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Sexualidade

Circuncisão e aids | Artigo

Publicado em 07/04/2011
Revisado em 11/08/2020

Há evidências de que a circuncisão atua no sentido de proteger contra a transmissão do vírus da aids, tornando-se uma possível indicação em áreas de alta incidência da doença.

 

Quanto mais íntimo o contato do HIV com as mucosas genitais, maior a probabilidade de infecção. Se o vírus da aids fosse altamente transmissível, a epidemia teria se espalhado pelos cinco continentes da forma devastadora com que se dissemina nos países africanos situados abaixo do deserto do Saara. Bactérias como o gonococo, vírus como o HPV (papilomavírus) ou fungos como a Cândida albicans penetram as mucosas genitais com muito mais facilidade do que o HIV.

Tal característica explica por que mulheres casadas com homens infectados ou maridos de esposas portadoras do vírus podem permanecer HIV-negativos depois de anos de relacionamento sexual.

O HIV presente nas secreções sexuais precisa de contato íntimo e prolongado com as mucosas para invadi-las e estabelecer infecção crônica. Por esse motivo, transmite-se do homem para a mulher com mais facilidade do que no sentido inverso: a superfície representada pelas paredes vaginais e pelo colo uterino é mais extensa do que a da mucosa de revestimento da glande peniana.

No início dos anos 1980, quando eclodiu a epidemia africana de aids, foi aventada a hipótese de que a circuncisão, ao reduzir a área de contato da glande com as secreções sexuais femininas, protegeria os homens da infecção.

 

Veja também: Para erradicar a aids

 

Embora os dados fossem ocasionalmente contraditórios, na maioria das vezes em que se procurou avaliar a prevalência da infecção pelo HIV nos últimos 20 anos, em populações de homens circuncidados pertencentes a grupos socioeconômicos semelhantes e sujeitos a fatores de risco comparáveis aos de outros não submetidos à circuncisão, os resultados mostraram que entre estes a prevalência era mais elevada.

Esses trabalhos, no entanto, foram recebidos com reserva pela comunidade científica por causa de um viés metodológico: foram realizados com participantes previamente circuncidados, por razões religiosas. Como é possível assegurar que a circuncisão seria a única responsável pelos resultados? Será que aspectos religiosos não estariam associados a diferenças de comportamento sexual capazes de interferir?

Para esclarecer essas dúvidas foram conduzidos quatro estudos: um no Quênia, um na África do Sul e dois em Uganda. Ao contrário dos anteriores, todos foram prospectivos, isto é, não partiram da comparação de homens circuncidados anteriormente: ao entrar no estudo, a cirurgia foi realizada em metade dos participantes, sorteados ao acaso, para que pudessem ser comparados com o grupo controle.

Os estudos foram abrangentes. Por exemplo, o inquérito conduzido na África do Sul, a partir de agosto de 2003, pela agência francesa ANRS, envolveu mais de 3000 homens de 18 a 24 anos.

O grupo que recebeu circuncisão foi beneficiado de forma tão clara que o estudo precisou ser interrompido por razões éticas. Depois de 21 meses, apenas 18 homens circuncidados tinham adquirido o HIV, contra 51 do grupo-controle. Houve redução de 65% na probabilidade de contrair o vírus, dado especialmente significante quando se leva em conta que a atividade sexual do grupo submetido à operação foi 18% maior.

Um dos estudos de Uganda conduzidos por pesquisadores americanos obteve resultados semelhantes. É provável que os demais cheguem às mesmas conclusões.

Dois pontos merecem consideração antes de adotarmos a circuncisão como procedimento universal em zonas de alta prevalência da infecção pelo HIV.

Primeira: A operação, embora simples, deve ser feita por médicos treinados. A circuncisão por motivos religiosos, geralmente realizada por pessoas que desrespeitam regras básicas de assepsia, está associada a complicações bem conhecidas da medicina.

Segunda: Será que por terem sido operados os homens não se julgarão imunes às doenças sexualmente transmissíveis e abandonarão definitivamente o uso de técnicas de sexo seguro, correndo mais risco pessoal e expondo suas mulheres?

De qualquer forma, os resultados desses estudos são tão contundentes que a circuncisão em regiões de alta prevalência da infecção pelo HIV talvez se torne a primeira indicação de cirurgia em massa na história da medicina.

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