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Infectologia

Vacina contra o HPV passa a ser dose única

close de braço de jovem recebendo a vacina contra o HPV aplicada por enfermeiro
Publicado em 04/04/2024
Revisado em 04/04/2024

Ministério da Saúde passa a recomendar dose única da vacina contra o HPV. Leia na coluna de Mariana Varella.

 

O Ministério da Saúde (MS) lançou nota técnica na última terça-feira (2) mudando a recomendação para a vacinação contra o HPV. A partir de agora, o esquema de vacinação contra o HPV deverá ser em dose única, e não mais em duas doses.

Com a mudança, o MS passa a seguir a recomendação da Organização Mundial da Saúde (OMS) e da Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS) que já é aplicada em 37 países, entre eles Reino Unido, Austrália, México e Argentina.

Veja também: Mais da metade dos jovens brasileiros têm HPV

“Vários estudos vêm acompanhando pelo mundo mulheres que receberam uma única dose da vacina contra o HPV e comparando com mulheres que receberam duas ou até três doses. Os dados são inequívocos, e mostram que menores de 20 anos de idade, ao receberem uma única dose, têm resposta imunológica de proteção muito semelhantes”, afirmou o dr. Renato Kfouri, infectologista e vice-presidente da Sociedade Brasileira de Imunizações (SBIm).

De acordo com o Ministério, a nova estratégia vai possibilitar a ampliação do público-alvo, pois a pasta passa a ter o dobro de doses disponíveis nos estoques.

Ainda segundo o MS, quem já recebeu uma dose da vacina não precisa tomar a segunda.

Assim, o público-alvo continua sendo formado por meninos e meninas de 9 a 14 anos, mas o MS passou a recomendar que estados e municípios busquem de forma ativa jovens de até 20 anos incompletos que ainda não receberam nenhuma dose do imunizante.

Além desses, também podem se vacinar pelo SUS pessoas com imunocomprometimento, vítimas de violência sexual e outras condições específicas, como pessoas com papilomatose respiratória recorrente (PPR). Nesses casos, o esquema vacinal é de três doses que podem ser aplicadas em indivíduos até 45 anos.

A vacina utilizada pelo SUS é a quadrivalente, que protege contra os quatro tipos de HPV mais comuns: 16 e 18, responsáveis por cerca de 70% dos casos de câncer de colo do útero, e 6 e 11, que provocam perto de 90% dos casos de verruga genital (condiloma).

Na rede privada, além da vacina quadrivalente, é possível encontrar o imunizante que oferece proteção contra nove subtipos do vírus. A nonavalente custa em média mil reais e pode ser aplicada em pessoas dos 9 aos 45 anos. Ambas as vacinas continuam a ser aplicadas em duas doses na rede privada.

 

HPV

Transmitido pelo contato de pele e mucosas durante o sexo, o HPV está associado ao surgimento de verrugas genitais e anais e de câncer de orofaringe (boca e garganta) e anal em ambos os sexos e de colo do útero, vagina e vulva em mulheres e de pênis nos homens.

Países que organizaram boas campanhas de vacinação contra o vírus viram o número de casos de câncer de colo do útero despencar. O exemplo mais bem-sucedido é o da Austrália, que prevê erradicar a doença até 2028. 

Ruanda, no continente africano, conseguiu vacinar 94% das meninas e também espera reduzir drasticamente a taxa de mortalidade por esse câncer, em geral mais comum em países pobres.

​​No Brasil, excluídos os casos de tumores de pele não melanoma, o câncer do colo do útero é o terceiro tipo de câncer mais frequente entre as mulheres, perdendo apenas para o câncer de mama e o colorretal.

“É possível, através da vacinação e do rastreamento de mulheres, eliminarmos o câncer de colo do útero. Temos vacina contra o câncer, a vacina funciona”, ressalta o dr. Kfouri.

 

Baixa cobertura vacinal da vacina contra o HPV

Apesar disso, a cobertura vacinal contra o HPV segue muito aquém dos 90% do público-alvo recomendados pela OMS e pelo Ministério da Saúde.

Entre 2014 e 2023, 70,9% das meninas brasileiras receberam a primeira dose da vacina contra o vírus, enquanto apenas 54,3% delas foram imunizadas com a segunda dose. No caso dos meninos, o índice é ainda pior: 45,3% receberam a primeira dose, e apenas 27,7% a segunda, de acordo com o Ministério da Saúde. 

Mas por que os números são tão baixos, se o Programa Nacional de Imunizações (PNI) oferece vacina gratuitamente contra o vírus para crianças e jovens?

Um dos motivos é exatamente o fato de a vacina ser indicada para pessoas que de preferência ainda não tenham iniciado a vida sexual. 

Muitos pais acreditam que vacinar crianças contra uma infecção sexualmente transmissível fará com que elas comecem a pratica sexo mais cedo. Além de não haver nenhuma relação entre a vacina e o início precoce da vida sexual, o motivo para vacinar as crianças é puramente biológico: crianças costumam ter uma resposta imunológica mais efetiva às vacinas do que adultos, principalmente antes de entrarem em contato com o vírus.

Outra razão seria a falta de uma comunicação bem feita. O Ministério da Saúde já mudou o público-alvo algumas vezes, e vacinas que exigem mais de uma dose costumam ter cobertura vacinal mais baixa. 

Muitos pais, mães e responsáveis também não compreendem a necessidade de vacinar os meninos contra o HPV, pois acreditam que o vírus cause apenas câncer de colo do útero. Além de proteger as futuras parceiras e parceiros sexuais, vacinar os jovens protege-os contra outros tipos de câncer, como o anal, de pênis e de garganta, e também contra o condiloma, doença benigna, mas que causa verrugas genitais e sintomas bastante desagradáveis.

O acesso a unidades básicas de saúde também é um empecilho para a vacinação. Muitas regiões não têm UBSs próximas, e seu horário de funcionamento é restrito ao horário comercial, o que dificulta o atendimento. Por isso, especialistas reforçam a importância da vacinação nas escolas como forma de aumentar a adesão.

Além disso, poucas vacinas foram alvo de desinformação como a vacina contra o HPV. Entre 2014 e 2017, a equipe médica do Instituto de Psiquiatria (IPq) da USP avaliou, a pedido do Ministério da Saúde, mais de uma dezena de jovens acreanos que relataram sintomas como convulsões e desmaios que estariam associados à vacina contra o HPV.

Os psiquiatras Renato Luiz Marchetti e José Gallucci Neto analisaram os 16 casos mais graves de um total de 74 no Hospital das Clínicas da USP, e concluíram que a maioria havia desenvolvido um quadro de doença psicogênica, cujos sintomas têm origem psíquica e não orgânica.

“Trata-se de uma doença funcional do sistema nervoso, associada a uma situação de estresse emocional, no caso a vacinação. O paciente não inventa a doença, ele sofre de fato, mas os sintomas, embora estejam relacionados ao evento da vacinação, não são de forma nenhuma causados pelo imunizante”, explicou o dr. Gallucci, em entrevista ao Portal.

Mesmo que os sintomas não tenham sido gerados pela vacina, o caso dos meninos do Acre ganhou a mídia, causando pânico nos pais. Outros surtos de doença psicogênica foram relatados no Brasil e no exterior, e isso incitou uma série de desinformações a respeito da vacina contra o HPV.

É essencial vacinar e proteger meninos e meninas contra o HPV, vírus altamente contagioso, que pode causar cânceres graves. Se há uma vacina segura e eficaz contra o vírus, não há por que negá-la aos nossos jovens.

 

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