O efeito balão | Artigo

A proibição das drogas gera o efeito balão: quando você aperta de um lado, ele incha do outro. E assim se gastam bilhões para obter resultados pífios.

pacotes de drogas apreendidas. guerra às drogas gera efeito balão, sem efeito na diminuição do consumo

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Publicado em: 3 de junho de 2014

Revisado em: 11 de agosto de 2020

A proibição das drogas gera o efeito balão, possui altos custos sociais, impacta na violência urbana e, apesar dos bilhões investidos, tem resultados pífios.

 

Quando você aperta um lado do balão de gás, ele incha do outro. Assim acontece com o tráfico de drogas, tema de três matérias da revista “The Economist”, que tomo a liberdade de resumir e comentar.

Com a ajuda bilionária dos Estados Unidos, o cerco ao plantio de coca na Colômbia, conduzido nos anos 1990 e 2000, reduziu a produção no país. Graças ao efeito balão, no entanto, as plantações se deslocaram para Bolívia e Peru, o maior produtor atual.

Veja também: Artigo do dr. Drauzio sobre combate às drogas

Pelo mesmo efeito, os laboratórios de refino foram transferidos para Equador e Venezuela, mudança que permitiu às quadrilhas mexicanas conquistar parte substancial do mercado americano e europeu.

Por sua vez, a repressão sangrenta contra as gangues mexicanas dos últimos anos desviou a rota para a América Central. Honduras se tornou a porta de entrada para os aviões pequenos, de onde os carregamentos seguem por via terrestre na direção do México e Estados Unidos. A Honduras de hoje convive com o índice de homicídios mais alto do mundo.

No ano passado, a pressão sobre os hondurenhos cortou 30% das aterrissagens clandestinas. Os traficantes encontraram mais facilidade de transporte por barcos que partem da Venezuela para aportar na República Dominicana, Trinidad e Jamaica.

Atacar as quadrilhas num país não causa apenas derramamento de sangue no local, as mortes são exportadas para outras regiões. A repressão na Colômbia é responsável por metade dos assassinatos no México.

O impacto das apreensões é contraditório: a oferta diminui e o preço aumenta, oportunidade que atrai bandidos mais violentos.

É ilusão imaginar que a prisão dos barões da droga desarticularia o mercado. Eles são homens experientes, dispostos a resolver conflitos na mesa de negociações, enquanto os mais jovens, que disputarão seus lugares, tentarão fazê-lo dizimando os concorrentes.

Quando uma quadrilha domina as demais, seu poder de corromper e de intimidar a população é tão grande que fica difícil desalojá-la. Mesmo se for eliminada, os armamentos deixados para trás e a rede de corrupção organizada persistirão por muito tempo.

Na impossibilidade de dar fim às drogas, a única justificativa para insistir na guerra contra traficantes e usuários, é a de reduzir a oferta para aumentar o preço no varejo, com a intenção de reduzir o consumo.

As campanhas educativas e a baixa qualidade das drogas oferecidas têm feito declinar o número de usuários de cocaína e heroína, na Europa e nos Estados Unidos. Fenômeno semelhante talvez esteja acontecendo no Brasil. Não há razões para otimismo, no entanto: as drogas sintéticas invadiram o mercado.

Segundo o último relatório do Office on Drugs and Crime, da ONU, surgiram 348 novas drogas psicoativas sintéticas, quase todas no período de 2008 a 2013.

Entre elas, 110 canabinoides, com efeitos mais nocivos e mal conhecidos que mimetizam os da maconha, além de estimulantes como a metanfetamina (que tem ocupado o lugar da heroína na Europa), a mefedrona (droga barata vendida pela internet, que o usuário chega a injetar nos músculos mais de 20 doses por dia) e a quetamina, popular entre os jovens argentinos, causadora de mais dependência e efeitos colaterais do que o ecstazy.

A síntese desses compostos químicos em pequenos laboratórios junto aos centros consumidores, elimina a necessidade de percorrer distâncias continentais para chegar ao usuário, pulveriza a produção, dificulta o trabalho policial e traz as disputas territoriais para a vizinhança.

Enquanto a medicina adquiriu larga experiência com a maconha, cocaína e heroína, drogas do passado, não fazemos ideia das consequências para o organismo do uso prolongado desse arsenal sintético.

Na impossibilidade de dar fim às drogas, a única justificativa para insistir na guerra contra traficantes e usuários, é a de reduzir a oferta para aumentar o preço no varejo, com a intenção de reduzir o consumo.

É uma pretensão simplista com resultados pífios: apesar dos custos sociais, da violência urbana, das cadeias abarrotadas e dos bilhões de dólares investidos, o consumo cresce no mundo inteiro.

O que falta para nos convencermos de que esse modelo de enfrentamento é ridículo, caro e ineficiente?

Legalizar não significa liberar o consumo indiscriminadamente. É desenvolver estratégias para discipliná-lo, ajudar os usuários que desejam se livrar da dependência e tirar o poder das mãos dos criminosos.

 

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