Guerra perdida | Artigo

Neste artigo publicado na revista Carta Capital, dr. Drauzio Varella questiona a atual política repressiva de combate às drogas.

drogas e dinheiro apreendidos na guerra às drogas

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Publicado em: 20 de maio de 2013

Revisado em: 11 de agosto de 2020

Guerra às drogas é batalha perdida. Está na hora de encontrarmos formas mais inteligentes de lidar com essa questão.

 

Semana passada, tomei um susto, quando li na capa da “Carta Capital”: “Legalizem as drogas”. No subtítulo, vinha a justificativa: “Seria o fim do tráfico e da violência e corrupção”.

É a primeira vez que uma revista semanal brasileira coloca essa proposta em discussão.

Assinada pelo jornalista Willian Vieira, a matéria da “Carta Capital” alinha argumentos e dados numéricos que comprovam o fracasso retumbante das políticas repressivas adotadas em países como o Brasil.

Veja também: Combate às drogas

O exemplo dos Estados Unidos é didático. Nos últimos 40 anos, eles investiram mais de 1 trilhão de dólares nessa guerra insólita. Nesse período, a população carcerária saltou de 38 mil para 500 mil, a um custo anual de 30 mil dólares por preso.

Além de enriquecer os grandes bancos envolvidos na lavagem dos narcodólares, o que a sociedade americana ganhou com esse esforço? Formar o maior mercado consumidor do mundo.

A matemática é clara: 1 quilo de cocaína de boa qualidade pode ser comprado por cerca de 2 mil dólares na Bolívia ou Colômbia. Quando desembarca em Nova York, já vale 30 mil; em Roma, 55 mil; na Austrália e no Japão, mais de 80 mil. Em São Paulo ou Rio de Janeiro, depois de “batizada” para aumentar o rendimento, essa quantidade poderá render 20 a 30 mil dólares.

A lei da oferta e da procura garante sobrevivência perene ao tráfico. A mais ferrenha repressão policial poderá, no máximo, aumentar transitoriamente o preço das drogas nas ruas e, com isso, talvez diminuir o consumo, jamais acabar com ele.

Para a viabilidade comercial de qualquer mercadoria, o gasto com transporte é crucial. Plantar tomates no norte de Mato Grosso para vendê-los nas feiras-livres de São Paulo, levaria o produtor à falência. Quando o produto é uma droga ilícita, no entanto, o custo do transporte se torna desprezível.

Suponhamos que um comprador holandês pagasse 400 mil dólares por 200 quilos de cocaína colombiana, e um traficante pedisse a absurda quantia de 1 milhão de dólares para desembarcá-los em Amsterdã. Que diferença fará? Apesar do transporte acrescer 5 mil dólares por quilo, a margem de lucro continuará estratosférica.

Lucros dessa magnitude, numa atividade não sujeita à taxação pela Receita Federal, obrigações trabalhistas e demais impostos que sufocam a produção em nosso país, têm um poder de corrupção irresistível. Não sejamos ingênuos: bocas de fumo são pontos de comércio estabelecidos em endereços acessíveis aos usuários. Se eles, e até os cidadãos abstêmios, sabem onde encontrá-las, só a polícia treinada para combatê-las é que não sabe?

A lei da oferta e da procura garante sobrevivência perene ao tráfico. A mais ferrenha repressão policial poderá, no máximo, aumentar transitoriamente o preço das drogas nas ruas e, com isso, talvez diminuir o consumo, jamais acabar com ele.

Está mais do que na hora de encontrarmos formas mais inteligentes de lidar com esse flagelo das sociedades modernas. Por que não começarmos mudando a legislação que criminaliza o consumo de maconha? Ou a solução será mandar para a cadeia todos os usuários, ainda que sejam da nossa família?

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