Os suplícios da carne | Artigo

Volta e meia, surgem inquéritos populacionais que a acusam de provocar ataques cardíacos, derrames cerebrais, câncer e outros achaques menos populares.

Pedaço de carne vermelha. veja quais os males da carne vermelha

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Publicado em: 3 de novembro de 2015

Revisado em: 11 de agosto de 2020

A carne vermelha é apontada como responsável por uma série de males ao organismo, mas a verdade é que não há consenso entre os especialistas.

 

A carne vermelha é o suspeito habitual. Volta e meia, surgem inquéritos populacionais que a acusam de provocar ataques cardíacos, derrames cerebrais, câncer e outros achaques menos populares.

Com o tempo, a análise crítica desses estudos contesta essas acusações e o assunto sobrevive apenas no lixo que se amontoa na internet. Ao constatar que os cientistas se contradizem, a população não sabe o que pensar.

Um relatório da Organização Mundial da Saúde (OMS), divulgado na última semana de outubro/2015, joga mais lenha nessa fogueira.

Depois de avaliar mais de 800 trabalhos publicados, um painel de 22 especialistas da Agência Internacional de Pesquisas sobre o Câncer (IARC) ouvidos pela OMS concluiu que o consumo de carnes processadas – salsicha, linguiça, bacon, salame, presunto, mortadela – está associado a um pequeno aumento no risco de câncer de cólon e reto. E, em menor grau ainda, ao risco de câncer de próstata e de pâncreas.

Como consequência, a carne processada foi colocada no Grupo 1, categoria que reúne fatores em relação aos quais há “evidências suficientes” de que podem causar câncer. Pertencem a esse grupo tabaco, asbesto, álcool, radiações solares e poluição.

 

Veja também: Por que a carne processada aumenta o risco de câncer?

 

Quanto à carne vermelha – caracterizada como a musculatura de bois, carneiros, porcos, cabritos e outros –, o painel foi bem mais cauteloso: trata-se de um alimento “provavelmente” carcinogênico, conclusão baseada em “evidências limitadas”.

A Agência afirmou categoricamente que as carnes processadas, o cigarro, o álcool e os demais componentes do grupo 1 não são farinha do mesmo saco: “Isso NÃO quer dizer que esses fatores de risco sejam igualmente perigosos”.

Lógico que não são. O cigarro aumenta 20 vezes o risco de câncer de pulmão e causa um milhão de mortes anuais por câncer, no mundo. Ao consumo excessivo de álcool são atribuídas 600 mil mortes por ano; aos efeitos da poluição, 200 mil.

E ao consumo de carne processada?

Segundo o relatório, o risco aumenta 18% para cada 50 gramas ingeridas diariamente. Segundo as estimativas mais recentes do Global Burden of Disease Project, dietas ricas em carnes processadas seriam responsáveis por 34 mil mortes anuais por câncer, entre os sete bilhões de habitantes do planeta.

Parece haver evidências sólidas de que dietas ricas em carnes processadas estejam associadas a um pequeno aumento da probabilidade de desenvolver câncer de cólon e reto, mas calcular o risco de cada um de nós é impossível.

Veja o caso dos Estados Unidos, país com uma das maiores incidências de câncer de cólon e reto e taxas mais elevadas de consumo per capita de carnes processadas.

A probabilidade de um americano desenvolver esse tipo de câncer no decorrer da vida é estimada em 5%. Se ingerir 50 gramas de carne processada todos os dias, o aumento de 18% faria o risco crescer para 5,9%. Se comer 100 gramas diárias, acrescentará mais 18% aos 5,9%, ou seja, passará a correr risco de 6,9%.

Submeter carne a altas temperaturas, ao contato direto com as chamas, com o calor das chapas e do óleo fervente ou à defumação, facilita a formação de certas aminas e hidrocarbonetos aromáticos reconhecidamente carcinogênicos, há muitos anos. A classificação da IARC se refere apenas à qualidade dos dados acumulados, não à magnitude do risco.

Em outras palavras, parece haver evidências sólidas de que dietas ricas em carnes processadas estejam associadas a um pequeno aumento da probabilidade de desenvolver câncer de cólon e reto, mas calcular o risco de cada um de nós é impossível.

Digo parece, porque não existe consenso entre os epidemiologistas. Não houve unanimidade sequer entre os 22 especialistas do painel da IARC: sete deles se abstiveram de votar a favor das conclusões, por não estarem convencidos da qualidade das evidências apresentadas ou não concordarem com elas.

É possível que o consumo exagerado de carne seja um dos múltiplos fatores para explicar a prevalência de câncer de intestino nos Estados Unidos, Comunidade Europeia e Austrália, mas o efeito é pequeno. Na Inglaterra, por exemplo, não há evidências concretas de que os vegetarianos tenham risco mais baixo desse tipo de câncer.

E você, leitor? Se quiser reduzir o risco de câncer e de outras doenças, não fume de jeito nenhum, beba pouco, faça exercícios, não engorde, coma quatro ou cinco porções de frutas e vegetais todos dias e não fuja dos prazeres da carne, sem exageros.

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