Lucas Raniel foi um dos primeiros infectados pela mpox a falar sobre a doença nas redes sociais. Assista ao relato.
O comunicólogo Lucas Raniel convive com o HIV desde 2013 e utiliza suas redes sociais para conscientizar sobre a aids. Em junho deste ano, ele suspeitou que havia contraído mpox (antiga varíola dos macacos) após apresentar febre e aumento dos gânglios. Logo buscou um serviço de saúde e o diagnóstico se confirmou.
Em isolamento, Lucas passou por toda a evolução da doença e buscou disseminar informações confiáveis sobre o assunto em seus perfis. Neste vídeo, ele conta como foi o processo desde o diagnóstico e também comenta sobre o preconceito que associa a mpox a homens que fazem sexo com outros homens.
Não pode assistir agora? Acompanhe a transcrição a seguir:
Meu nome é Lucas Raniel, tenho 30 anos, sou comunicólogo de formação, especialista na área do HIV, pois eu vivo com o HIV.
Se você curtiu muito o final de semana e a Parada GLBT+ de ontem e acabou esquecendo de usar o preservativo ou usou ele só pra fazer balão na rua, ou seja, se você se expôs ao risco pro HIV, você tem até 72 horas pra buscar a PEP no serviço de saúde.
E hoje eu tô no canal do Drauzio Varella, no Cabine Com o Paciente, pra falar sobre monkeypox, pois eu tive monkeypox.
Agora vou pegar meu estoque de medicamentos. E tudo isso gratuito pelo SUS.
Bom, eu desconfiei que eu tava com o monkeypox por conta das notícias terem aparecido cada vez mais na mídia e eu tive também inicialmente uma febre e um aumento nos gânglios, né, aqui no pescoço, na região da virilha. E eu tive febre constante por três dias. Já no primeiro dia de febre, eu busquei o serviço de saúde onde eu trato o HIV. E lá eles me isolaram no primeiro momento e fizeram um exame geral no meu corpo pra ver se encontravam as lesões, e, a partir da lesão encontrada embaixo da minha axila, eles rasparam, fizeram a coleta dessa lesão e mandaram pro laboratório de diagnóstico, e lá foi diagnosticado, um dia depois, que eu estava reagente pro monkeypox.
Tive febre por três dias de quase 40 graus, e, depois disso, começaram a aparecer as espinhas, as feridas, as varíolas em si, que surgem como se fossem umas espinhas mesmo. Aí, depois, elas vão ficando esbranquiçadas, amareladas, elas estouram e aí elas vão se espalhando pelo corpo.
Tive feridas na virilha. Tive feridas embaixo da axila, que foi onde coletaram, e comecei a sentir muita febre, muita dor, que não passava. Eu tomava medicamento via oral e a dor e a febre não baixava, tanto que eu tive que retornar ao sistema onde eu trato o HIV pra poder tomar medicamento na veia porque a dor era muito intensa.
Após o diagnóstico reagente para monkeypox, meu profissional de infectologia, que é o doutor Álvaro Costa, ele pediu pra eu ficar recluso, caso eu pudesse, por 20 dias pra fazer essa análise do caso e também pra não proliferar pra outras pessoas, né, porque a gente sabe que o monkeypox, ele é transmissível das maneiras mais simples: abraço, beijo, contato direto com a ferida, compartilhamento de peças de roupa, contato íntimo também.
Quando eu recebi o diagnóstico de monkeypox, eu comecei a falar nas minhas redes sociais, né, que já têm bastante relevância por conta do HIV, e aí, com isso, eu recebi muitas mensagens de pessoas que estavam com muito medo porque não tinham muitas informações sobre o monkeypox, pessoas que estavam na dúvida porque viram uma espinha diferente, uma marquinha diferente ou porque sentiram algumas dores.
Eu procurei saber mais sobre o assunto também porque tá borbulhando de informação aí, e tentem nunca levar a informação pro lado moralista. Não precisa ter vergonha de ser diagnosticado com monkeypox, não precisa ter medo, não precisa se colocar em um lugar de culpa também.
O que mais tem acontecido em relação ao monkeypox e em todas as informações que têm acontecido nos últimos meses é essa ligação, né, entre a comunidade LGBT, principalmente com os homens gays e HSH, que são homens que fazem sexo com homens, vinculando a doença do monkeypox. Infelizmente, tem uma parcela da população que não tem a capacidade de diferenciar essas coisas e acaba culpando essa população, e a gente vê que esse erro já aconteceu com a história do HIV e Aids na década de 80, quando veicularam o HIV como peste gay, como câncer cor de rosa e isso atrapalhou muito o sistema de saúde, inclusive, a diagnosticar casos fora dessa comunidade porque a gente vê aí novos casos surgindo em crianças, em mulheres grávidas. Então, assim, não é algo específico da comunidade LGBTQIA+. Por isso que todo mundo tem que se atentar com o monkeypox e ficar atento com o seu autocuidado, né, com a sua saúde, com o seu corpo.
Ter sido diagnosticado com monkeypox foi um pouco complicado pra mim, que trabalho, pra cima e pra baixo, que trabalho também com serviço de saúde. Eu tive que ficar 20 dias parado dentro de casa pra não infectar outras pessoas também, mas as pessoas que não podem fazer isso ou que têm que ficar um determinado tempo afastado do trabalho, o que eu digo pra essas pessoas é pra evitar mesmo o contato íntimo, pra ficar atento com seu corpo porque é uma doença que tá acontecendo de uma maneira muito rápida, aqui em São Paulo já tem mais de mil casos, no Brasil todo já tem mais de dois mil casos. Então, eu acho que o ideal é a gente ficar atenta com o nosso corpo, com o nosso autocuidado e, se necessário também, manter distanciamento de grandes aglomerações, de lugares onde a gente possa ter esse tipo de contato que possa infectar o nosso corpo com o monkeypox.
A minha recuperação foi muito tranquila depois desses cinco dias, né, que eu tive de muita dor e de muita febre. Eu procurei sempre me manter bastante hidratado, tomar muita água. Eu mantive sempre as feridas bem hidratadas, com hidratante corporal, e uma rotina muito mais diferenciada do que a minha rotina era, que era uma rotina mais corrida. Eu tentava sempre dormir cedo pra poder acordar cedo, sabe, me exercitar mais, ali dentro de casa mesmo, pra ver se a minha imunidade ajudava essas feridas a irem embora mais rápido e aí ficar melhor o mais rápido possível pra voltar à minha rotina.
Eu vivo com o HIV há seis anos e estou indetectável há quase seis anos também. Ou seja, a cadeia de transmissão do vírus do HIV aqui no meu organismo, ela já tá encerrada, eu já não transmito o vírus do HIV pra ninguém.
Não teve uma recomendação especial por eu viver com o HIV, mas é importante a gente enfatizar que as pessoas que vivem com o HIV precisam manter o seu tratamento em dia. Se não estiverem detectáveis, precisam estar em contato direto com o seu médico, com o serviço de saúde pra fazer um acompanhamento mais de perto.
Realmente, o monkeypox é uma doença que tá aí, tá acometendo todas as pessoas. Então, deixar o preconceito e a falta de informação um pouco de lado e buscar informações concretas e reais, sem moralismo, sem terrorismo pra que a gente consiga se informar sobre esse assunto da maneira mais correta possível pra gente não repetir os mesmos erros do HIV.
Então, acho que a informação que eu venho deixar aqui, pra finalizar tudo, é se cuidem, tenham mais autocuidado, fiquem atentos com os corpos de vocês nesse momento de surto que a gente tá tendo de monkeypox e tentem sempre manter contato e ida ao médico regularmente porque isso também é muito importante.
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