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Energético para crianças: já ouviu falar?

Entenda os riscos à saúde infantil das bebidas que imitam energéticos, com altas doses de açúcares, corantes e aditivos.

Entenda os riscos à saúde infantil das bebidas que imitam energéticos, com altas doses de açúcares, corantes e aditivos.

Nos últimos anos, chegaram ao mercado brasileiro bebidas voltadas ao público infantil que imitam os energéticos tradicionais. Com embalagens coloridas, nomes divertidos e promessas como “energia para brincar” ou “mais disposição”, esses produtos têm chamado a atenção de pais nas gôndolas dos supermercados e acendido o sinal de alerta entre profissionais da saúde. Embora comercializados como seguros para crianças, sua composição causa preocupações quanto aos efeitos no organismo infantil.

Apesar de geralmente não conterem grandes doses de cafeína (principal estimulante dos energéticos convencionais), muitas dessas bebidas trazem ingredientes como guaraná, taurina e ginseng, além de altas concentrações de açúcares, corantes artificiais, conservantes e vitaminas do complexo B. Essa combinação pode interferir no sono, no comportamento, no desempenho escolar e até na saúde cardiovascular dos pequenos.

“O termo ‘energético infantil’ é enganoso. O que se vende, na prática, são bebidas açucaradas com embalagens e personagens que atraem as crianças, mas carregadas de açúcar, corantes e aditivos”, adverte Cristiano Góes, pediatra especialista em Alergia e Imunologia pelo Instituto da Criança da Faculdade de Medicina da USP.

O que diferencia essas bebidas?

Segundo o médico, enquanto os energéticos tradicionais são direcionados ao público adulto e possuem doses consideráveis de cafeína e taurina, as versões infantis preocupam por outros fatores.

“Esses produtos costumam conter grandes quantidades de açúcares como sacarose, xarope de milho, glicose e frutose. Também incluem corantes como o amarelo tartrazina (E102) e o vermelho allura AC (E129), que já foram associados ao aumento da hiperatividade e ao TDAH em crianças suscetíveis”, explica.

A fórmula ainda incorpora aromatizantes e conservantes que intensificam o sabor e também a durabilidade. Mesmo sem cafeína, o conjunto de aditivos é motivo de preocupação.

Sono, comportamento e aprendizado em risco

Entre os efeitos imediatos, destacam-se as alterações no sono e no comportamento. O consumo exagerado de açúcar, especialmente no período noturno, pode interferir no descanso adequado.

“O excesso de energia deixa o corpo em estado de alerta, dificultando o relaxamento. Isso atrapalha o início do sono, prejudica sua qualidade e, em alguns casos, pode causar insônia”, afirma Cristiano.

Como consequência, a criança tende a acordar cansada e mais impaciente, apresentando menor rendimento escolar. O pediatra explica que os picos de glicose no sangue provocam oscilações de ânimo e comprometem a concentração.

“O aumento rápido de energia causado pelo açúcar é seguido por uma queda brusca, o que pode gerar irritabilidade, mau humor e dificuldade de atenção”, acrescenta. Esses efeitos prejudicam o aprendizado, a memória e o comportamento na escola.

Além disso, a associação precoce entre disposição e itens industrializados pode criar um padrão de consumo nocivo: recorrer a bebidas processadas para combater o cansaço ou melhorar o desempenho.

Veja também: Cafeína pode ser prejudicial à saúde das crianças e adolescentes

Efeitos de longo prazo no coração e no fígado

Mesmo sem complicações imediatas para o sistema cardiovascular, o consumo contínuo desses produtos pode causar danos a médio e longo prazo. O excesso de açúcar está relacionado ao crescimento de doenças crônicas.

“O uso frequente dessas bebidas favorece o surgimento de quadros como obesidade infantil, hipertensão, colesterol elevado e até diabetes tipo 2, todos fatores de risco para problemas cardíacos no futuro”, alerta o especialista.

Outro ponto relevante, mas pouco discutido, é o impacto sobre o fígado. O consumo elevado de frutose, comum nessas fórmulas, pode contribuir para o desenvolvimento de fígado gorduroso não alcoólico (FGNA), condição que também afeta a saúde cardiovascular.

Essas doenças não aparecem de forma repentina, mas se acumulam com os anos. Tudo começa com hábitos alimentares inadequados durante a infância, que evoluem para quadros silenciosos na vida adulta.

Falta de regulação e recomendações médicas

No Brasil, essas bebidas não pertencem a uma categoria sanitária específica. Isso permite que sejam comercializadas como produtos com adição de vitaminas ou extratos naturais, sem restrições claras por faixa etária.

Em países como Reino Unido e Estados Unidos, medidas já vêm sendo adotadas para limitar ou proibir a venda de energéticos para menores de idade. Nos EUA, por exemplo, a FDA (Agência Federal de Saúde Pública) já proibiu o uso de determinados corantes em alimentos, bebidas e medicamentos por causa dos riscos à saúde infantil e da população em geral.

Diante desse cenário, o pediatra reforça: a recomendação é que crianças não consumam esse tipo de bebida. “Elas não trazem nenhum benefício nutricional e podem representar riscos significativos ao desenvolvimento saudável”. A verdadeira fonte de energia para os pequenos está em uma alimentação equilibrada, boas noites de sono e momentos de lazer e brincadeiras ao ar livre.

Veja também: Bebidas energéticas fazem mal à saúde?

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