocemente: a suplementação provocou aumento de 17% na incidência de câncer de próstata.
Enquanto uma corrente defende que níveis sanguíneos mais baixos de vitamina D estejam associados a diversas doenças crônicas, outros consideram simplista essa explicação. Para eles, a hipovitaminose é mais comum em pessoas que não tomam sol, portanto fazem menos exercício e levam vida menos saudável. Além disso, como se trata de uma vitamina solúvel em gordura, indivíduos obesos (portanto mais propensos a doenças crônicas) apresentam níveis sanguíneos mais baixos.
Depois de examinar centenas de trabalhos, o Institute of Medicine dos Estados Unidos concluiu, em 2010, que “embora haja evidência de que a vitamina D é importante para a saúde dos ossos, não há benefícios que justifiquem seu uso com outras finalidades”.
Estão em andamento diversos estudos com milhares de participantes para esclarecer o papel da vitamina D na prevenção de enfermidades crônicas. Enquanto os resultados não são conhecidos, é mais sensato confiar no método natural: expor braços e pernas ao sol durante 5 a 30 minutos (a pele escura sintetiza com mais dificuldade), duas vezes por semana, ou apanhar sol no corpo inteiro a cada dois ou três meses, por tempo suficiente para deixar a pele um pouco mais pigmentada.