Homossexualidade, DNA e a ignorância | Artigo

Nos últimos 20 anos, acumulamos evidências científicas suficientes para afirmar que a homossexualidade não é escolha pessoal. Veja artigo do dr. Drauzio.

bandeira lgbti. Homossexualidade não é escolha

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Publicado em: 19 de novembro de 2015

Revisado em: 13 de agosto de 2021

Nas duas últimas décadas, acumulamos evidências científicas suficientes para afirmar que a homossexualidade não é escolha nem estilo de vida.

 

“Quem quiser gostar de mim, eu sou assim,” diz o samba de Wilson Baptista.

A homossexualidade tem forte componente genético. Diversos estudos com gêmeos univitelinos demostraram que, quando um deles é homossexual, a probabilidade de o outro também o ser varia de 20% a 50%, ainda que separados quando bebês e criados por famílias estranhas.

 

Veja também: Vídeo sobre homossexualidade

 

Nas duas últimas décadas, acumulamos evidências científicas suficientes para afirmar que a homossexualidade está longe de ser mera questão de escolha pessoal ou estilo de vida. É condição enraizada na biologia humana.

Nunca houve nem existirá sociedade em que a homossexualidade esteja ausente. O estudo mais completo até hoje, realizado por Bailey e colaboradores da Austrália, mostrou que 8% das mulheres e dos homens são homossexuais.

Em 1993, o geneticista Dean Harner propôs um caminho para a identificação dos “genes gay”, sequências de DNA que estariam localizadas no cromossomo X (região Xq28). A descrição virou manchete de jornal, mas não pôde ser confirmada por outros pesquisadores, requisito fundamental para adquirir validade científica.

O fato de que 20% a 50% dos gêmeos univitelinos apresentam concordância da homossexualidade ressalta a influência genética, mas deixa evidente que a simples identidade de genes não justifica todos os casos.

 

Veja também: Artigo sobre violência contra homossexuais

 

Em 2012, William Rice propôs que a epigenética explicaria com mais clareza a orientação sexual. Damos o nome de epigenéticas às alterações químicas do DNA que modificam a atividade dos genes sem, no entanto, alterar-lhes a estrutura química.

Durante o desenvolvimento, os cromossomos podem sofrer reações químicas, que não afetam propriamente os genes, mas podem “ativá-los” ou “desligá-los”. O exemplo mais conhecido é a metilação, processo em que um radical metila (CH3) se fixa a uma região específica do DNA, formando o que chamamos de epimarca.

Como algumas epimarcas são silenciadas nos óvulos e espermatozoides, enquanto outras podem ser transmitidas aos descendentes, Rice propôs que epimarcas ancoradas junto aos genes responsáveis pela sensibilidade à testosterona podem conduzir à homossexualidade, quando transmitidas do pai para a filha ou da mãe para o filho.

Especificamente, ainda no ventre materno, epimarcas que afetam a resposta às ações da testosterona produzida pelos testículos ou ovários fetais, são capazes de masculinizar o cérebro de meninas ou afeminar o dos meninos, conduzindo, mais tarde, à atração homossexual.

A homossexualidade é um fenômeno de natureza tão biológica quanto a heterossexualidade. Esperar que uma pessoa homossexual não sinta atração por outra do mesmo sexo, é pretensão tão descabida quanto convencer heterossexuais a não desejar o sexo oposto.

O grupo de Eric Vilain, um dos mais conceituados nessa área, estudou 37 pares de gêmeos idênticos discordantes (apenas um homossexual) e 10 pares concordantes.

A avaliação de 140 mil regiões do DNA desses gêmeos permitiu identificar cinco delas em que os padrões de metilação guardavam relação direta com a orientação sexual em 70% dos casos.

Por que razão alguns gêmeos idênticos terminam com padrões distintos de metilação?

Segundo Rice, epimarcas podem ser apagadas num irmão e persistir no outro. Vilain concorda: diferenças sutis no ambiente intrauterino, ditadas pela circulação do sangue e a posição espacial de cada feto, seriam as causas mais prováveis.

A antiga visão do sexo como um binário, condicionado pelos cromossomos XX ou XY, está definitivamente ultrapassada. Ela é incapaz de explicar a diversidade de orientações sexuais existente nos seres humanos, nos demais mamíferos e até nas aves.

Transmitidas de pais para filhos, epimarcas específicas nas regiões do DNA ligadas às reações dos tecidos fetais à testosterona oferecem bases mais sólidas, inclusive para entender os casos de bebês com órgãos sexuais ambíguos e das pessoas que julgam haver nascido em corpos que não condizem com sua individualidade sexual.

A homossexualidade é um fenômeno de natureza tão biológica quanto a heterossexualidade. Esperar que uma pessoa homossexual não sinta atração por outra do mesmo sexo, é pretensão tão descabida quanto convencer heterossexuais a não desejar o sexo oposto.

Os que assumem o papel de guardiões da família e da palavra de Deus para negar às mulheres e homens homossexuais os direitos mais elementares, não são apenas sádicos, preconceituosos e ditatoriais, são ignorantes.

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