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Pediatria

Menstruar antes dos 10 anos aumenta os riscos de doenças crônicas

Especialistas explicam como a puberdade precoce pode afetar o metabolismo, o crescimento e a saúde emocional das meninas

Menstruar antes dos 10 anos não é apenas um marco biológico fora do tempo esperado, é também um alerta para a saúde. A primeira menstruação, chamada de menarca, quando ocorre muito cedo, está associada a um risco aumentado de doenças como diabetes tipo 2, hipertensão e problemas cardiovasculares na vida adulta.

A puberdade precoce é caracterizada quando os primeiros sinais de maturação sexual aparecem antes dos 8 anos. “É fisiológico quando a puberdade começa entre 8 e 13 anos em meninas. Portanto, se esses sinais aparecem antes dos 8, é considerado um processo precoce”, explica Aline Marques, ginecologista do Hospital e Maternidade Santa Joana, em São Paulo (SP).

Carolina Affonseca, pediatra e coordenadora da pós-graduação em Pediatria da Afya Educação Médica, reforça ainda que o primeiro sinal puberal costuma ser o broto mamário, conhecido como telarca.

Veja também: Menstruação precoce: por que acontece e como pode impactar a infância?

 

O que é a puberdade precoce

A puberdade é o período em que o corpo passa a produzir hormônios sexuais e desenvolver características físicas adultas, como mamas, pelos pubianos e menstruação.  Quando isso acontece antes da idade esperada, o organismo entra em um ritmo acelerado que pode trazer consequências a curto e longo prazo.

Segundo a dra. Carolina, existem dois tipos principais de puberdade precoce:

  • Central: ocorre por ativação antecipada do eixo hipotálamo-hipófise-gonadal. “Nas meninas, cerca de 90% dos casos são idiopáticos, ou seja, não têm uma causa identificada. Já nos meninos, é mais comum estar associado a alterações do sistema nervoso central, especialmente tumores cerebrais”, explica.
  • Periférica: ocorre quando há aumento da produção de hormônios sexuais pelas gônadas ou glândulas adrenais. “As principais causas são a exposição externa a esteróides sexuais ou tumores produtores de hormônios. As características sexuais, nesse caso, podem ou não ser compatíveis com o gênero da criança”, completa.

Causas e fatores de risco

Embora muitos casos não tenham causa definida, alguns fatores podem favorecer o início antecipado da puberdade. O excesso de peso é um dos mais frequentes. “O acúmulo de gordura produz hormônios que podem favorecer a ativação precoce do eixo hormonal”, explica a dra. Aline.

Há também influências ambientais. “Padrão alimentar alterado, consumo de ultraprocessados e alimentos de alto índice glicêmico podem contribuir para o ganho de peso excessivo e, consequentemente, para a puberdade precoce”, afirma a ginecologista.

Além disso, fatores como exposição a hormônios externos, disruptores endócrinos, saúde geral da criança, desnutrição, genética familiar e até contexto socioeconômico são descritos como possíveis influenciadores.

 

O que acontece no corpo da criança

O impacto no organismo é amplo. Quando a puberdade começa cedo, o corpo passa a responder como o de uma adolescente, com aumento na produção hormonal, desenvolvimento das mamas, surgimento de pelos e intensificação do odor corporal.

No crescimento, as consequências são marcantes. “A criança cresce rápido no começo, mas tende a parar mais cedo, o que reduz a estatura final em comparação ao que teria se a puberdade ocorresse no tempo adequado”, explica a pediatra.

Os efeitos emocionais também são relevantes. “Há aumento de risco de bullying, sexualização precoce e sensação de ser diferente dos colegas”, diz a dra. Aline. 

Segundo a dra. Carolina, os impactos podem ir além: “A puberdade precoce está associada a maior estresse, alterações de comportamento, retraimento social e até queda no rendimento escolar.”

Veja também: O que a menstruação diz sobre a sua saúde

 

Menstruação precoce e doenças crônicas

Menstruar antes dos 10 anos está diretamente relacionado ao aumento do risco de doenças metabólicas e cardiovasculares ao longo da vida. “As meninas que menstruam cedo ficam expostas por mais tempo à produção de estrogênio e progesterona, hormônios que podem alterar o metabolismo da glicose e da insulina”, explica a pediatra.

Essa exposição prolongada favorece:

  • acúmulo de gordura corporal;
  • resistência à insulina;
  • síndrome metabólica;
  • dislipidemia;
  • hiperglicemia;
  • hipertensão.

A ginecologista reforça que, embora os mecanismos ainda não sejam totalmente compreendidos, a associação já é consistente. “Estudos, incluindo um muito grande do Reino Unido e outro brasileiro, mostram que meninas que menstruam cedo têm risco aumentado de desenvolver diabetes, hipertensão e doenças cardiovasculares.”

Há impacto também no sistema reprodutivo. “O número maior de ovulações ao longo da vida pode antecipar a menopausa”, acrescenta.

 

Quando procurar um médico

Os sinais que devem acender o alerta incluem:

  • aparecimento de seios;
  • surgimento de pelos pubianos;
  • intensificação do odor corporal;
  • crescimento muito acelerado;
  • qualquer sangramento vaginal antes dos 8 anos.

“Nesses casos, é fundamental procurar o pediatra ou o endocrinologista o mais cedo possível”, afirma a dra. Aline.

O diagnóstico envolve exames hormonais, ultrassonografia pélvica e radiografia de mão e punho para avaliação da idade óssea. “Outros exames podem ser necessários, dependendo da avaliação clínica”, completa a dra. Carolina. A médica reforça também que há tratamentos adequados tanto para a puberdade precoce central quanto para a periférica.

 

A importância do acompanhamento

A puberdade precoce não deve ser vista apenas como uma mudança natural. É um sinal de que o organismo precisa de atenção. O acompanhamento médico e psicológico ajuda a proteger não apenas a saúde física, mas também o bem-estar emocional da criança.

“É muito importante que essa criança seja acompanhada de forma multidisciplinar, com pediatra, endocrinologista e, se necessário, psicólogo, para garantir um desenvolvimento saudável em todos os aspectos”, conclui a dra. Aline.

Veja também: 10 perguntas e respostas sobre a primeira consulta com ginecologista

 

Referências:

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