Abortamentos inseguros são é uma importante causa de mortalidade materna no país. Conselhos defendem autonomia da mulher em caso de aborto.
O médico Renato Azevedo, presidente do Conselho Regional de Medicina do Estado de São Paulo, acredita que a iniciativa do CFM (Conselho Federal de Medicina) de defender a liberação do aborto até o 3º mês de gestação terá um grande impacto na saúde pública do país, pois ajudará a diminuir o número de procedimentos clandestinos que são realizados em locais que não dispõem de estrutura adequada. “São feitos no Brasil cerca de 1 milhão de abortos por ano, na maioria das vezes conduzidos por profissionais não qualificados, o que aumenta os riscos de infecção por causa das más condições de higiene.”
Ele também defende que o problema seria minimizado se o Estado provesse de maneira eficaz acesso a métodos contraceptivos, com o objetivo de impedir a gravidez indesejada. “É de extrema importância, para que as mulheres não fiquem reféns e tenham opções. Investir em palestras e aulas de educação sexual também é necessário, pois muitas têm acesso [aos métodos contraceptivos], mas não sabem como utilizá-los”, explica.
Veja também: Criminalizar abortos traz consequências mais graves às mulheres pobres
Segundo informações do CFM, o abortamento é uma importante causa de mortalidade materna no país. Já as complicações oriundas desse tipo de procedimento representam a terceira causa de ocupação dos leitos obstétricos no Brasil. Em 2001, houve 243 mil internações no SUS (Sistema Único de Saúde) por curetagens pós-abortamento.
“A Pesquisa Nacional do Aborto, feita em 2010, mostra que 1 em cada 5 mulheres já fez aborto. A questão é: se continuar a ser considerado crime, haverá cadeia para todos ?”, completa Azevedo.
O fato de ser indicado até a 12ª semana de gestação, de acordo com o médico, ocorre porque até essa fase da gestação o risco de morte para a mãe é menor. “[Nessa fase] O sistema nervoso do feto também não está completo.”
Esse assunto já vem sendo discutido pela comunidade médica há mais de dois anos, segundo Azevedo. Foram ouvidos representantes de diferentes segmentos e analisados inúmeros estudos e contribuições. Também foram levados em conta aspectos éticos e bioéticos; epidemiológicos e de saúde pública; sociais; e jurídicos.
A decisão dos Conselhos de Medicina foi tomada por meio dos representantes das entidades que participaram do I Encontro Nacional de Conselhos de Medicina 2013, realizado de 6 a 8 de março, em Belém (PA). “Foi uma discussão acirrada e 80% votaram a favor da proposta”, explica.
Com isso, as conclusões serão encaminhadas à comissão especial do Senado que analisa a reforma do Código Penal, atualmente em tramitação no Congresso Nacional.
Até o momento, o aborto é ilegal no país, com exceção dos casos de estupro, ou quando há risco de morte da mãe. Em abril do ano passado, o STF (Supremo Tribunal Federal) decidiu que o aborto de fetos anencéfalos (má-formação que consiste na ausência total ou parcial do cérebro) não é mais considerado crime. “Não se trata de ser a favor, mas o que estamos discutindo aqui é a autonomia da mulher, seu poder de escolha”, finaliza Renato Azevedo.