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Cuidados paliativos: é possível melhorar mesmo com doença avançada?

Suspender um tratamento pode trazer melhora para a qualidade de vida. Entenda como funciona a proporcionalidade nos cuidados paliativos

Suspender um tratamento pode trazer melhora para a qualidade de vida. Entenda como funciona a proporcionalidade nos cuidados paliativos

Uma mulher com câncer de mama e metástase óssea possui uma doença avançada. Isso não significa que ela está, necessariamente, no fim da vida, já que ainda pode passar vários anos convivendo com o tumor. Por isso, ela é candidata aos cuidados paliativos, abordagem capaz de levar a uma melhora do quadro.

Os cuidados paliativos são práticas que priorizam alívio, conforto e bem-estar do paciente. Um dos seus grandes pilares é a proporcionalidade do tratamento. Isto é: esse tratamento vai realmente melhorar a qualidade de vida ou apenas gerar um resultado biológico sem sentido?

“Existe o que chamamos de tratamento potencialmente inapropriado. Embora ele possa atingir alguns objetivos clínicos, é muito improvável que resulte em uma sobrevida digna. Por exemplo: insistir em quimioterapia em um paciente que já está piorando e com a doença avançando. Ou ainda tratar inúmeras infecções com antibióticos em pacientes que não respondem mais e vêm de várias internações sucessivas. Isso dificilmente trará impacto positivo na qualidade de vida”, explica João Batista Garcia, anestesiologista e presidente da Academia Nacional de Cuidados Paliativos (ANCP).

Esse cálculo é feito desde o início dos cuidados paliativos, mas é especialmente importante quando o paciente chega à fase final da vida, em que o tratamento causa impactos no seu bem-estar que podem ser negativos. 

Dá para melhorar com cuidados paliativos?

Quando o tratamento desproporcional é interrompido, o paciente pode melhorar o humor, o ânimo, a interação social e a realização de atividades do dia a dia.

“Há pesquisas que mostram que pacientes com câncer avançado, nos quais a quimioterapia foi suspensa porque só piorava a qualidade de vida, viveram mais e melhor do que aqueles que continuaram a recebê-la. Isso porque a quimioterapia os deixavam com febre e em hospitalizações constantes por infecções”, detalha o dr. João.

Ao melhorar, o paciente vai precisar retomar a quimioterapia? Não necessariamente. Em geral, não, já que a melhora veio, justamente, pela suspensão do tratamento que só trazia impactos negativos.

Por outro lado, um paciente com uma doença neurodegenerativa que, em geral, está bem, mas apresenta uma infecção pulmonar, pode ser levado à UTI para tratamento, voltando, depois, ao seu estado funcional anterior. Estar em cuidados paliativos não significa que mais nenhum tratamento será feito, contanto que as novas indicações garantam meses adicionais de vida com qualidade para que o paciente faça suas escolhas, organize a sua vida e ajuste questões pessoais.

Como reajustar o tratamento sem que os sintomas retornem?

Novamente, resgata-se a lógica da proporcionalidade.

“Nunca retiramos nada que esteja direcionado ao conforto. No cuidado paliativo, especialmente no fim da vida, é comum fazermos a desprescrição — ou seja, retirar medicamentos que não trazem impacto real. Por exemplo, remédio para colesterol em paciente em fase terminal. Isso pode ser retirado sem prejuízo. Por outro lado, nunca retiramos analgésicos, antieméticos, remédios para sono, laxantes, enfim, tudo que contribua para conforto e dignidade”, afirma o presidente da ANCP.

Essa decisão é pensada pelo paciente, seus familiares e a equipe médica. O cuidado paliativo oferece a prerrogativa de não apenas seguir protocolos clínicos, mas discutir se vale ou não continuar. A Resolução n° 2.232/2019 do Conselho Federal de Medicina (CFM) ampara a escolha do paciente, inclusive a de recusar tratamentos. 

“Quem deve estar no centro é o paciente, sua autonomia e seus desejos. Assim, ele pode pensar junto com a equipe. Se preferir, pode delegar as decisões à família. O importante é que tudo seja feito de forma alinhada, para que todos estejam na mesma página e se evitem conflitos”, recomenda o especialista.

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