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Neurologia

Microplásticos no cérebro: conheça os riscos e alimentos que expõem o corpo a essas partículas invisíveis

Publicado em 19/06/2025
Revisado em 18/06/2025

Especialistas apontam os grupos mais vulneráveis à exposição aos microplásticos e o possível impacto sobre doenças como ansiedade, depressão e demência.

 

A presença de microplásticos no cérebro humano não é mais apenas uma hipótese. Estudos recentes confirmam que essas partículas, que podem ter menos de 5 milímetros de diâmetro (o tamanho de uma ervilha bem pequena), foram encontradas em tecidos cerebrais, levantando alertas sobre possíveis impactos na saúde neurológica e nos transtornos mentais.

“Existem comprovações, sim, de que os microplásticos se acumulam no cérebro, inclusive em estudos brasileiros. Alguns pesquisadores da USP [Universidade de São Paulo] conseguiram mostrar isso em amostras cerebrais que passaram por análises microscópicas, comprovando acúmulos de microplásticos no cérebro, aparentemente até maiores do que no fígado”, afirma Marco Py, neurologista do Hospital São Lucas Copacabana, da Rede Américas, no Rio de Janeiro. 

Já Marcus Tulius, neurologista do Complexo Hospitalar de Niterói (CHN), também da Rede Américas, reforça: “Um estudo publicado na revista Nature Medicine este ano analisou 47 cérebros e encontrou partículas (principalmente de polietileno) em concentrações de 7 a 30 vezes maiores do que no fígado ou nos rins, especialmente em amostras de pessoas com demência.”

As vias de entrada são variadas e, muitas vezes, silenciosas. “As partículas menores que 100 nanômetros (chamadas nanoplásticos) têm maior probabilidade de atravessar a barreira hematoencefálica”, explica Gisele Sampaio, neurologista e pesquisadora do Hospital Albert Einstein, em São Paulo. Essa estrutura protege o cérebro, controlando a passagem de substâncias do sangue para o sistema nervoso central. Segundo ela, isso ocorre por mecanismos como o transporte transcelular, inflamações que aumentam a permeabilidade da barreira ou o acesso via nervo olfatório, especialmente no caso de inalação.

“A provável via de acesso seriam as vias olfatórias, ou seja, o acesso ao cérebro central seria pelo nariz. Então, os microplásticos seriam aspirados do meio ambiente e conseguiriam romper a barreira hematoencefálica pelas vias olfatórias”, diz o dr. Marco. 

Além disso, de acordo com o dr. Marcus, condições como inflamação ou doenças degenerativas podem aumentar a permeabilidade dessa barreira, o que acaba facilitando a entrada.

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Possíveis danos mentais e comportamentais

Apesar de as evidências diretas do efeito dos miroplásticos em humanos ainda estarem em desenvolvimento, estudos em animais oferecem pistas sobre os possíveis efeitos comportamentais dessas partículas no cérebro.

Pesquisas feitas com animais mostraram que, quando o cérebro é afetado, podem surgir sintomas parecidos com os de ansiedade e depressão, além de inflamação no sistema nervoso, desgaste nas células cerebrais, menor produção de substâncias importantes como dopamina e serotonina, e problemas no funcionamento das “usinas de energia” dos neurônios.

“O que a gente tem de mais concreto é que há a presença de microplásticos no sistema nervoso central dos seres humanos, principalmente no bulbo olfatório, e estudos em animais mostram que o acúmulo de microplásticos no sistema nervoso central leva a alterações comportamentais, que seriam modelos semelhantes à ansiedade, depressão e até mesmo demência”, explica o dr. Marco. 

Na mesma linha, o dr. Marcus cita que as pesquisas mostraram que a exposição aos microplásticos de poliestireno causa estresse oxidativo, inflamação cerebral e comportamento ansioso. “Também foram observadas alterações na microbiota intestinal, o que pode afetar o eixo intestino-cérebro associado a transtornos de humor.”

 

Alimentos ultraprocessados: os vilões da ingestão invisível

Boa parte da contaminação por microplásticos acontece por meio da ingestão, e os alimentos ultraprocessados são protagonistas nesse processo.

“A principal fonte de ingestão de microplásticos pelos seres humanos é proveniente dos alimentos que são embalados em plástico ou enlatados. Curiosamente, porque nesses alimentos enlatados, a lata frequentemente também é revestida por plástico”, esclarece o dr. Marco.

Para o dr. Marcus, diversos alimentos prontos estão associados à ingestão dessas partículas. “Água engarrafada (PET), por exemplo, frequentemente contém microplásticos, além de salgadinhos, alimentos congelados e temperos que também podem apresentar contaminação via embalagens plásticas e processamento.”

Além disso, bebidas em copos ou cápsulas plásticas (como café de cápsula, por exemplo), peixes e frutos do mar (especialmente bivalves, como mexilhões) e produtos ultraprocessados com muitas camadas de embalagem também estão entre os itens mais associados à ingestão de partículas, segundo a dra. Gisele. 

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Como se proteger

Os especialistas listam algumas dicas práticas para ajudar a reduzir o consumo involuntário de microplásticos no dia a dia:

  • Dê preferência a alimentos naturais e orgânicos, evitando os ultraprocessados e industrializados;
  • Prefira comida caseira sempre que possível;
  • Reduza o consumo de produtos embalados em plástico;
  • Armazene alimentos em recipientes de vidro ou metal, em vez de plástico;
  • Evite aquecer alimentos no micro-ondas em potes de plástico;
  • Beba água filtrada ou, quando possível, da torneira, em vez de água engarrafada em plástico;
  • Use roupas e utensílios feitos com materiais naturais.

 

Grupos mais vulneráveis

Crianças, idosos e pessoas com doenças preexistentes estão entre os mais suscetíveis aos efeitos dessas partículas.

“Crianças: devido à imaturidade da barreira hematoencefálica e maior absorção proporcional ao peso corporal. Idosos: com essa ‘barreira natural’ potencialmente mais permeável e menor capacidade de resposta antioxidante. Pessoas com transtornos neurológicos ou psiquiátricos prévios: podem ter alterações na barreira ou maior suscetibilidade a neuroinflamação”, afirma a dra. Gisele.

Segundo o dr. Marco, esses grupos têm uma reserva cognitiva mais baixa, o que aumenta o risco de transtornos mentais e cognitivos por conta desse acúmulo. “Além disso, como a criança tem um cérebro em formação e o sistema nervoso ainda está em amadurecimento ao longo da infância, expor as substâncias tóxicas nesse momento, teoricamente, vai levar a um dano maior.”

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