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Depoimento de quem já passou por uma gravidez de anencéfalo

"Negar ao aborto a uma mulher é condená-la a carregar um defunto na barriga", afirma Cátia Corrêa sobre sua gravidez de anencéfalo. Assiat ao depoimento.
Publicado em 11/04/2012
Revisado em 14/04/2021

“Negar ao aborto a uma mulher é condená-la a carregar um defunto na barriga”, afirma Cátia Corrêa sobre sua gravidez de anencéfalo. Assiat ao depoimento.

 

“Meu nome é Cátia Corrêa Fonseca. Eu engravidei pela primeira vez aos 23 anos. Fazia o pré-natal normalmente, mas no 5º mês, por meio de um ultra-som de rotina, meu médico disse que havia um “probleminha” com o bebê. Não me disse o que era, apenas afirmou que me encaminharia para o ginecologista Thomaz Gollop.

Só consegui a consulta com ele no 7º mês de gravidez. Ao realizar os exames, Thomaz foi categórico: o bebê era anencéfalo e apresentava vários defeitos genéticos que eram incompatíveis com a vida. Meu mundo desabou.

Minha mãe estava comigo dentro da sala acompanhando os exames. Quando soubemos que meu bebê não sobreviveria, ela caiu no chão. Jamais vou esquecer desta cena: a tela do ultra-som na minha frente e minha mãe caída.

Ao explicar os resultados dos exames, Dr. Thomaz disse que havia um caso parecido como o meu no Sul e que a Justiça havia concedido uma decisão favorável para a interrupção da gravidez e perguntou se eu gostaria de tentar.

Apesar de ser contra aborto, eu disse sim. Embora a gravidez não fosse planejada, não era uma situação em que eu não queria meu bebê. Desde o primeiro momento eu já amava minha menininha, a Natalie.

A minha barriga crescia muito mais que o normal e doía demais. Quando eu andava, precisava me sentar nas calçadas de tanta dor. O bebê mexia muito, mais que em uma gravidez normal, pois não tinha coordenação motora. A forma da minha barriga era esquisita, não sei explicar, mas era estranha.

O meu lado psicológico também foi bastante afetado. Qual é a primeira pergunta que se faz a uma grávida? “Já sabe o sexo?” ,“Quando nasce?” ,“E o enxoval, você já está fazendo?” . Eu evitava sair na rua para não ter que mentir ou chorar a cada pergunta dessas, que eram a morte para mim. Eu tinha um bebê que ia nascer condenado, nasceria morto ou morreria horas depois do parto. Não podia fazer enxoval, nem comprar nada para o meu bebê, ele não usaria….

O que é para uma mulher ver sua vida transformada sem poder fazer nada? A Justiça foi, sim, a minha melhor decisão. Quando saiu a deliberação, eu tive medo da resposta, já que essa era a minha última esperança.

A decisão foi favorável. Fui ao hospital na data marcada pelo dr. Thomaz . Ele me deu todo o apoio necessário. No dia 14 de setembro de 1993 o meu parto foi induzido. O procedimento foi muito difícil, com momentos terríveis. O bebê estava sentado, o que dificultou na hora do parto. Só não tive sequelas físicas porque ele era pequeno, com 0,5 kg. Embora traumático, tomei um medicamento pra secar o leite.

Digo não ao aborto, digo não para o abandono e maus tratos, mas digo sim a interrupção da gravidez de anencéfalo. Digo sim pelas minhas próprias dores, eu vivi isso. Negar esse direto a uma mulher é condená-la a carregar um defunto na barriga. É condená-la a não amar seu corpo. É condená-la até o fim da gestação, porque o bebê que cresce e mexe dentro dela, não poderá ser segurado, afagado e amado por ela. E é isso que uma mulher grávida quer: amar seu filho e ser amada por ele.

 

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