A estimulação cerebral profunda vem sendo empregada cada vez mais no tratamento de doenças neuropsiquiátricas, melhorando a qualidade de vida dos pacientes.
No ano 50 d.C., o médico romano Scribonius Largus recomendava o uso do peixe elétrico para dores de cabeça e ataques de gota. Em 1786, o italiano Luigi Galvani demonstrou que correntes elétricas podiam ser transmitidas através dos nervos nas pernas de uma rã.
É provável que Largus e Galvani não tenham imaginado que um dia algumas doenças seriam tratadas com estímulos elétricos aplicados na profundidade do cérebro.
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Em 2014, Alim-Louis Benabid e Mahlon DeLong receberam o prêmio Lasker-Debakey pelo pioneirismo no campo da estimulação cerebral profunda, que resultou na melhora da qualidade de vida de mais de 100 mil pessoas com doença de Parkinson, distúrbios neuropsiquiátricos e outras enfermidades neurológicas.
A doença de Parkinson costuma ser diagnosticada em 1% a 2% da população com mais de 60 anos. Os sintomas que mais chamam a atenção afetam a motricidade: tremores, expressão facial em máscara, micrografia (escrita com letras pequenas), movimentos lentificados, voz lenta, desequilíbrio e passos encurtados.
Ao mesmo tempo, surgem quadros de depressão, ansiedade, apatia, alterações do sono e dificuldades cognitivas. Também são frequentes as alterações autonômicas: disfunções sexuais, constipação, problemas gastrointestinais e queda da pressão ao levantar para ficar em pé.
No passado, as pessoas acabavam travadas num quadro de adinamia e mutismo, como se estivessem congeladas num mundo à parte. A descoberta da droga levodopa, no fim dos anos 1960, permitiu despertá-las do estado catatônico e reintegrá-las ao convívio familiar.
Embora a neuroestimulação profunda não controle todos os sintomas e seja normalmente indicada depois que outros recursos falharam, o impacto na qualidade de vida de muitos pacientes é substancial e duradouro.
A medicação, no entanto, tem efeitos indesejáveis: tremores, movimentos involuntários, “congelamento” momentâneo ao andar.
A partir dos anos 1970, os estudos de DeLong e outros permitiram elucidar as funções dos gânglios basais, estruturas cerebrais envolvidas nos sintomas do Parkinson e de outras doenças neuropsiquiátricas.
Em 1987, Benabid teve a ousadia de introduzir um eletrodo na intimidade dessa região com a finalidade de liberar uma corrente elétrica contínua, num paciente que sofria de tremores incapacitantes.
Embora a Biologia e os mecanismos da estimulação elétrica profunda ainda estejam pouco claros, o impacto no tratamento do Parkinson foi tão grande, que a neuroestimulação passou a ser empregada em casos de tremores essenciais, distonias e epilepsias. E, de forma experimental, em transtornos obsessivos-compulsivos, depressão, síndrome de Tourette e até na doença de Alzheimer.
O eletrodo introduzido no cérebro fica ligado a uma bateria (neuroestimulador) que pode ser sepultada sob o couro cabeludo ou abaixo da clavícula. A programação da intensidade dos estímulos elétricos é feita periodicamente com um pequeno aparelho eletrônico que o técnico aproxima do neuroestimulador.
Embora a neuroestimulação profunda não controle todos os sintomas e seja normalmente indicada depois que outros recursos falharam, o impacto na qualidade de vida de muitos pacientes é substancial e duradouro.
Entramos na era da modulação das redes neurais humanas.