Se o profissional não souber a língua de sinais, pode ser necessário a mediação de um intérprete ou acompanhante durante a consulta. Veja como isso acontece na rede pública.
Dependendo do tipo de comprometimento da audição, a pessoa com deficiência auditiva usa diferentes meios para se comunicar em situações corriqueiras, como uma consulta médica. Enquanto algumas são capazes de fazer leitura labial, outras só conseguem entender o que o profissional de saúde está dizendo através da língua de sinais. Mas como fica essa relação quando a maioria dos médicos, enfermeiros e atendentes não sabem se comunicar em libras?
Barreiras na comunicação
No Sistema Único de Saúde (SUS), a responsabilidade com a saúde das pessoas com deficiência fica majoritariamente nas mãos dos gestores locais, que devem organizar os pontos de atenção desses grupos, garantindo equipe e estrutura qualificados para o atendimento. Na prática, porém, há alguns empecilhos.
“A primeira dificuldade é saber onde tem atendimento, e aí já é do próprio sistema, porque há uma escassez de profissionais habilitados em libras. O atendimento acaba sendo mediado por alguém, que normalmente é um familiar”, explica Atanael Weber, psicólogo do Centro de Prevenção e Reabilitação da Pessoa com Deficiência (Cepred) na Bahia.
Atualmente, tem havido uma difusão dos serviços em língua de sinais no Brasil. A Coordenação Geral de Saúde da Pessoa com Deficiência (CGSPD) oferece cursos para a capacitação dos profissionais de saúde, visando, por exemplo, a atenção primária.
O psicólogo relata, porém, que muitos coordenadores das unidades não liberam a equipe para a realização dessas formações por não entenderem a importância da habilidade. “Na psicologia, por exemplo, eu preciso de um conhecimento profundo da língua, porque não é só o que é dito que importa. Eu preciso identificar e estimular que a pessoa se expresse”, pontua.
Como facilitar o atendimento de pessoas com deficiência auditiva
Ainda que o esforço em tornar acessível o atendimento público em saúde seja incipiente, existem alguns direitos garantidos para pessoas com deficiência auditiva. Parte deles, inclusive, se popularizou durante a pandemia.
Solicitação de intérprete de libras para o atendimento
A advogada Mariana Bastos Dalla Vecchia Selke, que tem perda moderada de audição em um ouvido e grave no outro, explica que cabe ao poder público ter intérpretes de libras disponíveis nas unidades básicas ou, pelo menos, fornecê-los.
Nas prefeituras de cada município, existem centrais de interpretação em libras, com as quais o paciente pode entrar em contato e solicitar um tradutor para acompanhá-lo durante a consulta – ou em outras ocasiões, como uma audiência.
Por outro lado, considerando que a comunidade surda costuma ser pequena, é comum que o paciente conheça os intérpretes de libras da região, o que inviabiliza o atendimento por questões éticas. Quando possível, o psicólogo Atanael opta por encaminhá-lo para o teleatendimento com um profissional de outro local.
“Não existe uma tradução literal ou neutra entre as línguas. Então, aquilo que é dito passa pela subjetividade de quem vai traduzir, tanto no que é dito para o psicólogo quanto no retorno do profissional. [Isso] Acaba fragilizando o vínculo terapêutico”, afirma o especialista.
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Acompanhamento de um familiar ou pessoa de confiança
Se o paciente preferir, ele também está autorizado a levar um familiar ou alguém de confiança para fazer a tradução durante o atendimento. Esse era um direito garantido inclusive durante a pandemia, quando havia a proibição de acompanhantes nas consultas médicas.
Nesse período, o uso de máscaras foi uma barreira a mais para quem faz leitura labial, como é o caso de Mariana. Entre as soluções, ela cita as máscaras transparentes, que têm uma lâmina translúcida na região da boca. “A gente também tem que pensar em outras alternativas para quem não tem disponibilidade de sempre levar alguém junto”, pontua.
Além disso, quando o paciente vai ao consultório acompanhado de um familiar, ele pode acabar não relatando determinadas queixas, pois elas podem envolver o acompanhante ou mesmo causar vergonha.
Aplicativos que fazem tradução simultânea
Hoje, já existem diversos aplicativos gratuitos de celular e computador que transcrevem o som para a língua de sinais.
O Hand Talk, por exemplo, é brasileiro e foi eleito o melhor aplicativo social do mundo pela Organização das Nações Unidas (ONU). Ele pode ser instalado nos sistemas Android, iOS e Windows Phone. Outras opções são o VLibras, o Uni Libras e o Rybená.
Canais de denúncia
Se esses e outros direitos da pessoa com deficiência auditiva não forem respeitados, como a preferência no atendimento, ela pode procurar a Ouvidoria do SUS. Casos de discriminação em razão da deficiência também devem ser relatados no canal. O Disque Saúde 136 funciona de segunda à sexta-feira, das 8h às 20h, e aos sábados, das 8h às 18h.
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