A infecção crônica pelo HCV pode causar alterações estruturais no fígado. O tratamento da hepatite C tem como objetivo prevenir a progressão e evitar as complicações associadas a doença.
A hepatite C é muito mais comum do que se imagina: 1% a 1,5% dos brasileiros são portadores crônicos do vírus causador da doença, o HCV.
Ao contrário das hepatites A e B, a regra da hepatite C é tornar-se crônica: cerca de 80% dos que adquirem o vírus serão incapazes de eliminá-lo.
A evolução é lenta e silenciosa, mesmo quando já existem lesões avançadas no fígado.
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A transmissão do HCV ocorre através do contato com o sangue de pessoas infectadas (risco alto), por via sexual (risco baixo) e da mãe infectada para o filho (cerca de uma transmissão em cada 20 partos). As transfusões de sangue foram um meio de contaminação muito comum até 1990, quando surgiu o teste para identificar os portadores do vírus. Hoje, o risco de receber sangue contaminado pelo HCV é de uma infecção para cada dois milhões de transfusões. O mesmo não pode ser dito sobre o uso de alicates e cortadores de unha, aparelhos de barbear e outros instrumentos cortantes eventualmente contaminados.
Ao contrário das hepatites A e B, ainda não foi descoberta uma vacina contra a hepatite C. A infecção crônica pelo HCV pode causar alterações estruturais no fígado. Assim como na hepatite B, a resposta inflamatória disparada pelas células do sistema de defesa e as características genéticas do vírus estão associadas ao grau e à intensidade dos danos hepáticos.
Em alguns casos, a agressão crônica provoca focos de fibrose (como se fossem cicatrizes) que podem levar à cirrose. Num período de 20 anos, aproximadamente 20% dos infectados pelo HCV desenvolverão cirrose. Uma das complicações mais temidas associadas à cirrose é o aparecimento do hepatocarcinoma: uma em cada 50 pessoas com cirrose apresentará câncer de fígado.
O objetivo do tratamento da hepatite C é prevenir a progressão e evitar as complicações da doença. A era do tratamento começou com um pequeno ensaio clínico publicado em 1986, antes mesmo de o HCV ser conhecido. Nele, os autores descreveram melhora das provas de função hepática por meio da aplicação de interferon alfa.
No início dos anos 1990, quando o HCV foi descoberto, ficou claro que o interferon tinha a propriedade de reduzir o número de partículas virais no sangue. O tratamento, no entanto, era feito por via injetável, apresentava múltiplos efeitos colaterais e baixos índices de resposta.
O segundo avanço surgiu em 1995, com a publicação de um estudo clínico sobre a administração do antiviral ribavirina, medicamento que associado ao interferon aumentava o período de supressão da atividade viral, melhorava as provas de função hepática e as características histológicas do fígado. Essa combinação mantida por 48 semanas levava à supressão do HCV em 40% a 50% dos casos, números duas a três vezes maiores do que os obtidos apenas com interferon.
O terceiro veio em 2002, com o aparecimento do chamado interferon peguilado, forma de apresentação que apresenta menos efeitos colaterais e possibilita a administração uma vez por semana. Em alguns subtipos do HCV (genótipos 2 e 3), apenas 24 semanas de tratamento associado à ribavirina são suficientes para obter resposta duradoura em 70% a 80% dos casos.
O quarto avanço parece estar ocorrendo agora com um novo antiviral, o telaprevir, desenvolvido especificamente para bloquear a ação de uma enzima necessária para a replicação do vírus.
Dois artigos recém-publicados no The New England Journal of Medicine demonstraram que o telaprevir associado à combinação de interferon peguilado e ribavirina aumenta substancialmente os índices de supressão viral, mesmo no subtipo de evolução mais desfavorável (subtipo 1).
Duas décadas de pesquisas para decifrar a estrutura molecular do HCV parecem dar os primeiros frutos. Novas drogas “desenhadas” especificamente para destruí-lo poderão levar a tratamentos mais eficazes para todos os portadores de hepatite C.