A alta taxa de mortes de adolescentes e jovens no mundo foi chamada de “crise emergente” pelos pesquisadores de um dos maiores e mais importantes estudos a respeito das causas de morbidade (taxa de indivíduos que adoecem em uma população específica durante um determinado período e local) e mortalidade mundiais, o Global Burden of Diseases, Injuries, and Risk Factores Study, conhecido pela sigla GBD.
Publicado na revista The Lancet no último domingo (12), a pesquisa avaliou os dados sobre a carga global de doenças referentes a 2023. O estudo, que contou com 16.500 pesquisadores e cientistas que coletaram e analisaram dados de mais de 310 mil fontes de dados de 204 países e territórios, trouxe informações sobre as principais causas de morte no mundo.
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Embora a mortalidade global tenha diminuído desde 1950, a morte de jovens aumentou na América do Norte, na América Latina e na África Subsaariana.
Outro dado importante do estudo revelou que as doenças crônicas não transmissíveis (DCNTs) foram responsáveis pela maioria das mortes, criando novos desafios globais de saúde.
Os transtornos mentais como ansiedade e depressão também apareceram como uma das principais causas de mortalidade e incapacidade no globo.
Transição epidemiológica e DCNTs
As doenças infectocontagiosas deixaram de ser a principal causa de mortes no mundo, sendo ultrapassadas pelas doenças não transmissíveis. Essa mudança marca uma fase de transição epidemiológica, caracterizada pelo envelhecimento da população mundial e pelo agravamento dos fatores de riscos dessas doenças, como obesidade e sedentarismo.
Desse modo, as DCNTs são responsáveis por quase 2/3 de morbidade e mortalidade no mundo. Entre as doenças não transmissíveis mais frequentes estão a doença cardíaca isquêmica, acidentes vasculares cerebrais (AVCs) e diabetes.
Os pesquisadores estimam que quase metade de todas as mortes e incapacidades poderia ser prevenida por mudanças no estilo de vida, como redução do peso corporal e dos altos níveis de glicemia.
Redução da mortalidade entre adultos
A população do mundo envelheceu e cresceu de 1950 a 2023, e a taxa de mortalidade global padronizada por idade em 2023 caiu 67% desde 1950. Todos os territórios pesquisados apresentaram declínios na mortalidade.
A expectativa de vida global retornou aos níveis pré-pandêmicos, de 76,3 anos para mulheres e 71,5 anos para homens, o que representa mais de 20 anos a mais em comparação a 1950. Apesar desse progresso, houve diferenças geográficas relevantes que reforçam o peso das desigualdades socioeconômicas no mundo. Dessa forma, a expectativa de vida variou de 83 anos em regiões de alta renda a 62 anos na África Subsaariana.
Aumento das mortes de jovens e transtornos mentais
Embora a taxa de mortalidade entre adultos esteja caindo no mundo, o mesmo não é observado entre adolescentes e jovens, que apresentaram crescimento da taxa de mortalidade em vários países.
O maior aumento de mortes registrado entre aqueles com idade entre 20 e 39 anos ocorreu na América do Norte de alta renda e em regiões da América Latina, principalmente entre mulheres jovens. Suicídio, overdose de drogas e consumo excessivo de álcool são as principais causas que levaram ao aumento ocorrido no período de 2011 a 2023.
Já na África Subsaariana, que também mostrou crescimento da taxa de mortalidade entre jovens, as causas são as doenças infecciosas preveníveis, lesões não intencionais, riscos na gravidez e falta de acesso a serviços de saúde, como vacinas.
Mudanças na modelagem do estudo atual mostraram, segundo os pesquisadores, que as mortes entre mulheres jovens entre 15 e 29 anos na África Subsaariana foi 61% maior do que a estimada anteriormente, para o período de 1950 a 2021.
O estudo salientou que fatores socioeconômicos, como pobreza, desigualdade educacional, insegurança alimentar e falta de oportunidades, além do aumento de transtornos mentais e abuso de substâncias, tornaram os jovens mais vulneráveis, em especial em regiões com pouca infraestrutura.
A pandemia de covid-19 e os problemas relacionados ao uso excessivo de redes sociais também estão entre os fatores citados pelos pesquisadores como agravantes dos transtornos mentais que atingem jovens do mundo todo.
Queda da mortalidade infantil
Ao longo de todo o período do estudo, o número de mortes infantis diminuiu mais do que em qualquer outra faixa etária. De 2011 a 2023, o Leste Asiático registrou a maior queda na taxa de mortalidade para a faixa etária de menores de 5 anos, devido a melhorias nas taxas de nutrição e vacinas e nos sistemas de saúde.
Entre crianças menores de 5 anos, os principais fatores de risco em 2023 foram desnutrição infantil e materna, poluição por material particulado e falta de água potável e saneamento básico. Para crianças e adolescentes de 5 a 14 anos, a deficiência de ferro foi o principal fator de risco, seguida por outros relacionados à falta de saneamento e desnutrição infantil e materna.
GBD: as 10 principais causas de morte
Quase metade da mortalidade e morbidade globais em 2023 foi atribuída a 88 fatores de risco modificáveis.
Os dez fatores de risco com a maior proporção de perda de saúde foram:
- pressão arterial sistólica elevada;
- poluição por material particulado;
- tabagismo;
- glicemia de jejum elevada;
- baixo peso ao nascer e gestação curta;
- IMC elevado;
- colesterol LDL elevado;
- disfunção renal;
- atraso no crescimento infantil;
- e exposição ao chumbo.
Principais conclusões do GBD
- A expectativa de vida global em 2023 foi mais de 20 anos maior em comparação a 1950, e a taxa de mortalidade caiu em todos os 204 países e territórios;
- Apesar disso, a taxa de mortalidade entre adolescentes e adultos jovens vem aumentando, e já se concretiza como uma crise emergente na América do Norte e parte da América Latina. Entre as principais causas desse crescimento estão suicídio e uso abusivo de álcool e outras substâncias;
- O aumento de mortalidade nessa faixa etária também foi observado na África Subsaariana, mas por outras causas, como doenças infecciosas preveníveis e lesões não intencionais;
- As doenças não transmissíveis foram responsáveis por quase 2/3 da morbidade e da mortalidade no mundo, lideradas pela doença cardíaca isquêmica, AVC e diabetes;
- Os transtornos mentais se firmaram como um sério problema de saúde pública, responsáveis por um aumento de 63% na mortalidade e 26% na incapacidade.