Embora não exista um limite fisiológico formal para a duração da vida, cruzar as fronteiras atuais da longevidade vai requerer grandes avanços nas ciências médicas.
Ao falecer, em 1997, a francesa Jeanne Calment tinha 122 anos e 5 meses. É considerada a pessoa mais longeva de quantas viveu. Sua competidora mais próxima foi Sarah Knauss, que morreu em 1999, com 119 anos.
No início do século 20, a expectativa média de vida nos países mais ricos da Europa mal chegava aos 40 anos. Quando o século terminou, estava perto dos 80 anos. O mesmo fenômeno se repetirá na passagem para 2100?
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Em 1825, o demógrafo britânico, Benjamin Gompertz, enunciou a “Lei da Mortalidade”, segundo a qual, ao redor dos 30 anos de idade, o risco de morrer começa a aumentar de forma exponencial até um horizonte em que o risco final alcança 100%.
O limite de duração da existência humana divide os pesquisadores em dois grupos: os que julgam estarmos nas imediações do teto e os que defendem não haver evidências de que exista essa limitação. Em janeiro deste ano, a “Nature” trouxe uma discussão sobre esse tema. Tomo a liberdade de resumir a opinião de alguns especialistas ouvidos pela revista.
Um estudo conduzido entre italianos com 105 anos ou mais pelo grupo de Elizabetta Barbi, da Universidade Sapienza, de Roma, mostrou que a curva de Gompertz atinge um platô nessa idade, isto é, para de aumentar exponencialmente. Embora estável, a taxa de mortalidade a partir dos 105 é alta: 50% a cada ano que passa.
Você, leitor otimista, pode interpretar esse dado com boa vontade: se a cada ano morrem 50%, a outra metade sobrevive sem que seja possível estabelecer um limite claro para a duração da vida.
Uma análise matemática de Caleb Finch, da Southern California University, calculou que esse limite seria de 120 anos. A estimativa é compatível com o recorde estabelecido por Jeanne Calment.
Progressos capazes de estender a expectativa média de vida da população aumentam as chances de alguns privilegiados alcançarem idades extremas. A mortalidade infantil e os acidentes, por exemplo, impedem que uma pessoa com genética favorável complete cem anos.
Mesmo que não exista um limite fisiológico formal para a duração da vida, cruzar as fronteiras atuais da longevidade vai requerer grandes avanços nas ciências médicas.
A expectativa média de vida, na Suécia e no Japão, tem aumentado três meses por ano, desde 1840. Esse aumento persistirá? A julgar pelos dados obtidos no Reino Unido e nos Estados Unidos, não, já que neles a expectativa média cresceu pouco nos últimos dez anos. Foi encurtada pelas mortes prematuras por abuso de álcool, drogas ilícitas, suicídios, obesidade e transtornos psiquiátricos.
Em 2020, a ONU estimou em 573 mil os centenários do mundo. Esse número é 20 vezes maior do que o de 50 anos atrás. Em 1946, as 30 pessoas mais longevas do mundo tinham em média 99 anos. Em 2016, essa média atingiu 109 anos. Continuará a crescer nesse ritmo?
É provável que não. Hoje, os que ultrapassam cem anos chegam a tal idade em maior número e em melhores condições de saúde. Mas, nesse grupo, a expectativa de vida remanescente tem-se mantido a mesma nos últimos 80 anos.
Você, leitora inconformada, poderá argumentar: se a expectativa média de vida duplicou no decorrer do século passado, por que não poderei viver 150 anos?
Vamos deixar claro dois conceitos: a expectativa média de vida se refere à média de anos vividos por determinada população. Essa expectativa no Brasil, em 1940, não passava de 45 anos, enquanto em 2019 atingia 76, ganho obtido à custa da redução da mortalidade infantil e das mortes na infância e na juventude, graças às vacinas, ao soro caseiro, aos antibióticos, às melhores condições de higiene e à assistência médica.
A longevidade só leva em conta o grupo que viveu mais tempo em determinado grupo populacional.
Considere o caso das mulheres japonesas. É a maior expectativa média de vida na Terra: 87 anos. Como esse número se refere à média, o número das que passam dos cem anos é maior do que o de brasileiras ou de moçambicanas, mas isso não impede que uma moçambicana quebre o recorde mundial de longevidade.
Mesmo que não exista um limite fisiológico formal para a duração da vida, cruzar as fronteiras atuais da longevidade vai requerer grandes avanços nas ciências médicas. Não se tratará apenas de reduzir a mortalidade infantil e evitar as mortes precoces, mas encontrar soluções para doenças cardiovasculares, reumatológicas, câncer, diabetes e ainda ter que lidar com degenerações neurológicas, como a doença de Alzheimer.
Você quer viver muito, não quer? Eu também, mas não a qualquer preço.