Na vida moderna, o bem-estar está baseado em cinco pilares: trabalho, relacionamentos pessoais, saúde física, saúde financeira e lazer. Este último envolve tudo aquilo que traz a sensação de que você “trabalha para viver”, e não o contrário.
“Lazer pode ser muita coisa: uma viagem planejada, um feriado, ou até mesmo atividades que parecem trabalho, mas não são, como um hobby. Existe certa responsabilidade, mas sem compromisso rígido com a atenção e sem a pressão de ganhar dinheiro com isso”, explica o neurocientista e neurocirurgião Fernando Gomes.
E a grande diferença de não ter a necessidade de subsistência envolvida é que o circuito do prazer pode se manifestar livremente. Isso alivia o sistema límbico (a parte emocional do cérebro), reduz a liberação de cortisol, ativa o circuito de recompensa, fortalece a consolidação de memórias e estimula emoções positivas sem exigir esforço mental excessivo.
Benefícios do lazer
“O cérebro não ‘desliga’, mas pode entrar em modos de funcionamento que favorecem a recuperação cognitiva, emocional e física. Veja uma criança pequena: quando ela está irritada ou nervosa, basta dormir um pouco que acorda renovada. O sono tem esse poder de equilíbrio emocional. O adulto não pode simplesmente dormir sempre que precisa, então o lazer funciona como válvula de escape”, ilustra o especialista.
O lazer favorece a criatividade, já que o cérebro relaxado permite associações livres que não surgiriam sob pressão, além do equilíbrio emocional a longo prazo. Protege também contra o burnout e pode até atuar como fator protetor contra doenças neurodegenerativas.
“[As atividades de lazer] Não impedem totalmente o surgimento [de doenças neurodegenerativas], mas atenuam sua manifestação. Por exemplo: aprender jardinagem envolve contato com a natureza, aprendizado e estímulo cognitivo. Isso gera neuroplasticidade, que funciona como amortecedor contra condições como o Alzheimer”, afirma o médico.
Tipos de lazer
Existem três formas principais de promover descanso cerebral eficaz:
- Atividades prazerosas com leve envolvimento cognitivo: como ler, caminhar, fazer jardinagem ou ouvir música;
- Atividades que levam a um estado de fluxo, ou seja, uma imersão: como tocar um instrumento, cozinhar, pintar ou praticar esportes;
- Ócio criativo e momentos de “nada” com propósito: como ficar deitado na rede, contemplar uma paisagem bonita e assistir ao nascer ou ao pôr do sol.
É importante ressaltar que atividades de lazer que envolvam o contato com a natureza são ainda mais benéficas, auxiliando também no controle de ansiedade e depressão.
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O problema da pressão por performance
Por outro lado, muitas pessoas tendem a transformar os próprios hobbies em trabalho, estipulando metas que levam à frustração quando não conquistadas.
“O médico recomenda exercício, a pessoa se matricula na academia… Mas logo isso pode deixar de ser apenas saúde. Muitas vezes envolve estética, competição, performance. Aí surge a dúvida: é saúde física? É hobby? Se a pessoa é atleta profissional, com patrocínio e metas, já não dá para chamar de hobby. Pode transformar o que seria válvula de escape em mais um fator estressor, prejudicando trabalho, família e relacionamentos”, alerta o neurocientista.
Por que ficar horas mexendo no celular não é lazer?
Também há quem considere lazer passar tempo nas redes sociais. Isso, no entanto, não promove o descanso do cérebro, apenas muda o foco da sobrecarga, sem dar a ele o alívio necessário.
“Um hobby pode exigir foco, mas de forma prazerosa e relaxada. Já o celular, especialmente as redes sociais, promove uma barganha barata com nossa atenção. Os vídeos curtos, por exemplo, são estímulos rápidos que treinam o cérebro a ficar superficial, sempre pulando de um tema para outro. Parece prazeroso, pois libera dopamina, mas pode gerar exaustão e efeito rebote, pois aumenta a ansiedade e prejudica o sono”, alerta o dr. Fernando.
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