Página Inicial
Infectologia

As novas variantes do coronavírus | Coluna

Publicado em 05/02/2021
Revisado em 05/02/2021

Mutações no vírus que causa a covid-19 preocupam cientistas e governantes ao redor do mundo. Saiba quais são as principais variantes do coronavírus e onde surgiram. 

 

*Colunista convidado: Observatório Covid-19 BR

 

É comum que vírus sofram mudanças constantes em seu material genético por meio de mutações. O Sars-CoV-2 não é exceção, e, portanto, já era esperado que começassem a surgir pelo mundo novas variantes do coronavírus que causa a covid-19. A maior parte das mutações não gera nenhum impacto que faça diferença para quem é infectado ou na disseminação da doença pela população. Mas infelizmente algumas podem tornar o vírus mais contagioso ou até mais letal.

Veja também: Artigo do dr. Drauzio sobre sequelas da covid-19

Mutações e variantes inofensivas do coronavírus irão surgir o tempo todo durante o processo de replicação dos vírus no corpo de quem estiver infectado, e serão passadas adiante. Temos atualmente múltiplas variantes do coronavírus Sars-CoV-2 que não causam nenhuma preocupação. É a partir do momento em que as mudanças nos genes permitem alguma vantagem para o vírus, ou alguma desvantagem para o hospedeiro, que devemos levar essa variante a sério.

Isso é justamente o que parece estar acontecendo com algumas das variantes do Sars-CoV-2 ao redor do mundo, inclusive com a identificada este ano em Manaus. Ela possui um mesmo tipo de mutação da encontrada no Reino Unido, que facilita a entrada do vírus na célula e aumenta a transmissibilidade.

Com exceção da variante da Califórnia, as novas variantes associadas à maior transmissibilidade já tiveram comprovação de chegada ao Brasil e precisam ser urgentemente mapeadas. O mapeamento e controle organizado pelos governos e institutos científicos é uma estratégia chamada “vigilância genômica”. Ela tem esse nome, pois o genoma, ou seja, o conjunto de genes dos vírus é observado em busca de mutações de interesse que devem ser comunicadas às autoridades e à população.

 

As variantes que estão chamando mais atenção pelo mundo

 

Reino Unido (B.1.1.7) – Em setembro de 2020, o repentino crescimento nas taxas de casos de covid-19 em certas regiões do Reino Unido despertou na comunidade científica suspeitas de que o fenômeno poderia estar associado à circulação de uma nova variante. Essa nova variante – chamada de B.1.1.7 – foi identificada por meio de sequenciamento genético e possui diversas mutações em relação ao vírus que começou a circular pelo Reino Unido no início da pandemia. Neste momento, a B.1.1.7  é a predominante na Inglaterra e Irlanda do Norte, além de  ter se espalhado por mais de 50 países. Alguns estudos já confirmam que a taxa de letalidade dessa variante é maior. Já está presente no Brasil .

 

África do Sul (B.1.351) – A segunda variante sobre a qual temos mais informações no momento é a que se originou na África do Sul, chamada B.1.351. Assim como o Reino Unido, a África do Sul tem aumentado sua vigilância genômica e lá foram capazes de ter informações suficientes para que desenvolvedores de vacinas se preocupassem e testassem seus produtos contra essa variante. Com esses testes já em curso, as farmacêuticas já começam a dar seus primeiros passos para adequar suas vacinas à variante da África do Sul. Neste exemplo, assim como no exemplo da variante britânica, a vigilância genômica mostra seu valor e como ela pode antecipar a adequação dos programas de vacinação.  Também já foi identificada no Brasil.

 

Estados Unidos (CAL.20C) – No final de dezembro de 2020, cientistas da Califórnia passaram a buscar pela variante do Reino Unido em algumas amostras da população e acabaram por descobrir que uma variante própria estava se tornando cada vez mais comum. Estudos do Centro Médico Cedars-Sinai em Los Angeles indicaram que a CAL.20C provavelmente surgiu em julho de 2020, porém  começou a se espalhar de forma mais alarmante apenas a partir de novembro do mesmo ano. Atualmente, já está presente em mais da metade das amostras coletadas em Los Angeles e contém cinco mutações.

 

Brasil (P.1) – A variante brasileira surgiu em Manaus e foi nomeada recentemente de P.1. Não se sabe desde quando estava circulando, porém foi identificada nos primeiros dias de janeiro de 2021 por pesquisadores da Fiocruz de Manaus e por competências técnicas do Japão. As amostras de quatro viajantes que passaram pelo estado do Amazonas, três deles apresentando sinais de covid-19, foram coletadas ao chegarem no país. Autoridades japonesas avisaram o Brasil e a Fiocruz fez a comunicação em nota técnica no dia 12/01-2021. Quando o material genético das amostras foi sequenciado, encontraram a variante com 12 mutações, sendo uma delas a mesma das variantes da África do Sul e Reino Unido.  A P.1 já se espalhou para outros países e, além do Japão, foi detectada recentemente também nos Estados Unidos e na Alemanha.

 

O Reino Unido pôde encontrar com antecedência a nova variante que possui maior taxa de letalidade segundo estudos iniciais, porque possui um sistema eficiente de busca de novas variantes virais. Poucos países do mundo têm um sistema de vigilância genômica tão organizado quanto o sistema britânico, mesmo sendo algo fundamental no enfrentamento de uma pandemia como a que vivemos já há um ano.

No Brasil, ainda não foi possível avaliar com clareza como as variantes estão se espalhando pelos estados. O mapeamento das linhagens virais circulantes ainda tem um número muito baixo de sequenciamentos de genomas completos em relação ao número de pessoas infectadas por dia.

É preciso investimento na intensificação da vigilância genômica para que possamos enfrentar a pandemia com as informações mais completas e adequadas, até que toda a população brasileira tenha sido vacinada e adquirido proteção. O Brasil tem conhecimento científico e técnico para dar esse salto de qualidade e quantidade na vigilância genômica. Somando-se as forças institucionais ligadas ao Ministério da Saúde e as forças acadêmicas nas diversas universidades do país, poderemos evitar consequências piores na saúde e na qualidade de vida da população.

 

A nova variante do Brasil é mais “fatal”?

 

Pouco se sabe a respeito da P.1 (a variante brasileira), mas ela tem semelhanças com a variante da África do Sul, e compartilha uma importante mutação com as variantes do Reino Unido e da África do Sul, o que sugere que essas mutações trazem alguma vantagem para a disseminação do vírus.

Até agora não há indícios de que a variante que surgiu em Manaus cause um quadro pior da doença do que o vírus que predominou durante a primeira onda no Brasil. Mas o número de mortes provocadas pelo coronavírus não depende apenas de sua patogenicidade. Depende também das condições de acolhimento dos doentes em hospitais com recursos adequados.  Se uma variante provocar mais casos, ou seja, se ela for mesmo mais transmissível como suspeitamos, corremos maior risco de colapso do sistema de saúde, o que aumenta o número de óbitos, como aconteceu em Manaus.

Sendo que as outras variantes já foram detectadas no Brasil, inclusive a do Reino Unido (essa sim relacionada a um aumento de mortes), a atenção se volta a como avaliar a disseminação dessas e de futuras mudanças do coronavírus pelo país.

 

Glossário

 

1. Transmissibilidade O quão contagioso é o vírus, ou seja, quantas pessoas alguém infectado é capaz de contaminar
2. Letalidade Corresponde ao número de mortes. Quantos entre os infectados chegam a falecer
3. Patogenicidade A gravidade da doença que o vírus é capaz de causar. Por exemplo, se ocasiona mais casos graves e fatais, quando comparado aos números de outras variantes em circulação.
4. Vigilância genômica O rastreamento por sequenciamento genômico, ou por testes RT-PCR modificados, das variantes do vírus. A vigilância genômica permite a identificação e quantificação de novas variantes e mutações

 

*As informações e opiniões dadas nesta coluna são de responsabilidade do autor 

Compartilhe
Sair da versão mobile