Salvo em situações especiais, as vitaminas que você compra nas melhores casas do ramo vão parar no vaso sanitário da sua casa. Leia no artigo do dr. Drauzio
Na época em que os marinheiros padeciam de escorbuto durante as travessias oceânicas, ficou claro que a doença podia ser curada pelo suco de limão. Descoberta semelhante ocorreu com a demonstração de que era possível prevenir o beribéri com a introdução de arroz integral na dieta.
Mais tarde, a ciência demonstraria que a vitamina C é a responsável pela cura do escorbuto e a tiamina — vitamina do complexo B— pela prevenção do beribéri.
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Em 1912, o bioquímico polonês Casimir Funk criou o termo vitaminas ao juntar as palavras vital aminas, micronutrientes que participam de reações bioquímicas essenciais para o organismo
Linus Pauling, o único cientista a receber dois prêmios Nobel não compartilhados (o de Química, em 1954, e o da Paz, em 1962), atribuiu à vitamina C propriedades tão fantásticas quanto prevenir gripes e resfriados, proteger contra o câncer e aumentar a longevidade. Para tanto, preconizava doses diárias que chegavam a ultrapassar 10 gramas — as doses recomendadas hoje pelos consensos são de 60 miligramas por dia.
Os prêmios recebidos por Pauling, os livros que publicou, seu carisma e a ênfase com que defendia a vitamina C, mesmo sem evidências científicas confiáveis, deu origem à chamada medicina ortomolecular e a uma enxurrada de produtos comerciais que inundaram as prateleiras das farmácias pelo mundo inteiro, criando um mercado de mais de US$ 50 bilhões anuais.
A popularidade dos complexos vitamínicos ganhou tanta relevância comercial que, nos Estados Unidos, 1 em cada 3 adultos faz uso deles diariamente. Nas grandes cidades americanas, há lojas especializadas na venda desses produtos — parecem supermercados.
O mercado mundial de vitaminas passa dos US$ 50 bilhões. No Brasil, o consumo aumenta a cada ano, reflexo da preocupação das famílias com a saúde. Em mais da metade das residências pelo menos um dos moradores faz uso delas.
A relação entre o consumo de suplementos vitamínicos e longevidade tem sido avaliada em diversas pesquisas. Os resultados foram quase sempre negativos, mas criticados por problemas metodológicos.
No ano passado, Loftfield, O´Connel e colaboradores publicaram no “Journal of the American Medical Association” (Jama) a análise de três grandes estudos prospectivos que incluíram 390 mil participantes, acompanhados por mais de 20 anos.
Confirmando a maioria dos estudos anteriores, a suplementação vitamínica não foi associada à redução da mortalidade. Pelo contrário, nos anos iniciais do acompanhamento, os que faziam uso deles apresentaram risco de mortalidade 4% mais alto do que o dos não usuários.
Esses dados, no entanto, não capturaram possíveis benefícios potenciais não relacionados à longevidade.
Por exemplo: 1) a suplementação com betacaroteno, vitaminas C e E e zinco está relacionada com redução na velocidade de progressão da degeneração macular, causa importante de cegueira nos mais velhos; 2) suplementação com multivitaminas pode corrigir as deficiências causadas pelas cirurgias bariátricas; 3) embora não haja consenso, alguns estudos sugerem que a suplementação multivitamínica esteja associada à proteção da memória em pessoas idosas; 4) produtos que incluem as vitaminas B12 e D podem suprir as necessidades dos mais velhos que se alimentam mal; 5) suplementação de ácido fólico para evitar malformação do tubo neural do feto deve ser introduzida um mês antes da concepção e ser mantida até o fim do primeiro trimestre da gravidez.
Por outro lado, avaliar apenas a mortalidade deixa de levar em conta alguns riscos.
Por exemplo: 1) a suplementação de betacaroteno em fumantes e em quem trabalhou com asbestos deve ser contraindicada, porque aumenta o risco de câncer de pulmão; 2) multivitaminas que contêm vitamina K interferem com a ação da varfarina, um anticoagulante; 3) suplementos que contêm ferro em doses altas podem provocar sobrecarga que está associada a aumento do risco de doenças cardiovasculares, diabetes e demência. 4) cálcio e zinco reduzem a absorção de alguns antibióticos.