Estima-se que mais de 50% da população mundial tenha sido contaminada pelo Sars-CoV2. Novos estudos mostram os efeitos das reinfecções por covid. Leia no artigo do dr. Drauzio Varella.
A covid veio para ficar. Quando a epidemia se espalhou pelo mundo, imaginávamos que a infecção induziria imunidade duradoura, de modo que estaríamos livres dela para sempre, como acontece com diversas viroses.
A realidade mostrou-se muito diferente. Hoje, passados pouco mais de três anos, a estimativa é de que mais de 50% da população mundial tenha sido infectada pelo Sars-CoV-2. Nos Estados Unidos, país com estatísticas mais confiáveis, o cálculo é de que pelo menos 65% da população foi infectada duas vezes ou mais.
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A presença continuada do vírus entre nós sugere que parte significante da população terá infecções múltiplas nos próximos anos, apesar da vacinação. As opiniões dos especialistas a respeito das consequências dessas reinfecções dividem-se em dois grupos:
1) o vírus gradativamente perderá virulência, provocando quadros mais leves, semelhantes aos dos resfriados comuns, especialmente nas pessoas vacinadas.
2) o risco de complicações será renovado a cada nova infecção, com alterações do sistema imunológico associadas a problemas crônicos de saúde.
As reinfecções costumam ser menos frequentes, é provável que estejam entre 5% e 15%, número que deve crescer com o passar do tempo. Quando elas ocorrem, a resposta imunológica costuma eliminar o vírus com mais facilidade.
Uma pesquisa conduzida entre jogadores de basquete da Liga Americana mostrou que, nas reinfecções, o vírus é eliminado em média depois de cinco dias, período mais curto do que a média de sete dias na primeira infecção. A eliminação é mais rápida ainda naqueles vacinados depois da primeira infecção.
Vários estudos sugerem que o risco de complicações diminui com as sucessivas reinfecções. Um estudo realizado no Catar, com cerca de 6 mil de pessoas não vacinadas infectadas pela primeira vez, ao lado de 1,3 mil reinfectadas, mostrou que, na reinfecção, o risco de quadros graves ou fatais foi cerca de 90% mais baixo.
Uma pesquisa no Reino Unido avaliou 3,8 milhões de pessoas infectadas pela primeira vez, e 14 mil reinfectadas. Entre estas, o risco de morte no mês seguinte à nova infeção caiu 61%; o de internação em UTI, 76%. Esses dados, no entanto, não asseguram que a reinfecção terá evolução benigna. Os pacientes que tiveram quadros mais graves na primeira infecção continuam mais vulneráveis.
Numa coorte norte-americana que contém informações de mais de 16 milhões de pessoas, quase 80% dos reinfectados tiveram doença com poucos sintomas nas duas vezes.
Quadros graves na reinfecção foram mais frequentes entre os que apresentaram complicações na primeira infecção. Cerca de 30% dos que precisaram de ventilação mecânica na primeira internação foram hospitalizados no segundo episódio de covid.
Uma pesquisa conduzida entre 500 mil veteranos de guerra nos Estados Unidos concluiu que adquirir covid mais de uma vez é mais arriscado: o risco de morte duplica e o de internação hospitalizar triplica. Aumenta também o risco de complicações cardíacas e de formação de coágulos. A vacinação parece não fazer diferença nesses casos.
A análise dos dados que emergiram desse estudo mostrou que a cada novo surto de covid o número de complicações aumenta: doenças pulmonares, cardíacas, diabetes, fadiga prolongada, transtornos neurológicos — conjunto de manifestações que caracterizam a covid longa.
Contraditoriamente, no Reino Unido, um estudo mostrou o oposto: o risco de um adulto adquirir covid longa na primeira infecção foi de 4%, proporção que caiu para 2,4% na reinfecção.
Por outro lado, esse estudo revelou que a reinfecção piora pelo menos um dos sintomas em 80% dos que convivem com a covid longa. Apenas 15% não identificaram piora da sintomatologia.
Há muitas razões para evitar novas infecções pelo Sars-CoV-2. Alguns especialistas defendem que, mesmo a doença com sintomas leves, pode provocar alterações de longa duração no sistema imunológico.
Outros, consideram que faltam pesquisas para comprovar uma possível atividade imunodepressora prolongada do vírus. Embora tenham sido documentadas diversas anormalidades imunológicas associadas à infecção, para a maioria das pessoas infectadas não há evidências de que o vírus seja causador de deficiência imunológica, como aquela provocada pelo HIV ou outras viroses.
De qualquer forma, o mais seguro é ficar longe desse vírus que não vai desaparecer tão cedo.