Não é possível afirmar que o herbicida glifosato cause autismo | Checagem

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Declaração de que glifosato causaria autismo em 50% das crianças até 2025 não foi demonstrada cientificamente.

 

Muito utilizado na agricultura, o glifosato ganhou projeção mundial não só por seu uso na agricultura, mas também por controvérsias em torno de seus efeitos na saúde e no meio ambiente. Uma das que ganhou maior repercussão foi a de que ele estaria fortemente relacionado ao autismo, de tal maneira que, até 2025, 50% das crianças apresentariam o distúrbio por conta da substância.

 

QUEM DISSE? Originalmente a declaração feita em um congresso foi publicada na revista “Alliance for Natural Health USA” e, depois, em diversos jornais e sites em todo o mundo, como por exemplo o “Jornal O Nortão”, no Brasil.

O QUE DISSE?  “Glifosato causará autismo em 50% das crianças até 2025, afirma cientista do MIT.”

QUANDO DISSE? 05/06/2014 (declaração original)

CHECAGEM: INSUSTENTÁVEL

 

De acordo com as informações de literatura científica, não há evidências de que o glifosato cause autismo. Ainda, a pequena porção que pode ser absorvida no organismo é rapidamente eliminada, não deixando resíduos.

 

CONTEXTO

 

Herbicidas à base de glifosato estão no mercado desde a década de 1970 e seu uso tem sido cada vez mais frequente, principalmente por causa do desenvolvimento de culturas resistentes a ele, o que permite que as ervas daninhas sejam eliminadas sem prejudicar as plantações.

 

Há muitos estudos envolvendo o glifosato e, portanto, muitas opiniões controversas.

 

Em 2014, a dra. Stephanie Seneff, uma pesquisadora da área de Ciência da Computação e Inteligência Artificial do Massachusetts Institute of Technology (MIT), nos Estados Unidos, divulgou em uma conferência que “o glifosato causará autismo em 50% das crianças até 2025”.

 

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Será que o glifosato pode realmente causar autismo? A DROPS checou.

 

O QUE DIZ A CIÊNCIA

 

A afirmação da pesquisadora foi resultado de correlações feitas por ela, que utilizou apenas a taxa de pessoas diagnosticadas com autismo e a taxa de uso de glifosato, sem apresentar nenhuma evidência científica de que existe uma relação de causa e efeito entre os dois eventos.

 

É necessário salientar que o modo com que se realiza o diagnóstico de autismo no mundo mudou, permitindo detectar mais casos de autismo com maior eficiência do que se tinha antes, graças à mudança dos critérios de diagnóstico e do conhecimento sobre o distúrbio, o que não significa, necessariamente, que houve um aumento no número de crianças com autismo.

 

Como consta em um extenso relatório da Organização Mundial da Saúde (OMS), o glifosato foi estudado em animais que têm o metabolismo muito parecido ao de seres humanos e foi detectado que ele é pouco absorvido pela via oral, ou seja, pela comida e bebida que ingerimos.

 

Além de ser pouco absorvido, ele é rapidamente excretado, permanecendo por poucas horas no organismo. Também foi observado que o glifosato não se acumula no organismo. Em animais, o glifosato não causou nenhum efeito tóxico no sistema neurológico ou doença crônica.

 

Para chegar à conclusão de que o glifosato causa autismo, a dra. Seneff correlacionou o famoso praguicida à diminuição de manganês no organismo. Com base em um estudo no qual monitorou as concentrações de manganês em vacas que se alimentaram com ração contendo ingredientes tratados com glifosato, ela elencou todos os possíveis distúrbios que a diminuição desse mineral poderia causar no organismo, incluindo o autismo.

 

Em palestra que ficou famosa mundialmente, em junho de 2014, a dra Seneff apresentou gráficos que aparentemente demonstravam que o aumento do uso do glifosato estava diretamente ligado ao aumento de autismo, assim como de outros distúrbios. Nessa ocasião a pesquisadora utilizou-se de raciocínio dedutivo para defender suas afirmações. Isso quer dizer que seus estudos não se basearam em evidências, mas em correlações que não necessariamente demonstram causa e efeito e claramente deixam de lado a biologia.

 

Em outras palavras, para a dra. Seneff temos a seguinte relação:

  1. o glifosato prejudica a absorção de manganês;
  2. a deficiência de manganês está relacionada ao autismo;
  3. logo, o glifosato causa autismo.

 

No entanto, o raciocínio dedutivo da equação não substitui as evidências clínicas e científicas necessárias para a comprovação de que o glifosato causa autismo. A correlação entre “o aumento do uso de glifosato e o aumento das taxas de autismo” não prova nada e indica apenas um erro conhecido como “falácia de correlação-causalidade”, pois correlações não estabelecem causalidade.

 

Em nossas pesquisas na literatura científica não encontramos estudos consistentes que forneçam evidências que comprovem que o glifosato causa autismo. Ou seja, a afirmação o “Glifosato causará autismo em 50% das crianças até 2025, afirma cientista do MIT” é cientificamente INSUSTENTÁVEL.

 

Vale ainda mencionar que o diagnóstico de autismo no mundo evoluiu. Atualmente é possível detectar mais casos da doença e com maior eficiência do que antes, graças à mudança dos critérios de diagnóstico e do conhecimento sobre o distúrbio, não significando, necessariamente, que houve um aumento no número real de crianças com doenças do espectro autista.

 

REFERÊNCIAS

 

https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC4392553/

https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC5705608/

https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC4538578/

https://www.youtube.com/watch?v=i6j0wIhUr1M

http://people.csail.mit.edu/seneff/glyphosate/Groton_Seneff.pdf

http://people.csail.mit.edu/seneff/

http://apps.who.int/pesticide-residues-jmpr-database/pesticide?name=GLYPHOSATE

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