Serviços genéticos personalizados | Artigo

Infelizmente, há poucos estudos para avaliar riscos e benefícios ao identificar marcadores genéticos de um indivíduo. Leia artigo do dr. Drauzio.

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Publicado em: 21 de abril de 2011

Revisado em: 11 de agosto de 2020

Infelizmente, há poucos estudos para avaliar riscos e benefícios ao identificar marcadores genéticos de um indivíduo. Leia artigo do dr. Drauzio.

 

Há genes que vêm para o bem; outros, só para nos causar problemas. São inseparáveis como as faces de uma moeda: impossível herdar os primeiros sem receber os demais. Por essa contradição, orgulharmo-nos de nossas características genéticas é a mais estúpida das vaidades humanas.

Nos últimos anos, inúmeros trabalhos têm demonstrado a relação existente entre as variantes de alguns genes e o aparecimento de determinadas doenças. Esses estudos empregam tecnologias que permitem sequenciar fragmentos de DNA (conhecidos como SNPs) de uma pessoa, examinar as peculiaridades individuais desses fragmentos, e compará-las com aquelas dos portadores da enfermidade em questão. Assim, foram identificados genes associados a várias doenças, e outros que aumentam a probabilidade de contraí-las. No futuro, tais descobertas terão impacto na prevenção e no tratamento.

Na estrutura da medicina moderna, no entanto, quando uma nova tecnologia acena com a possibilidade de aplicação prática, os interesses comerciais se apressam em colocá-la à disposição dos possíveis usuários.

Desta vez não foi diferente. Há três companhias que oferecem pela internet “serviços genéticos personalizados” a preços que variam de U$399 a U$ 985, a depender do número de SNPs sequenciados: (www.navigenics.com), (www.decodeme.com) e (www.23andme.com).

 

Veja também: Sequenciamento personalizado

 

Elas se propõem a identificar marcadores genéticos ligados ao aumento de risco para desenvolver aneurisma abdominal, obesidade, doença coronariana, Alzheimer, osteoartrite, lúpus,esclerose múltipla, diabetes, artrite reumatoide, vários tipos de câncer (mama, pulmão, estômago, cólon, próstata) e até a síndrome das pernas inquietas.

Para fazê-lo, enviam pelo correio um kit destinado à coleta de saliva ou de células retiradas da face interna das bochechas por meio de raspagem. A partir da análise do DNA contido nas células suspensas na saliva ou coletadas na mucosa bucal, as companhias também oferecem aos usuários a possibilidade de identificar as origens geográficas de seus ancestrais.

Prometem, ainda, acompanhar a literatura médica à procura de novos marcadores que venham a ser identificados em outras doenças, para avisá-lo pela internet caso você seja portador de um deles. Para tanto, seus SNPs serão mantidos num banco de dados, a um custo de U$ 250 anuais.

Qual a utilidade prática desses testes genéticos?

Ninguém discute a importância da genética na maioria das doenças. O problema é que conhecemos mal o papel das diferentes variedades de genes responsáveis pela suscetibilidade a elas. Além disso, patologias como diabetes, doença coronariana, câncer e outras constituem o que chamamos de enfermidades complexas, associadas à presença de múltiplos genes e às interações entre eles e o ambiente.

A questão fundamental, entretanto, é o que fazer quando entre nossos SNPs for encontrado um que aumenta o risco de adoecer?

Infelizmente, há pouquíssimos estudos para avaliar os riscos e benefícios da detecção de determinada variedade de gene em um indivíduo. Imaginem, então, a complexidade de analisar os achados de exames que detectam a presença de milhares de genes.

Se os SNPs testados mostrarem maior risco de ataque cardíaco e diabetes, por exemplo, não vamos aconselhar redução de peso, atividade física, controle da pressão arterial e largar de fumar, medidas indicadas para todos?

E se os SNPs não revelarem risco elevado, seus portadores poderão fumar, jogar fora os remédios para a pressão e passar o dia sentados, comendo à vontade?

Quando soubermos interpretar as informações obtidas, provavelmente valerá a pena conhecer todos os nossos genes. Por enquanto, sequênciá-los aos milhares tem tanta utilidade como saber se descendemos de visigodos, celtas ou vikings.

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