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Câncer

Por que o câncer de próstata é mais comum em negros?

Cerca de 60% dos casos de câncer de próstata ocorrem em homens negros, e a maior parte dos diagnósticos é tardia, o que dificulta o tratamento e diminui as chances de cura.
Publicado em 30/11/2022
Revisado em 18/12/2022

Cerca de 60% dos casos de câncer de próstata ocorrem em homens negros, e a maior parte dos diagnósticos é tardia, o que dificulta o tratamento e diminui as chances de cura.

 

As ciências biológicas mostram que, por fatores biomoleculares, o câncer de próstata é mais prevalente em pessoas negras e também tende a ser mais agressivo. Ao mesmo tempo, as ciências humanas demonstram que as desigualdades econômicas e raciais contribuem para que a população negra sofra com a negligência do acesso à saúde, educação e lazer. O resultado desses fatores é que 60% dos casos de câncer de próstata ocorrem em homens negros, e a maior parte dos diagnósticos é tardia – o que dificulta o tratamento e chances de cura.

“Pacientes negros demoram a chegar aos centros de saúde. Quando chegam, a doença já está na forma grave, apresentando metástase”, alerta o urologista dr. Osei Akuamoa Jr. Para ele, a estratégia de rastreamento populacional é a mais recomendada para identificar os casos. As pessoas de raça negra/preta, com obesidade e com histórico familiar de câncer devem realizar os exames de prevenção principalmente a partir dos 45 anos.

O Instituto Nacional de Câncer (Inca) estima que o câncer de próstata representa 29% dos diagnósticos oncológicos entre homens no Brasil. Outro dado preocupante é que, entre 2020 a 2022, houve 65 mil casos novos da doença. “A expectativa de vida do homem brasileiro é de 72 anos. Entre os 20 aos 40 anos, a principal causa de morte dos homens negros é relacionada a fatores externos. Após essa fase, podemos enfrentar as doenças cardiovasculares, gastrointestinais, o câncer e mais uma vez ficamos vulneráveis”, explica o dr. Akuamoa.

        Ouça: DrauzioCast #167 | Câncer de próstata

É sabido que a genética tem grande influência em relação ao surgimento do câncer de próstata: as pessoas com parentes próximos que já foram diagnosticados com a doença precisam ter mais cuidados. Além disso, os afrodescendentes têm duas vezes mais chances de diagnóstico do que os homens de ascendência europeia, de acordo com um estudo feito nos Estados Unidos em 2020 e publicado na revista médica Jama Network. Homens negros têm mais sensibilidade androgênica, ou seja, o organismo mais sensível à ação da testosterona favorece o surgimento desse câncer.

O diagnóstico é feito a partir dos exames laboratoriais, como a biópsia da próstata, e o conhecido exame do toque – que ainda enfrenta bastante receio e preconceito entre o público-alvo. “Evitar um exame, que dura de 4 a 8 segundos, para ‘carregar’ uma masculinidade custa muito. Custa para o diagnóstico precoce, custa para o tratamento, custa para a família, ou seja, não vale a pena. A gente precisa proteger nossos corpos”, orienta o urologista.

        Veja também: O que há por trás da desigualdade racial em saúde no Brasil?

 

Racismo, saúde do homem e políticas públicas

O envelhecimento da população brasileira exige adaptações das demandas dos serviços de saúde: a quantidade de pessoas com mais de 60 anos aumentou cerca de 40% entre 2012 e 2021, de acordo com o Instituto Nacional de Geografia e Estatística. A mesma pesquisa mostrou que o número de pessoas que se autodeclaram como pretas aumentou.

Por isso, os especialistas defendem que a Política Nacional de Saúde Integral da População Negra seja fortalecida para atenuar o diagnóstico tardio do câncer entre essas pessoas. O dr. Fleury Johnson, médico clínico geral e pesquisador sobre saúde da população negra, informa que o primeiro passo é o levantamento de dados para conhecer a realidade da população: é necessário realizar pesquisas e formulários com o critério racial para entender em quais pontos as desigualdades brasileiras afetam o acesso à saúde.

“Muitas pessoas acreditam que, por termos o SUS, não seria mais necessário ter uma política direcionada à população negra. Entretanto, um dos princípios do Sistema Único de Saúde é a equidade, ou seja, oferecer mais a quem tem menos”, afirma o dr. Johnson. Em relação ao câncer de próstata, o médico reitera que vários fatores podem levar ao diagnóstico: alimentação precária, falta de exercícios físicos e estresse contribuem para o adoecimento.

O médico observa que, entre os pacientes da raça negra, apenas 1 quarto são homens. Outro fator que o preocupa é o motivo das consultas: eles são levados por influência das esposas e filhas, e não pela preocupação de autocuidado. Isso acontece porque “existe o estereótipo do homem negro viril, aquela pessoa forte que não precisa ir ao médico e acaba deixando seu cuidado de lado”, relata.

Johnson alerta para que os homens negros se preocupem mais com a própria saúde: “Cuidar da nossa família não é somente trazer a comida para a mesa. Para isso, é preciso estar vivo ao lado das pessoas que amamos”. 

        Veja também: Saúde do homem: Autocuidado vai além do exame de próstata

 

 

Sobre o autor: Jhonatan Dias é jornalista independente e colabora com o Portal Drauzio Varella. Escreve principalmente sobre pesquisas em saúde, tecnologias e bem-estar.

Conteúdo desenvolvido em parceria com a Afrosaúde

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