O câncer de pulmão é o tumor maligno que mais mortes provoca no mundo inteiro, porque, na maioria dos doentes, o diagnóstico é tardio. Leia no artigo do dr. Drauzio.
Câncer de pulmão é doença traiçoeira. É o tumor maligno que mais mortes provoca no mundo inteiro, porque, na maioria dos doentes, o diagnóstico é tardio.
Minha geração foi devastada pelo cigarro. Na carreira de oncologista, perdi a conta de quantos parentes, amigos e amigas da adolescência tratei e, infelizmente, vi morrer por complicações da doença.
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O cigarro é o principal fator de risco, mas não é o único. Também colaboram: a poluição ambiental, a queima de combustíveis fósseis, asbestos, arsênio, o uso de fogão à lenha em cozinhas e cômodos com pouca ventilação e alguns fatores genéticos.
O tabaco, em suas várias formas de consumo, guarda relação direta com a incidência, seja ele industrializado, de palha com fumo em corda, charuto ou narguilé – os eletrônicos ainda não foram observados por tempo suficiente.
Ainda no século passado foi demonstrado que, quanto maior o número de anos e maior a quantidade de cigarros fumados por dia, mais alto o risco. O número de casos em homens é maior, mas a prevalência em mulheres tem crescido – reflexo da entrada de um grande número delas no universo de fumantes a partir da segunda metade do século passado.
Por essas razões, o combate ao fumo e à dependência de nicotina por meio de leis que restringem o uso em ambientes coletivos e de campanhas de saúde pública, para esclarecer a população dos malefícios e dos riscos do tabaco, são temas prioritários em nossa sociedade.
Embora tenham ocorrido diversos avanços no tratamento do câncer de pulmão, com impacto positivo nos índices de cura, a partir dos anos 2000, os resultados nos casos avançados ainda são medíocres.
O diagnóstico precoce é fundamental para conseguir curas definitivas e abordagens terapêuticas mais econômicas para o SUS e a Saúde Suplementar. Mas, como chegar a ele numa enfermidade que, na maioria das vezes, evolui em silêncio?
Estudos com grande número de participantes conduzidos nos últimos dez anos demonstraram que a tomografia computadorizada do tórax com doses baixas de radiação é uma técnica que aumenta o número de diagnósticos de tumores em fases iniciais e, como consequência, reduz a mortalidade.
A tomografia com doses baixas em pacientes com risco alto é recomendada por boa parte dos pneumologistas. Numa metanálise da prestigiosa “Cochrane”, com 90.475 participantes de 45 a 75 anos, que fumavam 200 ou mais maços por ano, acompanhados por 5,2 a dez anos, houve redução de cerca de 20% nas mortes pela doença.
Os inconvenientes são os custos das tomografias, a somatória das doses de radioterapia que devem ser repetidas anualmente e as imagens falso-positivas. Embora ainda seja um exame caro, os preços têm caído e as doses baixas minimizam o risco dos efeitos cumulativos das radiações.
É evidente que não tem sentido submeter ao screening pessoas com risco baixo. O câncer de pulmão era raríssimo no século 19, tempos que precederam a epidemia do fumo, alimentada pelas campanhas publicitária da indústria tabaqueira, destinadas a criar multidões de crianças e de adolescentes com dependência de nicotina.
Quem seriam, então, os candidatos ao screening? Os que correm mais risco, principalmente os fumantes, é claro: os atuais e o os que se livraram do fumo depois de anos de dependência. No meu caso, caro leitor, foram 19 anos de escravidão. Há mais de dez anos repito essas tomografias todos os anos.
Isso não quer dizer que espero diminuir o risco de desenvolver um tumor maligno no pulmão. Claro que não. O que espero é fazer o diagnóstico precoce que me permitirá ser operado e, se tudo der certo, curado.
Os médicos não especialistas não costumam solicitar esse tipo de tomografia, de rotina, mesmo em pacientes que fumam todos os dias há décadas.
Se este é o seu caso, e você tem um bom convênio, converse com o seu médico. Não fique adiando, mesmo que você tenha parado de fumar há muitos anos. Já vi esse tumor em gente que estava sem colocar um cigarro na boca havia 30 ou 40 anos.